SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Bolsa de Valores brasileira fechou em queda de 1,34% nesta sexta-feira (22), a 106.296 pontos. No início da tarde, porém, o recuo chegou a 4,53%, à mínima de 102.853, com o mercado reagindo a rumores sobre a demissão do ministro Paulo Guedes (Economia) após a decisão do presidente Jair Bolsonaro de driblar o teto de gastos para ampliar o benefício pago pelo Auxílio Brasil, programa substituto do Bolsa Família, no ano eleitoral de 2022.
A recuperação parcial ocorreu após Guedes garantir, ao lado de Bolsonaro, que permanecerá no cargo e que não “irá rever a arquitetura fiscal brasileira”, embora tenha confirmado que aceitará o aumento nos gastos. Ainda durante a fala de Guedes, a Bolsa subiu 0,01%, oscilando pela primeira vez no azul no pregão, chegando à máxima de 107.749 pontos.
Mesmo com a redução nas perdas ao final do pregão, o resultado da Bolsa nesta sexta foi o pior em um ano. Em 20 de novembro de 2020, o Ibovespa fechou em 106.042 pontos. Apenas nesta semana, a desvalorização chegou a 7,28%, a maior desde o recuo de 15,63% na semana fechada em 13 de março de 2020, no começo da pandemia. Em 2021, o índice acumula queda de 13,15%.
As declarações do ministro também ajudaram o dólar a recuar 0,74%, a R$ 5,6250. Mais cedo, a moeda americana tinha alcançado a máxima de R$ 5,7550, alta de 1,55% ?o maior valor desde o fechamento de 30 de março (R$ 5,7580).
O mercado vem impondo preços mais altos para investir no país devido ao aumento da percepção de risco após a gestão Bolsonaro cruzar o limite da responsabilidade fiscal ao propor um drible na regra do teto de gastos. A manobra causou uma debandada no time de Guedes nesta quinta-feira (21) e gerou rumores sobre a saída do ministro.
A disparada do dólar e a forte queda da Bolsa ocorrem desde a última terça-feira (19). Na ocasião, Bolsonaro, preocupado com a popularidade às vésperas da campanha eleitoral, determinou que o novo Bolsa Família, o Auxílio Brasil, seja de R$ 400, acima dos R$ 300 estimados anteriormente.
Para cumprir a determinação do presidente, o governo avaliou que precisaria furar o teto de gastos ?regra que limita o crescimento das despesas públicas. Para driblar a regra, nesta quinta, o governo e seus aliados no Congresso inseriram na PEC (proposta de emenda à Constituição) que adia o pagamento de precatórios uma mudança nas regras do teto de gastos que, na prática, expande o limite das despesas federais.
Pelo plano, aprovado nesta quinta pela comissão especial da Câmara que analisa a proposta, a Constituição será alterada para que o teto seja corrigido anualmente pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acumulado em 12 meses de janeiro a dezembro. Atualmente, o período usado como base para o limite anual considera o IPCA acumulado em 12 meses até junho do ano anterior.
Para abrir ainda mais espaço no Orçamento, também serão retirados do teto de gastos do próximo ano recursos destinados ao pagamento de precatórios, que será parcialmente adiado. A PEC cria um limite para despesas com sentenças judiciais dentro do teto.
O conjunto das alterações previstas cria um espaço orçamentário para despesas de R$ 83 bilhões no ano eleitoral de 2022.
A manobra levou a uma debandada na Economia. Saíram do governo o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt ?subordinado a Funchal.
A secretária especial adjunta do Tesouro e Orçamento, Gildenora Dantas, e o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Rafael Araujo, também pediram exoneração.
Apesar de terem freado a alta no dólar e desacelerado as perdas no mercado de ações, as declarações de Guedes não desfizeram o cenário de aversão ao risco e futuras turbulências são esperadas, segundo Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest.
“Embora tenha ocorrido esse ajuste, após a permanência do ministro Paulo Guedes como único braço liberal do governo, o dólar rodando perto de R$ 5,60 significa aversão ao risco”, diz Consorte. “O que isso sugere é que o mercado ainda enxerga isso [o drible no teto] como uma pedalada fiscal”, afirma.
“Há muita incerteza no curto prazo que pode empurrar o dólar para cima ante o real. Por outro lado, os players acham que o real está gravemente desvalorizado, o BC [Banco Central] provavelmente aumentará seu ritmo de alta dos juros e intervenções cambiais ainda são possíveis. Portanto, a estabilidade nesses níveis não parece ser o cenário-base”, disse o Citi em nota.
Os juros futuros mantinham-se sob intensa onda de compra, com as taxas disparando mais 51 pontos-base em alguns vencimentos, aumentando a pressão para o Bacen acelerar o ritmo de aumentos da taxa Selic.
Nesta quinta, o dólar subiu 1,88%, a R$ 5,6670, a maior cotação desde 14 de abril. A Bolsa, que chegou a cair à mínima de 105.713 pontos, fechou em queda de 2,75%, a 107.735 pontos, a menor pontuação desde 23 de novembro.
As empresas listadas na Bolsa de Valores brasileira perderam R$ 284 bilhões em valor de mercado em três dias após o governo revelar a intenção de furar o teto de gastos para aumentar o valor do novo Bolsa Família.
Na última segunda-feira (18), as ações na Bolsa valiam R$ 4,984 trilhões. Ao final do pregão desta quinta, o valor caiu para R$ 4,700 trilhões, segundo dados levantados pela desenvolvedora de sistemas de análise financeira Economatica.