As incertezas aumentadas pela crise política, desemprego, inflação e risco de falta de energética têm feito com que os economistas reduzam ainda mais as projeções de crescimento da economia para o ano que vem.
Analistas que há algumas semanas estimavam uma alta acima de 2% do PIB (Produto Interno Bruto) para 2022 agora já avaliam que o crescimento pode ficar abaixo de 1%.
O Itaú Unibanco, por exemplo, que projetava um crescimento de 1,5%, revisou o avanço para 0,5% em 2022. Para este ano, a projeção também caiu, de 5,7% para 5,3%.
“Projetamos desaceleração do crescimento do PIB para 2022, uma vez que os fatores que impulsionaram o crescimento deste ano estão se esgotando. A revisão decorreu principalmente da nossa expectativa de taxa de juros mais elevada”, diz o banco.
O Itaú Unibanco também vê uma desaceleração do setor industrial global e queda de preços de commodities ano que vem. “Por último, a atividade econômica não se beneficiará mais do impulso advindo da reabertura do setor de serviços, algo que, na nossa visão, ficará restrito ao segundo semestre deste ano”, diz texto da instituição.
Os economistas do banco também citam os efeitos da crise hídrica sobre a inflação e ressaltam temor de que um possível descumprimento do teto de gastos no ano que impacte no câmbio.
O Banco JP Morgan, que antes também projetava 1,5% de crescimento para o ano que vem, revisou a expectativa para 0,9%.
A MB Associados é outra casa de análise que trouxe cenários mais pessimistas para o ano que vem. Antes, trabalhava com crescimento de 1,4% para o PIB de 2022, mas revisou as estimativas para 0,4%.
“Isso se dá por efeito da crise, que não tem solução de curto, com a piora da inflação e dos juros empurrando a economia para baixo ano que vem”, explica o economista-chefe da MB, Sergio Vale.
Para o ano que vem, a consultoria prevê uma queda de 1,4% no desempenho da indústria, com destaque negativo para a indústria de transformação (-1,9%) e para a construção civil (-2,1%). O destaque positivo deve ser da agropecuária, com avanço esperado de 5%.
Na mesma linha, o Safra já havia mudado suas projeções para 2022, de 1,5% para 1,1%. O Haitong também alterou seus indicadores, de 1,5% para 1%.
Nesta terça-feira (14), os economistas da XP também revisaram suas estimativas para o ano que vem, mas com um tom mais otimistas que outras instituições. Agora, esperam um crescimento de 1,3%, ante 1,7% na projeção anterior.
“O aumento das tensões políticas nas últimas semanas torna o quadro mais complexo. Um possível desfecho pode conter mudanças arriscadas na estrutura do teto de gastos para acomodar mais despesas discricionárias”, diz relatório da XP.
A equipe econômica da XP atribui a revisão aos efeitos da política monetária mais apertada, com aumento dos juros básicos para tentar conter a inflação, e as incertezas crescentes para a economia no ano que vem.
“Incertezas e volatilidade pesam sobre a atividade econômica em 2022. No curto prazo, a atividade vai bem e esperamos 5,3% de crescimento este ano. Mas o ano que vem ainda preocupa”, diz o economista-chefe da XP, Caio Megale.
“Podemos ter algum crescimento no primeiro trimestre de 2022 e um resultado perto de zero nos próximos trimestres do ano.”
Outra fonte de preocupação dos economistas no ano que vem é a crise hídrica, que afeta os reservatórios das hidrelétricas e eleva o risco de racionamentos e apagões.
Segundo cálculos de economistas da XP, um racionamento de energia que reduza em 10% o consumo de eletricidade por um ano poderia tirar 1,2 ponto percentual do PIB brasileiro de 2022 e zerar o crescimento do país.
Há também outros riscos no horizonte, como uma proposta de Orçamento que não fica de pé, o que sempre coloca mais dúvidas sobre a questão fiscal, completa Megale, além das incertezas políticas.
Nesse cenário, a XP também elevou a projeção para a taxa de câmbio, de R$ 4,90 para R$5,20 no final deste ano. Para o final de 2022, ajustaram de R$ 4,90 para R$ 5,10.
Além disso, a pressão sobre a inflação corrente está se mostrando mais persistente e disseminada, lembra a consultoria. “Este fato, aliado ao aumento das incertezas fiscais, nos levou a elevar a projeção de taxa Selic, os juros básicos, ao final do ciclo de aperto monetário para 8,50% (antes em 7,25%)”, afirma relatório da XP.
Em conversa com investidores na última sexta-feira (10), o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que a escalada nos preços é uma “sombra” que paira sobre o governo. A XP segue nessa mesma linha. “Acho que estamos no pior momento da inflação, mas vai começar a desacelerar gradualmente e encerrar o ano em volta de 8%, entre 7,5% e 8%”, diz Megale.
Em agosto, o IPCA (Índice de Preços ao Consumido Amplo) registrou a maior alta para o mês em 21 anos, de 0,87%, divulgado na semana passada. Em 12 meses, o índice chegou a 9,68%.
Os economistas também alertam para uma desaceleração da economia global no ano que vem, o que prejudicaria a recuperação do Brasil. Os preços de commodities pararam de subir, e alguns deles estão caindo, como o minério de ferro, lembra Megale.
Esse ambiente internacional pior tende a ter dois efeitos para Brasil. Prejudica o crescimento, mas pode contribuir para uma desaceleração da inflação no Brasil no ano que vem.
“Projetamos agora inflação em 8,4% em 2021 (ante 7,7%) e 4,2% em 2022 (ante 3,9%). A inflação corrente segue alta e mostra repasse para itens mais inerciais, como serviços”, diz o relatório do Itaú Unibanco, assinado pelo economista-chefe Mário Mesquita.
Os analistas de mercado ouvidos pelo Boletim Focus, do Banco Central, também têm revisado para baixo as perspectivas de aumento do PIB no ano que vem. Há um mês, esperavam um avanço de 2,05; agora, trabalham com 1,72%.