BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Relator do projeto que cria o Auxílio Brasil (substituto do Bolsa Família), o deputado Marcelo Aro (PP-MG) quer que o benefício médio do programa social seja reajustado anualmente pela inflação.
O deputado também defende que as faixas de pobreza e extrema pobreza (critérios de entrada de uma família no programa social) sejam ampliadas de acordo com os índices de preços.
Esse tipo de correção automática não existe hoje no programa social e contraria os planos do governo, pois impõe um aumento de despesas públicas.
“A MP [do Auxílio Brasil] é uma carta de boas intenções, mas ele não fala em números; não delimita o que é pobreza e extrema pobreza, por exemplo. O texto precisa trazer valores definidos e uma correção natural, como pela inflação, para que o cidadão saiba de fato o que vai acontecer”, afirmou Aro à reportagem.
O governo de Jair Bolsonaro até hoje não concedeu reajuste ao benefício do Bolsa Família, que paga em média R$ 190 por mês para cada lar beneficiado. O último aumento foi em julho de 2018, na gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB).
Na época, o valor médio transferido às famílias foi de R$ 188. Se o valor fosse corrigido pela inflação do período, estaria hoje em patamar de aproximadamente R$ 219.
No Auxílio Brasil, Bolsonaro prometeu que esse patamar será de pelo menos R$ 300 por mês. Portanto, com um reajuste acima da inflação.
No caso da correção pela inflação das faixas de pobreza e extrema pobreza, a medida aumentaria gradualmente o espectro de famílias aptas ao programa, o que também pode ampliar as despesas do governo.
Esses requisitos também não são reajustados desde o governo Temer. Bolsonaro ainda não deu indicações se esse pilar do programa será alterado.
Hoje, para entrar no Bolsa Família, é preciso estar no Cadastro Único (que reúne potencial público de programas sociais), ter atualizado os dados há menos de 24 meses, com informações consistentes e sem pendências.
O Cadastro Único do Bolsa Família considera, desde 2018, em extrema pobreza pessoas com renda mensal de R$ 89 por membro da família.
Rendimentos entre R$ 89,01 e R$ 178 são classificados como situação de pobreza. É possível acessar o programa mesmo sem filhos.
Corrigindo os valores pela inflação, esses critérios seriam de aproximadamente R$ 103,60 por mês (extrema pobreza) e R$ 207,30 (pobreza).
Os patamares que estão em avaliação pelo governo são de R$ 95 e R$ 190. Mas esse reajuste fica abaixo da inflação do período.
Para o economista Marcelo Neri, diretor do FGV Social, a proposta do relator seria um avanço para garantir a proteção social dos mais vulneráveis, principalmente em períodos de inflação acelerada.
“Hoje o primeiro na fila do ajuste fiscal no Brasil é o mais pobre, seja pela falta de reajuste do Bolsa Família, seja pelas filas de espera [para entrar no programa]. O reajuste nas linhas de pobreza não cobre o atraso”, afirmou Neri.
Além do aumento no benefício médio (renda transferida aos mais carentes), o governo planeja elevar o número de beneficiários, passando de 14,7 milhões de famílias para aproximadamente 17 milhões a partir de novembro.
Com isso, o custo do programa tende a subir para cerca de R$ 53 bilhões por ano. No Orçamento de 2021, a verba para o Bolsa Família é de R$ 34,9 bilhões.
Um reajuste automático do valor do benefício e da faixa de renda para que famílias possam ter acesso ao programa representaria, portanto, um potencial de aumento dos gastos na área social.
Como o governo, por lei, não é obrigado a atender a todas as famílias que estão dentro da faixa de pobreza e extrema pobreza, há uma fila de espera no programa social.
A fila, que atualmente está em torno de 1,2 milhão de cadastros, se formou porque a verba do Bolsa Família tem ficado menor que o necessário para atender a todos que tiveram o cadastro analisado pelo governo.
Ao anunciar, na quinta-feira (17), que o Auxílio Brasil deverá atender a 17 milhões de famílias, Bolsonaro então pretende zerar a fila de espera –e ainda incluir pessoas com cadastro a ser analisado.
Ao promover essa inclusão das famílias que esperavam para acessar o programa, o governo beneficiará estados em todas as regiões. Proporcionalmente, o Amapá terá o maior volume de inseridos, com um aumento de 16,8% no número de beneficiados.
Em seguida, aparece Mato Grosso do Sul, com ampliação de 12,5% em relação ao número de famílias atendidas pelo programa hoje. O aumento será de 12% em São Paulo, 11,3% em Roraima, 10,7% em Mato Grosso, 10,3% no Rio de Janeiro e 9,5% em Sergipe.
A entrada de famílias no programa é feita por um sistema do Ministério da Cidadania que considera dados de estimativa de pobreza em cada estado com base no Censo de 2010. Como ainda não houve um novo Censo, técnicos do governo reconhecem que as informações estão defasadas.
A prioridade é dada para famílias dos estados que, segundo essas informações do Censo de 2010, estão mais distante de atingir a inclusão de 100% da população vulnerável.
Ainda não há previsão para que o relator divulgue a nova versão do projeto que cria o Auxílio Brasil.
Por ser uma MP, a proposta tem efeito imediato, mas precisa do aval do Congresso em 120 dias para não perder a validade. Esse prazo se encerra em dezembro. O governo, porém, quer concluir esse processo até outubro.
Com isso, o Auxílio Brasil poderá entrar em funcionamento em novembro, conforme prometeu Bolsonaro.