Tesla (TSLA34), de Elon Musk, foi penalizada em ESG pela incoerência do fundador

Saída da Tesla do índice S&P 500 ESG balançou ações da montadora e fez Musk dizer que “ESG é uma farsa”

Elon Musk, mais do que nunca, está no foco dos principais sites de negócios do mundo, nas últimas semanas. O bilionário, dono da montadora de carros elétricos Tesla Inc (TSLA34), tem protagonizado uma novela sobre a compra do Twitter e, recentemente, se envolveu em uma polêmica ao dizer que o “ESG é uma farsa”, após sua empresa ser retirada do índice S&P 500 ESG.

Musk publicou no Twitter, nesta quarta-feira (1), um meme sobre “junho LGBT”. Na imagem, consta a frase “aqui vamos” e os logos de diversas redes sociais com o tema LGBTQ, além da foto de um homem com feição de “lamentação”. Em um dos comentários mais curtidos em resposta ao Tweet de Musk, o usuário da rede social diz que “Musk será cancelado”. Outro comentário questiona se o tema LGBTQ ofende o bilionário.

pic.twitter.com/G83vCrHHJf
— Elon Musk (@elonmusk) May 31, 2022

Já em relação a queda das ações da Tesla nas últimas semanas, de acordo com uma das analistas consultadas pelo BP Money, uma empresa que tem como premissa ajudar o meio ambiente através de sua tecnologia não pode deixar de seguir os padrões ESG. Isso demonstra “inconsistência”, por parte da companhia, e o mercado “penaliza a inconsistência e a incoerência”.

A fala de Musk, na semana passada, sobre a saída da Tesla do índice ESG (ambiental, social e governança, na tradução livre da sigla para o português) mexeu com as ações da empresa no mercado. Em uma semana, os papéis da montadora caíram mais de 7%. No ano, a Tesla já caiu mais de 50% na bolsa, seguindo o movimento de queda das techs no mercado norte-americano.

A especialista em ESG e conselheira em companhias abertas, como Tupy e Even, Claudia Elisa Soares, afirmou que a Tesla é uma empresa com muita visibilidade e, por isso, tudo que acontece, tanto para o bem quanto para o mal, acaba mexendo muito com os papéis da companhia no mercado.

“O Musk não perde a oportunidade de fazer a empresa ter essa visibilidade. Isso é para o bem e para o mal. Por exemplo, traz valor para a empresa fazer parte desse índice de sustentabilidade da Bolsa de Valores. Agora, se a empresa sai por qualquer motivo do índice, por falhar ou não conseguir os números, o que importa é que ela saiu”, disse Soares.

“Para o investidor global, que aposta no ativo Tesla, o questionamento é: como o cara (Musk) que faz um produto que, a priori, é para ajudar o mundo a diminuir as emissões de gás carbônico sai do índice de sustentabilidade e não apresenta a avaliação do que é a emissão de CO2 em toda sua cadeia? Parece inconsistência e o mercado penaliza a inconsistência e a incoerência”, completa. 

A temática ESG deixou de ser apenas uma pauta distante, nos últimos anos, para se tornar um parâmetro na hora de escolher as melhores empresas para investir. Em 2021, a alocação global em fundos ESG passou dos US$ 370 bilhões. A preocupação dos investidores com o quanto as empresas seguem a risca o que prometem em relação aos critérios de sustentabilidade e governança aumentou consideravelmente. 

Para Carlos Miranda, sócio-fundador da X8 Investimentos, isso tem uma explicação. Segundo ele, o próprio mercado e os consumidores acabaram fazendo com que as empresas começassem a se preocupar com o ESG. 

“O ESG ganhou poder no mercado porque foi uma onda positiva, que foi acontecendo em vários pilares. Primeiro, no mercado consumidor – que começou a privilegiar consumir produtos e serviços que carregassem impactos sociais e ambientais de empresas que fossem comprometidas com o ESG. Da mesma forma, o mercado de investimento começou a privilegiar e também pagar prêmios por ações de empresas que tivessem uma agenda positiva, que tivesse impacto social, de governança e transparência, inclusão, positivos”, afirmou Miranda. 
 
