O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou, durante o programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite de segunda-feira (13), que a autoridade monetária é contrária a ideia de mudar as metas de inflação e que uma revisão dos alvos a serem perseguidos pela instituição neste momento teria efeito contrário ao desejado sobre os juros.
“Se a gente fizer uma mudança agora, sem um ambiente de tranquilidade e um ambiente onde a gente está atingindo a meta com facilidade, o que vai acontecer é que você vai ter um efeito contrário ao desejado. Ao invés de ganhar flexibilidade, você pode terminar perdendo flexibilidade”, explicou Campos Neto.
Criticado pelo presidente Lula (PT) nos últimos dias, Campos Neto sinalizou também a necessidade de ter boa vontade com o novo governo e disse que fará tudo o que estiver ao seu alcance para aproximar o BC da gestão petista.
Para ele, não existe ganho de credibilidade com a revisão das metas no contexto atual. “No final das contas, você vai ter uma expectativa de inflação que não só vai para a meta nova como vai ganhar um prêmio [de risco] maior ainda”, completou o presidente do BC.
A expectativa sobre uma mudança nas metas de inflação foi gerada por uma entrevista de Lula, que considerou exagerados os patamares atuais e defendeu 4,5%, o mesmo nível fixado em seus dois primeiros mandatos. As atuais metas são 3,25% em 2023 e 3% em 2024 e 2025, com margens de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
Essas metas são definidas pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), formado pelos ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), além de Campos Neto.
A primeira reunião do conselho no novo governo ocorre justamente nesta semana, na quinta-feira (16). Até o momento, a discussão das metas não está na pauta, mas nada impede que o tema venha a ser incluído.
Em 2023, a previsão é definir a meta de inflação a ser buscada em 2026 e confirmar os alvos de anos anteriores. Tecnicamente, para alterar as metas já fixadas, será necessário o governo editar um decreto autorizando essa mudança.
O tema passou a ser discutido publicamente após o boletim Focus projetar a inflação para 2023 em 5,79%, mais de um ponto percentual acima do teto do objetivo a ser perseguido pelo BC (4,75%). Isso representaria um estouro da meta pelo terceiro ano consecutivo. A inflação ficou acima da meta nos últimos dois anos (2021 e 2022).
Para 2024, a expectativa do mercado para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) subiu para 4% –já acima do alvo central (3%).
Lula dispara críticas a Campos Neto
Com a taxa Selic mantida em 13,75%, Lula passou a temer o crescimento da economia e vem criticando a autoridade monetária defendendo a mudança das metas com a justificativa oficial de que isso abriria espaço para antecipar o início do corte de juros e incentivaria a atividade.
Campos Neto disse entender que existe pressa de Lula com a agenda social e fez sinalizações ao presidente. “O BC precisa trabalhar junto com o governo. Eu vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para aproximar o BC do governo”, afirmou.
“É importante reconhecer a legitimidade do resultado das eleições, da eleição do presidente Lula, que foi feita de uma forma democrática. O Banco Central é uma instituição de Estado, precisa trabalhar com o governo sempre”, completou.
Lula também criticou a autonomia do BC recentemente, e Campos Neto destacou a importância da continuidade da lei atual, em vigor desde 2021.
“Espero que [autonomia] não seja revertida, não tem a ver com a minha pessoa, tem a ver com a instituição do BC”, finalizou Campos Neto.
Campos Neto se defende sobre participação em grupos de WhatsApp de aliados de Bolsonaro
O presidente do BC afirmou, na última segunda (13), que mesmo após a posse do governo Lula, se limitava a mandar informações técnicas e de conjuntura para os integrantes do grupo do WhatsApp de aliados de Bolsonaro. Os questionamentos sobre a opinião política de Campos Neto aumentaram por parte dos petistas nas últimas semanas.
Os membros do atual governo questionaram uma foto do celular de Campos Neto com o grupo aberto do WhatsApp, com aliados de Bolsonaro.
Além disso, Campos Neto também foi perguntado, durante o Roda Viva, sobre o fato de ter usado a camisa da seleção brasileira nos dias de votação para a presidência no ano passado. Isso porque a camisa amarela acabou virando “símbolo” de apoiadores do ex-presidente, Jair Bolsonaro, durante a campanha eleitoral.