Como investidores perdem dinheiro com fundos e mercado acionário

Recentemente tem-se observado um movimento de saída de fluxo dos fundos de ações e multimercados

Recentemente tem-se observado um movimento de saída de fluxo dos fundos de ações e multimercados. Movimento este que genericamente é puxado pelo investidor Pessoa Física (PF), e que se faz em luz das quedas observadas no mercado acionário dos últimos meses, mesmo com a rentabilidade de alguns fundos tendo performado acima dos seus índices de referência em períodos passados.

O problema dessa tomada de decisão é que na maioria das vezes os mercados tendem a retomar a tendência de alta após um período de queda/correção, como mostra a imagem abaixo:

Mapa de calor rendimentos mensais do Ibovespa | Fonte: Refinitive Eikon

O que vemos aqui é um apanhado da variação mensal da bolsa brasileira dos últimos 10 anos, com as áreas circuladas de vermelho representando a média daquele mês no decorrer dos anos, e que em todos os períodos de baixa, foram precedidos por um período de alta na média. Ou seja, após a tempestade, sempre vem à calmaria, e se a história se repetir, é algo que podemos esperar.

Claro que não estamos fazendo nenhuma afirmação/previsão quanto ao timing de alta e se este mês ou o próximo será de alta, mas usando dados históricos e econômicos como “plataforma de suporte” para as teses de mercado, há de se manter o pensamento otimista pautado na racionalidade e crença de que apesar do cenário atual trazer consigo algumas turbulências, a tendência de longo prazo ainda se mantêm de alta e recuperação da atividade econômica para patamares mais próximos/acima dos vistos no pré-pandemia.

Ainda assim, é engraçado dizer que no Brasil o investimento em ações e ativos de risco é algo completamente cíclico, mas não um ciclo baseado no crescimento econômico de alguns setores, propriamente dito, mas do ciclo de alta e baixa ao qual estes mesmos ativos vivenciam, podendo até mesmo traçar tais ciclos para ações específicas e que estão na moda, por exemplo.

De forma resumida, existem duas vertentes que explicam de forma generalizada o comportamento do investidor brasileiro, sendo um de cunho econômico/social e outro de cunho psicológico.

Econômico/Social
O investidor brasileiro ainda se configura como um “recém-nascido” por assim dizer, onde poderíamos dizer que os últimos anos têm sido impulsionados por um interesse crescente e cada vez maior por parte das pessoas em não apenas investir no mercado financeiro, mas de também buscar entender mais sobre.

Parte deste movimento foi impulsionado pelo advento de empresas que modificaram o status quo no que tange a forma de investir tradicionalmente efetuada em banco, outra está também alinhada a nova geração de investidores com pessoas mais ligadas à tecnologia e a informação global como um todo.

Porém, mesmo com toda a evolução, quando comparado com o investidor americano, por exemplo, o brasileiro ainda tem muito a evoluir, tanto a nível de familiaridade e conhecimento com o mercado financeiro, como pelo próprio mercado em si, mas em breve chegaremos lá…

Não obstante, um fator econômico/cultural do brasileiro é que ele possui uma Propensão Marginal ao consumo extremamente alta, reduzindo e trocando a criação de poupança pelo consumo imediato. E é fácil perceber isso no nosso dia a dia. É só olhar para a forma como o brasileiro usa seu cartão de crédito e as inúmeras “facilidades” oferecidas pelas instituições financeiras e lojas para que obtenhamos o produto de consumo e desejo de forma quase que imediata. Mesmo que, para isso, tenhamos que pagar um preço mais caro do que se adiássemos um pouco aquela compra.

Psicológico
Este é um fator que afeta a todos os seres humanos de maneira geral, onde alguns possuem uma disciplina mental maior, outras nem tanto. Desde os primórdios o ser humano foi desenvolvendo formas de defesa. Formas estas que nos ajudaram a sobreviver e nos levar ao topo da cadeia alimentar.

Apesar de toda evolução genética dos últimos milênios, carregamos algumas heranças que remontam a tais tempos pré-históricos. E assim sendo, pesquisadores a muito tem estudado e reportado a forma como o ser humano interage com o dinheiro, no qual o sentimento de perda gera uma sensação e ativa regiões do cérebro semelhantes a quando estamos com nossa vida em perigo.Inundando-o com um sentimento bem mais poderoso e forte do que quando ganhamos.

Faça um teste:
Se você leitor recebesse uma notícia agora de que ganhou R$10 mil, obviamente você ficaria feliz, e muito provavelmente já estaria fazendo planos de como usar o dinheiro. Mas se horas depois eu lhe dissesse que você teria que devolver R$5 mil, por conta de uma perda inesperada, o sentimento e a sensação seriam muito maior de quando você ganhou os inesperados R$ 10 mil, e semelhante a uma dor, por mais que fosse tudo na sua mente…

Mas o que isso tem a ver com a saída recente de capital dos fundos de ações e multimercados e todo esse último trimestre do mercado acionário?

O que isso tem a ver é que é completamente compreensível a ocorrência de tais movimentos, explicado pelos motivos acima e pelo momento recente que estamos vivendo na economia global.
Os mercados agem como ciclos, em que de tempos em tempos ocorrem momentos de euforia extrema, com investidores de todo tipo (não importando o nível de conhecimento), colhendo os frutos de seus investimentos. 

A todo momento ouvimos histórias do amigo/vizinho que ganhou uma bolada com seus investimentos, e que nos gera uma falsa sensação de que é algo fácil de se fazer, que a música nunca irá parar, e que a realização de nossos sonhos está logo ali. Rápido e fácil.

Tudo isso para logo em seguida nossos sonhos serem “estilhaçados” e frustrados. Após o período de euforia extrema, o mercado percebe que “exagerou” na alta, e que as coisas não são tão maravilhosas assim.

Daí em diante começa-se um movimento de realizações, onde os investidores com mais experiência e conhecimento são os primeiros a perceber que existe algo errado e vendem suas posições, ficando com o investidor leigo a dura tarefa de amargurar perdas.

Até que novamente o ciclo se repete, e da mesma maneira que o mercado percebe que havia exagerado na alta anterior, também percebe que exagerou na queda, e que o preço dos ativos financeiros estão muito baratos, dando início a um novo ciclo de alta e assim por diante…

Mas é justamente pela falta de conhecimento, baixa tolerância a risco (nesse caso aqui risco é igual a volatilidade), e baixa disponibilidade de tempo, ou seja, pensamento imediatista, é que os investidores pessoa física se tornam presas fáceis, e mais uma vez optam por sair do mercado no pior momento possível, calejados e prometendo a si mesmos que nunca mais irão investir em ativos de risco novamente.

E é justamente aqui que o erro acontece, pois mesmo quando nas mãos de profissionais competentes, em que muitas vezes provaram o seu valor nos últimos meses/anos (observado pelo histórico de rentabilidade de seus veículos), o investidor pessoa física parece esquecer de tudo, ficando cegos e focados demais no período mais recente de desvalorização e quase que como um lutador que apanha num ring de luta, clama para que seu treinador jogue a toalha e pare de uma vez por todas com o sofrimento.

Em suma, o que falta ao investidor brasileiro não é apenas a busca por mais conhecimento e informações de onde está colocando seu valioso e suado patrimônio, mas de uma paciência mais elevada e a sabedoria de que as coisas boas levam tempo, sendo um trabalho difícil e carente de disciplina.

Afinal, Roma não foi construída em um dia, e nem mesmo a sua riqueza será, não é mesmo?