A taxação de dividendos tem sido pauta de discussão nas campanhas dos dois candidatos à Presidência da República, Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que disputam o cargo no próximo 30 de outubro, em um segundo turno das eleições. Ambos já comentaram que a tributação de dividendos e lucros estão no radar de eventuais governos. Analistas do mercado entrevistados pelo BP Money, no entanto, divergem sobre a medida.
Para Francisco Levy, estrategista-chefe da Empiricus Investimentos, se adotada, a medida será pior para o investidor pessoa física, já que passará a ser tributado em algo que ganhava isento. “Os ganhos dos dividendos serão menores por conta disso, e acho que deve ter uma reprecificação de Bolsa”, explicou o analista.
Fábio Sobreira, analista chefe e sócio da Harami Research, concorda sobre uma possível reprecificação das ações. “Talvez tenha uma queda momentânea nos preços das ações, principalmente daquelas que têm dividendos. Mas para o investidor, deve ficar ‘elas por elas’”, explicou.
Sua posição está baseada no fato de que, com a tributação, as empresas devem encontrar uma forma de não pagar ou pagar menos dividendo, como é feito, segundo ele, em todo país que adota a medida.
“Se a gente conseguir fazer com que diminua o imposto na empresa, mesmo que aumente na ponta, a tendência era que ficasse ‘elas por elas’. Eu espero que tenha esse compromisso, porque, para mim, a pessoa física tem que se preocupar em escolher boas empresas, e ser um sócio”, apontou.
No caso de fundos, a tributação deve ter um caminho mais complicado para percorrer. A própria proposta de Paulo Guedes, ministro da Economia de Bolsonaro, que modificava a cobrança do Imposto de Renda, tratava de itens de investimentos, entre eles a tributação de Fundos Imobiliários (FIIs), que foi eliminada do projeto. Para Levy, um lobby das empresas de construção fez com que a isenção permanecesse. Segundo ele, a tendência deve continuar e os fundos não devem ser tributados.
Para Lucas Dollo, sócio responsável pela área tributária do NFA Advogados, eventual tributação de dividendos poderá afetar de forma mais direta e profunda aqueles fundos que investem em empresas, tais como os FIA (Fundo de Ações) e os FIP (Fundos de Investimento em Participações). Ainda assim, o analista explica que poderão afetar FII que tenham ações ou quotas de pessoas jurídicas em seu portfólio. “Uma situação que atualmente não é comum”.
“Espera-se que eventual tributação de dividendos não seja estendida ao fim da isenção dos rendimentos distribuídos pelos FII a pessoas físicas, uma vez que tais fundos representam importantes veículos de captação privada de recursos para a expansão do mercado imobiliário”, explicou Dollo.
A taxação de dividendos aos olhos de Bolsonaro e Lula
Ambos os candidatos à Presidência vêm mencionando o desejo de tributar dividendos. Para Sobreira, a diferença para cada um é que Bolsonaro já apresentou uma proposta, enquanto Lula não foi ainda tão a fundo na questão.
Na última semana, o atual presidente disse que conversou com Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, sobre uma proposta de taxação de dividendos para bancar o Auxílio Brasil de R$ 600 de forma permanente. Em encontro com deputados eleitos no Palácio da Alvorada pós primeiro turno, Bolsonaro afirmou que a proposta de taxação de dividendos não vai atingir quem ganha menos de R$ 400 mil por mês e que “tem o suficiente para tornar definitivo esse programa de R$ 600”.
Já Lula defendeu a proposta em um evento no início de setembro, com representantes da Frente Nacional de Defesa do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). “Nós precisamos fazer uma nova política tributária nesse país. A gente tem que desonerar o salário para onerar as pessoas mais ricas desse país. Lucros e dividendos têm que pagar imposto de renda”, afirmou na ocasião.
Não à toa, o mercado enxerga que a tributação dos dividendos é provável, seja qual for o governo que tome posse em 2023. Mesmo assim, a discussão não é de hoje e está em tramitação desde 2018. O Projeto de Lei nº 9.636/2018, de autoria do Deputado Patrus Ananias (PT/MG) propõe a alteração do artigo 10 da Lei nº 9.249/1995, para o fim da isenção dos dividendos distribuídos por pessoas jurídicas, como explicou Dollo.
No texto, os dividendos passam a sofrer retenção (IRRF) de 15% quando distribuídos a pessoas físicas (tributação definitiva), 25% quando pagos a residente em país com tributação favorecida, e a ser tributados normalmente pelas pessoas jurídicas que os receberem (IRPJ e CSLL à alíquota total de até 34%).
Mesmo assim, Dollo explicou que os projetos foram apensados ao PL nº 1.418/2007, ainda que tratasse apenas da tributação de não residentes. Dessa forma, a discussão segue em pauta, de alguma forma, desde 2007. “Mas é importante destacar que tais projetos estão sem qualquer tramitação na Câmara desde agosto de 2021”, relembrou.
A ‘longevidade’ da medida também não é coincidência. Sobreira, da Harami Research, apontou que a medida é “impopular”, por isso, Congresso, Governo e Senado acabam arremetendo contra os projetos.
Francisco Levy, da Empiricus Investimentos, explicou que a taxação pode ser levada como uma bitributação. “Porque a empresa já pagou imposto e depois vai tributar, de novo, o mesmo fato gerador, que é o lucro da empresa. Então temos aí uma questão”, apontou.
Mesmo assim, Sobreira defendeu que a taxação dos dividendos, seja para ricos ou pobres – que é o que está sendo discutido -, não é um absurdo “porque muitos países ao redor do mundo já fazem isso”, finalizou.