O grupo de alimentação e bebidas foi responsável por quase metade do resultado da inflação em 2022, que deve ter uma nova divulgação nesta quinta-feira (9). Empresas ligadas ao setor de alimentos acabam sofrendo com os efeitos da inflação, mas nem todas. A Camil (CAML3) é um exemplo de caso de empresa que não é (totalmente) afetada e, às vezes, até se beneficia da alta de preços.
O analista de ações da casa de análises do TC, Vinícius Steniski, explicou que a inflação de alimentos afeta as companhias da bolsa de diferentes formas (a depender do modelo de negócio de cada companhia).
“Depende muito de qual nível da cadeia de produção que ela está inserida. Se ela for uma produtora né, ou seja, se ela planta, colhe e vende esse produto, ela acaba sendo beneficiada pela inflação desses produtos, porque ela vai acabar vendendo mais caro e, na teoria, ela teria o mesmo custo fixo, então a margem dela seria maior”, disse Steniski.
No caso da Camil, especificamente, o especialista destacou que a empresa é uma uma indústria. Ela compra o arroz, feijão ou outro produto de produtores e repassa o preço.
“Ela vende, e de certa forma, repassa os preços, só que, normalmente, as indústrias não conseguem repassar totalmente o aumento do custos, porque existe a concorrência e vai existir algum concorrente dela que vai acabar segurando o preço pra tentar vender mais nesse momento mais difícil”, explicou Steniski.
A inflação em 2022 superou, mais uma vez, o teto da meta estimada pelo Conselho Monetário Nacional. A meta para o ano passado era de 3,5% e o teto era de 5%.
De acordo com Rafael Pastorello, analista de investimentos e aluno da Eu me banco, uma subida na inflação não deve afetar muito a receita da Camil, especificamente, porque os produtos que ela distribui são mais básicos e menos discricionários digamos assim.
“Se formos pensar, por exemplo, no arroz e no feijão, eles têm uma demanda mais inelástica, ou seja, por mais que o preço suba, a demanda acaba não sendo tão afetada, justamente por se tratar de produtos que fazem parte do prato do brasileiro no dia a dia. Na minha visão, é muito mais fácil o consumidor mudar a proteína do seu prato, substituindo a carne por uma opção de menor preço, do que mudar os produtos de consumo básicos”, disse Pastorello.
A fala do analista vai de encontro ao que Steniski, do TC, explicou ao BP Money. Segundo Steniski, de forma geral, o setor de alimentos é considerado um setor mais defensivo na Bolsa de Valores. “Em momentos inflacionários, as pessoas optam por esse setor porque alimentos é algo que a população não vai deixar de consumir, mesmo que o preço dispare”, disse o especialista do TC.
Para Pastorello, o que pode acontecer é uma migração de alguns produtos, com o aumento da inflação. Dessa forma, os clientes poderão buscar, em vez de uma marca mais premium, um produto de menor valor agregado.
“Acaba que pode ocorrer uma migração nesse sentido, mas mesmo assim não deve afetar tanto a empresa porque, muitas vezes, por uma diferença pequena de preço o consumidor opta pelo produto de melhor qualidade”, pontuou Pastorello.
Camil (CAML3) é resiliente, segundo analistas
A Camil Alimentos anunciou, há cerca de duas semanas, os resultados do terceiro trimestre de 2022. A empresa registrou lucro líquido de R$ 147,1 milhões no período. O número é 22,1% superior ao apresentado no mesmo intervalo de 2021.
De acordo com Pastorello, a Camil pode apresentar certa resiliência por ser uma empresa que tem produtos que vão desde a marca premium até as mais acessíveis.
“Por isso, não vejo uma grande queda na receita da Camil por conta desse movimento que talvez ocorra com uma parte dos clientes. A empresa, justamente por ter essa característica e estar em um setor mais perene, terá que fazer um reajuste à medida que os preços dessas commodities forem subindo. Com relação à estratégia de precificação, será mantida acompanhando o que vem sendo praticado no mercado”, disse Pastorello.
Para Luan Alves, analista chefe da VG Research, a Camil possui uma correlação grande entre o preço da ação e a commoditie (arroz) e, por isso, a empresa deve ser beneficiada nos próximos resultados.
“Temos uma expectativa de alta no alimento devido a baixa produção no ano corrente, o que deve beneficiar os resultados da companhia a frente”, disse Alves.
“A Camil, historicamente, tem conseguido repassar a alta do preço do arroz para o preço de seus produtos, diluindo os seus custos fixos e entregando uma boa rentabilidade. Tem empresas listadas como foi o caso da M.Dias Branco que teve mais dificuldade em repassar o preço do trigo em seus produtos”, completou o analista da VG Research.
M. Dias Branco não tem o mesmo poder de repasse nos preços
Empresa “rival” da Camil, a M. Dias Branco (MDIA3), segundo analistas, é um exemplo de empresa que não consegue repassar tão bem os preços, quando há um aumento devido a inflação.
“A M. Dias Branco, que é uma indústria e produz biscoitos, massas, entre outros produtos, já sofre muito mais com a inflação alta, porque ela precisa muito de trigo, é o principal insumo dela e o trigo foi um dos insumos que mais disparou ainda mais na guerra da Ucrânia, então foi um momento bem mais delicado. A M. Dias também não tem tanto poder de repasse de preços, porque grande parte das receitas dela vem de classes mais baixas. Ela comercializa para as classes B e C”, afirmou Steniski.
Segundo o especialista do TC, a M. Dias Branco sofre mais do que a Camil por ter um ticket menor e mais concorrentes.