De acordo com o analista, as grandes empresas começaram a se preocupar com isso porque sabiam que se os produtos delas não carregassem o ESG como parâmetro inicial, iriam acabar sofrendo e, consequentemente, as ações também. 

“As grandes corporações acabaram se posicionando e criando políticas muito fortes de ESG e foram também fazendo aquisições, pelo mundo, de empresas que tivessem o ESG no seu DNA, então, de alguma forma, esse ciclo foi fazendo com que outras empresas surgissem também com essa agenda”, explicou Miranda.

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O especialista também afirmou que, a partir desse movimento de grandes empresas e também de novas companhias surgindo já com a agenda ESG como premissa, as agências globais de fomento, banco de desenvolvimento e fundos de desenvolvimento globais passaram a investir e fomentar negócios que tivessem esse tipo de agenda. Dessa forma, as empresas foram se moldando em busca desse capital, segundo o analista.

“Não é que houve tudo isso somente por questões financeiras. Isso tudo nasce de um movimento de conscientização da sociedade como um todo e, nessa onda, no aspecto econômico e financeiro, as empresas acabam ganhando na hora que elas têm esse posicionamento, então é uma agenda super positiva, ‘ganha ganha’, que vai do aspecto de sustentabilidade e ESG até o aspecto de ganhos financeiros”, disse Miranda.

A exclusão da Tesla do índice S&P 500 ESG

No início de maio, a Tesla foi retirada do índice S&P 500 ESG. Em comunicado, o S&P informou que alguns dos fatores que contribuíram para a pontuação fraca da Tesla no S&P DJI ESG de 2021 foram um “declínio nas pontuações de nível de critérios relacionados à estratégia de baixo carbono da Tesla e aos códigos de conduta empresarial”.

“Além disso, uma análise de mídia e partes interessadas, um processo que busca identificar a exposição atual e potencial futura de uma empresa a riscos decorrentes de seu envolvimento em um incidente controverso, identificou dois eventos separados centrados em alegações de discriminação racial e más condições de trabalho na Tesla. Fábrica de Fremont, bem como o tratamento da investigação da NHTSA após várias mortes e ferimentos estarem ligados a seus veículos de piloto automático”, informou o S&P, através de Margaret Dorn, chefe de índices ESG da S&P Dow Jones Indices na América do Norte.

Mesmo com as falas negativas de Musk sobre o ESG, Hiro Mizuno, executivo da empresa, afirmou – em resposta ao Tweet de Musk – que a Tesla não era contra o ESG.

“Para ser claro, a Tesla não está denunciando os investimentos ESG, mas pede que o esquema de classificação ESG avalie de forma justa os impactos positivos e negativos de uma empresa. As classificações atuais geralmente superam a redução de impactos negativos enquanto negligenciam os impactos positivos”, disse Mizuno.

Para a especialista Claudia Soares, a falta de dados sobre as emissões de carbono da Tesla pode nem ser culpa da empresa. Entretanto, não é possível afirmar isso, já que a companhia não justificou inteiramente a sua saída do índice.

“Pelo que entendi, o Musk saiu do índice porque não foi capaz de explicar algumas práticas em termos de consumo de carbono na cadeia como um todo. A Tesla não conseguiu comprovar a medição da emissão de carbono em toda sua cadeia produtiva”, afirmou Soares.

De fato, não deve ser fácil para a empresa, porque ela usa no processo produtivo dela alguns minérios, alguns elementos químicos-físicos que sinceramente não sei se os fornecedores tem todos esses dados preparados para enviar para Tesla, e aí ela não consegue apurar. Aí fica a pergunta: ela não consegue ou tem alguma coisa que ao apurar que ela vê que é um número tão pior que ela não quer apresentar, e aí, inevitavelmente, se não quer apresentar será retirada do índice”, pontuou ele.

A especialista ainda destacou que este caso da Tesla, de Elon Musk, é mais um exemplo, para outras empresas, de que o ESG não deve ser tratado como uma agenda a parte dentro de uma companhia. “Os temas ESG não devem mais ser tratados de maneira apartada. Portanto, o ESG é um elemento da gestão e está conectado com o que são perspectivas de resultado, lucro e, consequentemente, também o valor das empresas. Esse é o mix de porque a pauta ESG mexe com o valor dos mercados”, concluiu a especialista.