*Por Paulo Dutra Costantin
Com um cenário em que o mundo continua sob efeitos da crise de energia – apesar da redução dos preços das commodities neste mercado, bem como nas áreas mineral e agrícola, e com o aumento de casos de contaminação pela nova variante da Covid-19 –a principal preocupação econômica no mundo permanece sendo a pressão inflacionária nas maiores economias ocidentais, podendo ser comparada aos índices da década de 1970 (dados da tradingeconomics).
A economia dos Estados Unidos apresenta déficits gêmeos, caracterizados por resultado negativo nas contas públicas e nas contas externas, indicando a necessidade de realização de políticas monetária e fiscal contracionistas, ou seja, elevação da taxa de juros, redução de gastos públicos e/ou aumento da arrecadação. Vale ressaltar que, como no caso do Brasil, a inflação pode servir como instrumento de ajuste das contas públicas, pelo menos no curto prazo, utilizando o “imposto” inflacionário. Este processo pode ser mantido por um período maior, dependo dos objetivos a serem alcançados.
A Zona do Euro (ZE) não apresenta déficits gêmeos, pois, apesar do desajuste das contas públicas, a externa é superavitária. O principal fator inflacionário é, portanto, o aumento dos custos dos insumos, principalmente a energia, decorrente da guerra da Ucrânia.
Os preços do petróleo bruto e do Brent estão similares aos verificados em janeiro de 2022, período anterior à guerra. Já o preço do gás natural está igual ao verificado no início do conflito na Ucrânia e, apresentando queda desde setembro. Finalmente, os preços das principais commodities minerais e agrícolas também apresentam queda de preço no período de 12 meses, o que pode ser um sinal positivo para início do ciclo de redução do processo inflacionário.
Já os indicadores da economia brasileira indicam que o cenário permanece influenciado pelos ambientes externo e interno. O externo é decorrente da pressão inflacionária (Estados Unidos, atividade econômica e ZE, com custos de produção) e logística, com a falta de componentes industriais na cadeia de produção. O interno possui sua fundamentação na transição política e nas medidas econômicas que podem ampliar o desequilíbrio fiscal.
Diante de tudo isso, é possível afirmar que, para que o país possa construir uma trajetória de crescimento de longo prazo, reformas que tiveram início no governo Collor, devem ser colocadas como prioridade. E isso independe das escolhas dos ministros e do corpo técnico dos ministérios.
Cito as principais: reformas administrativa (tamanho e funções do Estado), tributária (financiamento das funções do Estado e dinâmica econômica), pacto federativo (atribuição das responsabilidades aos entes federativos e seus recursos para realizá-las) e, finalmente, a política (modificando o centro das decisões da presidência da República e do Congresso Nacional para prefeituras e Câmaras Municipais e, ao mesmo tempo, criando instrumentos de controle da alocação de recursos públicos mais eficazes para a população).
A transição econômica inicia-se como “continuidade” do governo atual, com a proposta de Projeto de Emenda Constitucional (PEC) da Transição/Kamikaze, com objetivo de criar “espaços fiscais” para o cumprimento de promessas de campanha. Este processo, sem indicar claramente o compromisso com ajuste das contas públicas, além de contribuir para aumento das incertezas e, consequentemente, do aumento do custo do capital, refletido pelas persistências inflacionárias, taxa de juros e depreciação do real, reduz a perspectiva de aumento da capacidade de produção futura.
Apesar deste cenário, há perspectiva de retomada de investimentos estrangeiros diretos (IED) no Brasil, em decorrência da aceitação inicial do presidente eleito, pela comunidade internacional. No entanto, há necessidade de habilidade política para aproveitar este momento de expectativa positiva, tanto para o retorno do Brasil aos organismos internacionais quanto para negociar a preservação do meio ambiente em troca de recursos financeiros.
A transferências de tecnologias é fundamental, em conjunto com uma política de estado para educação, para acelerar o desenvolvimento tecnológico e reintegrar o País à cadeia de produção mundial, principalmente em um período em que se repensa a realocação da produção para além do continente asiático.
Posto isto, é possível dizer que teremos em dezembro um ambiente externo divido: os Estados Unidos com inflação persistente, necessitando utilizar instrumentos de política fiscal e monetária contracionistas (redução de gastos, aumento de tributos e aumento da taxa de juros), para reduzir o crescimento econômico e “trazer” a taxa de inflação para patamares inferiores a 2% a.a. Na ZE há uma perspectiva de redução da inflação pela redução nos custo de produção, representados pelos insumos de energia, agrícolas e minerais.
O ambiente interno pode apresentar dois caminhos destintos, dependo das escolhas iniciais a serem feitas pelo próximo governo: o de retrocesso econômico e social adotando políticas econômicas populistas, como o descontrole estrutural das contas públicas e das instituições, ou pavimentando o desenvolvimento de longo prazo, realizando reformas estruturais em conjunto com instrumentos de política econômica de curto prazo, adequadas aos objetivos de longo prazo.
*Paulo Dutra Costantin é Coordenador do Curso de Ciências Econômicas do Centro Universitário Armando Alvares Penteado (FAAP)