BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Deputados e especialistas avaliaram nesta terça-feira (9) que a decisão da maioria dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) de suspender emendas parlamentares dará mais força ao governo de Jair Bolsonaro e poderá piorar a transparência nas negociações políticas.
Nesta terça, o STF formou maioria para manter a decisão da ministra Rosa Weber de proibir o pagamento das emendas de relator a deputados e senadores.
Esse tipo de emenda foi incluído no Orçamento de 2020 pelo Congresso, que passou a ter controle de quase o dobro da verba de anos anteriores. Para os ministros, não há transparência nos repasses dessas emendas, que, por isso, violam os princípios constitucionais da “legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.
A verba classificada como emenda de relator é usada para privilegiar congressistas que se alinham à pauta do Palácio do Planalto e de aliados do governo no Congresso. Com isso, recebem mais emendas, que são a forma que deputados e senadores têm para enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais.
De acordo com técnicos do Legislativo, o Congresso tem o poder de remanejar os recursos que hoje estão reservados para emendas de uso para negociação política. Ou seja, a verba não ficaria parada.
A estratégia em discussão no Congresso, diante da maioria formada no STF, é destinar esse dinheiro para outra classificação dentro do Orçamento. Com isso, poderia ser liberado.
O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), avaliou que, num primeiro momento, a suspensão não fortaleceria o governo. “Como o RP9 [código de emenda de relator] está suspenso, ele vai ficar num vácuo. Agora, se acabar com a RP9, aí vai tudo para RP2 [código de despesa discricionária do governo], e fortalece o governo”, disse.
Ao ser transferida para o código de despesa discricionária, a verba de emendas entra na mesma contabilidade que gastos para funcionamento da máquina pública.
Com isso, sequer será tornado público o valor negociado com parlamentares.
O diretor-executivo da IFI (Instituição Fiscal Independente), Felipe Salto, avalia que a decisão pode acabar dando ainda menos transparência às negociações de emendas. “Hoje a gente não sabe que parlamentar originou aquela emenda. Quanto foi liberado? A gente não sabe. O que pode acontecer é o Congresso transformar tudo isso em RP2. Vai ficar pior ainda”.
Para a diretora da IFI, Vilma da Conceição Pinto, o fim da classificação de emenda de relator não resolve o problema. “Não deixaria de existir o ‘toma lá, dá cá'”, avalia.
Para o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (sem partido-RJ), a decisão do STF vai na linha correta. “A decisão garante o respeito à Constituição, e, claro, num processo de interferência no parlamento que as emendas estavam gerando, também restabelece a democracia e o papel dos partidos políticos no Parlamento brasileiro.”
Uma liderança do governo no Congresso afirma sob reserva que a suspensão que será determinada pelo Supremo Tribunal Federal questiona não apenas as emendas de relator, mas diversas outras práticas relacionadas com a formação do Orçamento.
Cita que a decisão da ministra Rosa Weber, corroborada pela maioria dos ministros, abre brecha para se questionar outros tipos de emenda, como as emendas de comissão.
Além disso, afirma que muitas questões são impossíveis de serem implementadas na prática. Aponta, como exemplo, regras de transparência. Esse senador defende que apontar o parlamentar que requisita a emenda fere o princípio da pessoalidade da elaboração do orçamento.
A publicidade completa, por exemplo, afetaria mais os senadores do que os deputados federais. Isso porque os membros da Câmara, normalmente, são eleitos representando uma base regional. Por outro lado, os senadores obtêm um apoio mais amplo em seus estados. Ao identificá-los, pode inibir emendas que consideram justificáveis por temer descontentamento em outras regiões do estado.
Por isso, acredita que seja possível fazer melhorias, como identificar as instituições e órgãos que solicitam os recursos, mas que seria inviável identificar todos os parlamentares envolvidos.
Na Casa vizinha, o Senado, a oposição comemorou a formação da maioria no STF para barrar o chamado orçamento secreto. O líder da oposição, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que se tratava de uma vitória e que agora caberia ao governo e Congresso adotarem medidas para dar mais transparência e publicidade para o assunto.
“Uma vitória, sobretudo, do povo! A maioria dos ministros votou para suspender os repasses do orçamento secreto. Além disso, governo e Congresso devem adotar medidas de transparência e publicidade. Grande dia!”, escreveu Randolfe em suas redes sociais.
Randolfe, que foi vice-presidente da CPI da Covid, também anunciou em suas redes sociais que vai começar a colher assinaturas para a instalação da CPI do Orçamento Secreto, que também chamou de “CPI do Bolsolão”.
O líder da maioria, Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou que o orçamento secreto configurava “clientelismo e corrupção”.
“As democracias não comportam segredos. Orçamento é público, não tem dono e precisa respeitar a isonomia de representação. Fora disso é a repetição do clientelismo e corrupção”, afirmou.