Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), o Banco do Brasil (BBAS3) reportou diversos balanços considerados positivos, fazendo com que os papéis da estatal se tornassem atrativos para os investidores. Recentemente, no balanço do segundo trimestre de 2022, o banco público registrou um lucro líquido ajustado de R$ 7,8 bilhões, representando uma alta de 54,8% em relação ao mesmo período do ano passado.
No entanto, a partir de 2023, agentes financeiros apontam que será muito difícil prever qual será o desempenho dos papéis da estatal pelos próximos quatro anos. O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), durante a campanha presidencial, defendeu que os bancos públicos diminuíssem suas margens de lucro, ressaltando a necessidade de enquadrar o Banco do Brasil. Curiosamente, um dia após a vitória do petista, as ações do BB registaram queda acima de 5%.
Apesar do medo do mercado, analistas consultados pelo BP Money acreditam que a estatal poderá ser beneficiada e se tornar protagonista no governo do petista, mesmo que os resultados sejam afetados no curto prazo.
Início do governo Lula poderá afetar resultados do BB
Durante a campanha presidente, Lula prometeu diversos benefícios econômicos para as classes mais empobrecidas, como o aumento real do salário mínimo e a isenção de imposto de renda para quem recebe até cinco salários mínimos. Agora eleito, a equipe do petista tenta aprovar a chamada “PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição”, que irá abrir espaço no Orçamento de 2023 e permitirá despesas fora do teto de gastos (regra que limita o crescimento dos gastos públicos).
Dentre as medidas incluídas na PEC estão a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600 e outras demais promessas financeiras feitas por Lula. Segundo contas internas da equipe do presidente eleito, o valor estimado para todos esses gastos deve ficar em torno de R$ 200 bilhões.
Segundo Paulo Albuquerque, sócio da Quantzed, a proposta de orçamento do novo governo é no mínimo preocupante, visto que a ideia implica um grande déficit e fura o teto de gastos.
“A situação fiscal para o próximo ano está bastante ruim. A proposta de orçamento enviada pelo atual governo conta com déficit grande e rompe o teto de gastos. Ainda há a interrogação de como será a futura relação com o Congresso, de perfil um pouco mais à direita. Dito isso, não há muito espaço fiscal nem político para que o futuro governo consiga cumprir suas promessas de campanha”, reiterou.
Caso a PEC não seja aprovada, Albuquerque acredita que o governo Lula não tem outra saída senão usar a caneta do Executivo. Neste cenário, o analista crê que o Banco do Brasil seria bastante afetado, com o PT forçando a companhia a registrar lucros menores.
“Não resta muito espaço de manobra para o futuro governo, no curto prazo, que não seja usar o poder da caneta que o Executivo possa ter, sem depender de aval do Congresso. Dessa forma, percebo que o Banco do Brasil possa ser afetado com algum tipo de uso para fazer frente às políticas públicas que sejam prioridade do governo, como baixar juros para empréstimos de baixa renda, consignados para servidores, entre outros. Isso será bom, se o banco conseguir manter suas margens, mas o governo pode sim forçar a mão para que o banco baixe sua lucratividade para atender a alguma finalidade social”.
Na visão de Saulo Abouchedid, doutor em economia e professor de macroeconomia na Facamp, o governo de Lula poderá ser benéfico para o Banco do Brasil a longo prazo. Já no curto, ele pensa que o novo governo do petista irá promover uma mudança no modelo de negócios da estatal, afetando de início os balanços financeiros do banco.
“A minha expectativa pro Banco do Brasil ao longo do governo Lula é de mudança do modelo de negócios. Nos últimos anos, até antes do governo Bolsonaro, a gente viu uma reestruturação do Banco do Brasil. O banco ficou mais enxuto, pensando em resultados positivos no curto prazo. E a tendência é que esse modelo mude. Isso pode sim afetar os resultados, principalmente os resultados de curto prazo, mas eu não acredito que a mudança vai ser significativa”, explicou.
Banco do Brasil será protagonista no governo Lula?
Após ser eleito presidente, Lula afirmou que pretende estabelecer um plano de investimento com o financiamento de bancos públicos em obras de infraestrutura para “retomar o crescimento econômico” no Brasil. Anteriormente, em agosto, o petista já havia dito que os bancos estatais deveriam prestar função social.
“É preciso que a gente enquadre o Banco do Brasil. Vamos voltar com objetivo de fazer bancos públicos virarem bancos públicos. Não queremos que bancos públicos tenham nenhum prejuízo, mas não queremos que tenham os mesmos lucros dos bancos privados. Eles têm que prestar função social”, disse Lula.
Para Abouchedid, o Banco do Brasil continuará sendo um órgão importante no governo petista, assim como foi no segundo mandato de Lula, quando o Brasil enfrentou a crise de 2008. Segundo o analista, o Banco do Brasil poderá ser protagonista junto com a Caixa Econômica Federal.
“O Banco do Brasil, no segundo governo Lula, depois da crise de 2008, teve um importante papel anticíclico na geração de crédito, por meio do crédito direcionado. Então o papel do banco pode ser reforçado no governo Lula por meio da política econômica e creditícia. O Banco do Brasil pode ser um agente importante, junto com a Caixa”, explicou.
Albuquerque também partilha da mesma visão de Abouchedid, reiterando que o PT, partido de Lula, é um grande fomentador do consumo, logo de crédito. Cenário positivo e favorável para os bancos públicos. No entanto, o analista chama a atenção sobre os desafios impostos pela inadimplência, que já é bastante elevada entre as classes brasileiras mais pobres.
“Os governos do PT são grandes fomentadores do consumo, o que acaba fomentando também o crédito. Deverá haver uma expansão do crédito, sobretudo incentivo para baixa renda. Então vejo que o banco pode se beneficiar com aumento da carteira de clientes. O grande desafio mesmo é controlar a inadimplência, que no caso do brasileiro médio já é bastante elevada”, relatou.
Investir no Banco do Brasil continuará valendo a pena?
Para Albuquerque, o fato do Brasil estar se consolidando cada vez no cenário internacional atual, com inflação caindo e possibilidade de queda dos juros em 2023, fortalecerá o setor bancário nos próximos anos. Com isso, o Banco do Brasil continuará sendo um bom investimento.
“Continuo convicto na tese de Banco do Brasil, por várias razões. Com o cenário internacional atual, o Brasil parece ser cada vez mais a bola da vez. Estamos já na contra-tendência mundial, com inflação caindo enquanto nos EUA e na Europa ainda está subindo. Talvez tenhamos queda dos juros no próximo ano. Nesse contexto, ainda mais com uma busca por opções de maior qualidade, o setor de bancos parece também estar ganhando momento. E dentro desse setor, o Banco do Brasil continua com valuation bastante atrativo”, explicou.
No entanto, segundo Flávio Lemos, sócio na Trader Brasil Investimentos, as promessas econômicas feitas por Lula poderão afetar a rentabilidade do Banco do Brasil no longo prazo, podendo atrapalhar o desempenho das ações das estatais durante o governo petista.
“Lula sugeriu um amplo programa de renegociação de dívida, expansão mais forte do crédito e o uso de bancos públicos para apoiar programas sociais. Analistas do mercado apontam que potenciais programas de renegociação de dívida, crédito subsidiado e uma abordagem de expansão do crédito mais agressiva podem representar riscos de longo prazo para a rentabilidade do BB”, disse.