Não é exagero dizer que toda atenção do mercado estava voltada aos ruídos internos em Brasília ontem (19), e tudo indica que a situação se repita nesta quarta-feira (20). O suco político teve um gosto amargo para boa parte dos investidores: o Ibovespa, principal benchmark brasileiro, fechou a última terça em forte queda de 3,28% aos 110.672 pontos em meio às discussões sobre o Auxílio Brasil.
O detalhamento do novo programa social deveria ter sido divulgado na véspera, entretanto, o Ministério da Cidadania adiou o anúncio de última hora. O cancelamento em todo mal não foi negativo, ajudou ao menos o Ibovespa a reduzir levemente as perdas – o índice chegou a sair da casa dos 110 mil pontos durante o pregão.
Mesmo assim, o resultado marcou a maior variação negativa para um fechamento desde o início de setembro.
Nem mesmo a notícia dada pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA), relator da reforma do IR, que garantiu retirar a tributação de lucros e dividendos acumulados do texto, pareceu aliviar a tensão no meio econômico.
Mas então, qual o motivo de tanto temor com o Auxílio Brasil?
A percepção de risco fiscal do mercado está abalada em virtude do substituto do Bolsa Família.
A 13 dias do fim do auxílio emergencial, o governo Bolsonaro pretende anunciar o sucessor do benefício planejado para 2022, ano que o mandatário será candidato a reeleição.
A grande questão é: o novo programa social deve oferecer R$ 400 aos beneficiários do Bolsa Família, valor 111% acima do custo médio atual, de R$ 189.
O Ministério da Economia havia previsto alta mais contida, de 58%, chegando a R$ 300.
Apenas R$ 100 de diferença pode parecer pouco quando visto de primeira, porém o aumento obrigará o governo a tirar R$ 25 bilhões do programa fora do teto de gastos no próximo ano, segundo contas da equipe econômica as quais a VEJA teve acesso.
Agora, a projeção é que o gasto total com o Auxílio Brasil fique entre R$ 80 bilhões e R$ 84 bilhões em 2022. Em contrapartida, o Bolsa Família este ano custou R$ 34 bilhões aos cofres públicos.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, já havia se mostrado contra a ideia de impulsionar o programa social com gastos extraordinários, defendendo que havia possibilidade de fazer o benefício alcançar R$ 300 dentro do espaço fiscal criado pela PEC dos Precatórios.
Todavia, a ala política do governo defendeu um valor maior no ano que vem, portanto para pagá-lo, além dos precatórios, seria necessária uma solução extrateto.
A decisão deveria ter passado pelo crivo da votação da PEC dos precatórios, na comissão especial da Câmara, que também estava agendada para ontem. A reunião, marcada para hoje, deve revelar se a manobra segue ou não.
O que provavelmente será definido?
O clima de preocupação presente no mercado desde ontem parece ter sido o estopim para Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados.
O parlamentar disse a ministros que o teto não será rompido, indicando um recuo que surpreendeu o Ministério da Economia, de acordo com fontes ouvidas pelo TC.
A mesma fonte relatou que o Auxílio Brasil será redesenhado para caber no Orçamento.