Incomodados com as taxas cobradas pelos maiores aplicativos do setor de delivery de comida, Rappi e iFood, empreendedores buscam, em paralelo, desenvolver plataforma própria de entrega.
É o caso da Padoca Vegan, na Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo. O negócio, aberto em 2019, sempre entregou via iFood, mas eram poucas as vendas por meio da plataforma antes da Covid-19.
Quando vieram as restrições, porém, os únicos canais de venda disponíveis eram iFood e WhatsApp.
As donas do negócio, Renata Altheman e Denise Camargo, viram que o preço para manter a marca no aplicativo era alto. “Cobravam [em taxas] quase um terço do valor do produto, aí tínhamos que aumentar o preço para o consumidor e acabávamos perdendo clientes”, explica Renata .
Para diminuir a dependência do iFood, as sócias contrataram a Delivery Direto, desenvolvedora de plataformas de entrega para restaurantes. “Fica mais barato se compararmos às taxas do iFood, onde pagamos 26% do preço do produto por entrega, e Rappi, 23%”, diz Roman Rauch, gerente da padaria.
O Delivery Direto oferece uma estrutura digital para o restaurante locar e colocar sua marca. O objetivo é criar um canal de comunicação direto e personalizado entre negócio e cliente, e o próprio dono do estabelecimento é responsável pela operação do delivery. Há outras iniciativas parecidas no mercado, como Delivery App e Zak.
A estrutura centraliza um sistema que envolve as etapas de uma entrega, desde o relacionamento com o cliente até a logística de distribuição de entregadores.
O custo do serviço para o empresário varia de R$ 240 a R$ 450 por mês, a depender da empresa desenvolvedora contratada e do plano escolhido.
O pacote inclui funcionalidades como gestão do cardápio, pesquisa de satisfação, programas de fidelidade, acesso a dados dos clientes, entre outros, o que não inclui o custo dos entregadores.
A Padoca, por exemplo, conta com motoboys terceirizados da Mottu e Lalamove. Além disso, ainda que os pedidos tenham sido feitos por meio da plataforma própria, os restaurantes têm a possibilidade de usar entregadores dos gigantes do setor, mediante pagamento.
Nas plataformas próprias há acesso aos dados dos clientes, mediante autorização, diferentemente do que acontece no Rappi e no iFood.
Isso permite, no caso da Padoca, o uso do pixel do Facebook, por exemplo. Com essa ferramenta ela consegue direcionar os anúncios de produtos aos seus clientes de acordo com o seu perfil de ações realizadas no site.
Além disso, há ganhos na relação com os consumidores. Altheman e Rauch dizem que quando a compra se dá por meio do site, o contato direto entre as partes possibilita a resolução mais rápida de um eventual problema.
Ainda que o repasse para as duas plataformas seja, em média, 12% do faturamento total da Padoca Vegan, estar fora delas não é uma opção. Hoje, metade dos pedidos via delivery são feitos por meio do Ifood e a outra metade pelo site e aplicativo próprios.
A Companhia Tradicional de Comércio, empresa de restaurantes que existe há 25 anos, lançou no primeiro semestre de 2020 a Devoro, delivery multimarcas.
O porta-voz da empresa, Bruno Grinberg, diz que estar no iFood e no Rappi impulsionou o crescimento da marca no começo da pandemia, mas, por outro lado, ele percebeu que criar uma relação direta com o cliente por meio do site próprio seria uma grande oportunidade.
“É preciso investir no relacionamento com o consumidor e lhe apresentar os benefícios para que ele prefira comprar por meio do seu site”, diz Leo Texeira, sócio da consultoria NaMesa, que atua com negócios de gastronomia.
O principal desafio é atrair o cliente acostumado aos grandes aplicativos. O Pita Kebab, restaurante árabe em Pinheiros (zona oeste de São Paulo), opera no iFood e na plataforma própria desenvolvida pela Delivery App. O primeiro responde por 80% das vendas.
Para estimular compras na plataforma própria e fidelizar clientes, Piero Mazzamati, dono do negócio, oferece “cashback” (devolução de uma porcentagem do valor da compra) e uma taxa de entrega 20% mais barata que a do iFood para quem pedir sua refeição direto com o Pita.
Para Bruno Poli, sócio do Dona Canô, restaurante de comida nordestina em Perdizes (zona oeste de São Paulo), as redes sociais, principalmente Instagram, são aliadas para direcionar os clientes ao seu canal, hospedado na plataforma Wix.
Lá são oferecidos cupons de desconto e preços mais atrativos para quem comprar por meio do seu site. Além do próprio canal, o restaurante está no Ifood, no Rappi e no App Justo. Para entregas, também usa a Borzo e a Lalaove.
Leo Texeira, da consultoria NaMesa, diz que as alternativas para se esquivar das taxas são necessárias e que o modelo híbrido, que opere nos gigantes dos setor e em plataformas próprias, parece ser um caminho para restaurantes.
Apesar das taxas, quando a marca está presente nessas plataformas, a expectativa de atrair novos clientes é maior.
“Os marketplaces trazem dois grandes valores. O primeiro é ter uma plataforma de interlocução para vender ao cliente que você já tem e o segundo é ter acesso a uma base de clientes que já usam aquela plataforma e se apresentar como opção “, diz Rubens Massa, professor do centro de empreendedorismo e novos negócios da FGV.
Procurado, o iFood se limitou a explicar como as taxas funcionam. É possível contratar duas opções de plano. Em uma delas, é cobrado 6% do valor da venda (sem acesso a entregadores) e na outra, 26% (com acesso a motoboys, caso da Padoca). Além disso, há mensalidade de R$ 100 e R$ 130, de acordo com o plano, para quem vender mais de R$ 1.800 no mês.
Por meio de nota, o Rappi afirmou que os percentuais cobrados são negociáveis e dependem de fatores que incluem a complexidade das entregas, a localização e participações em ações promocionais.