RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O mercado de trabalho brasileiro ensaiou reação no segundo trimestre, com trégua no desemprego e aumento na população ocupada. Os sinais de melhora, contudo, foram insuficientes para recuperar a renda média dos trabalhadores, que voltou a cair, mostram dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua).
Na visão de economistas, esses fatores, em conjunto, sinalizam que a abertura de vagas -formais e informais- tem sido acompanhada por salários menores.
O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou a Pnad do segundo trimestre nesta terça-feira (31). Conforme o levantamento, o número de profissionais ocupados avançou 2,5% na comparação com o primeiro trimestre deste ano.
Com isso, passou de 85,7 milhões para 87,8 milhões -acréscimo de 2,1 milhões. Os ocupados são os trabalhadores que estão atuando com ou sem carteira assinada ou CNPJ.
O avanço da ocupação acabou levando a taxa de desemprego para baixo, que caiu de 14,7% para 14,1% no segundo trimestre. O número de desempregados foi estimado em 14,4 milhões -estava em 14,8 milhões nos primeiros três meses do ano.
A questão é que, ao mesmo tempo que houve alta na ocupação, o rendimento médio real, habitualmente recebido pelos trabalhadores empregados, recuou para R$ 2.515 no segundo trimestre.
A baixa foi de 3% em relação ao primeiro trimestre de 2021 (R$ 2.594) e de 6,6% frente ao período de abril a junho de 2020 (R$ 2.693). Os dados foram deflacionados pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
“O número de desempregados, mesmo com a queda, ainda é muito volumoso no país. Há um excesso de mão de obra. Isso faz com que, em um primeiro momento, a retomada no mercado de trabalho venha com salários médios menores”, frisa o economista Ely José de Mattos, professor da Escola de Negócios da PUCRS.
Segundo Adriana Beringuy, analista da pesquisa do IBGE, o rendimento inferior também pode ser associado ao avanço dos trabalhadores subocupados. Esse grupo, que voltou a bater recorde, reúne profissionais que trabalham menos horas do que gostariam.
No segundo trimestre, os subocupados chegaram a 7,5 milhões no país, aumento de 7,3% (mais 511 mil) frente ao início deste ano.
“Tivemos uma reação na ocupação, não correspondente com o rendimento”, indicou a analista.
Os dados do IBGE mostram que, na fase inicial da pandemia, o quadro era diferente. À época, enquanto o número de desocupados caiu, o rendimento médio subiu. Na visão de economistas, isso mostra que os trabalhadores que conseguiram se manter na ativa foram aqueles com salários maiores.
Com mais pessoas voltando ao mercado, a situação mudou. O rendimento médio começou a encolher no quarto trimestre de 2020, na série de comparação com os três meses imediatamente anteriores.
“O quadro atual é oposto ao do começo do ano passado, quando houve perda muito grande de vagas e aumento da renda média. As pessoas agora estão voltando ao mercado de trabalho com um salário mais baixo. Por isso, a renda média cai”, analisa o economista Rodolpho Tobler, pesquisador do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
“Estamos em um primeiro caminho da recuperação no mercado de trabalho, que deve ser lenta e gradual”, completa.
De abril a junho, o rendimento médio ficou mais enxuto tanto em ocupações informais quanto em vagas formais. Entre os empregados com carteira assinada, por exemplo, houve baixa de 0,8% ante o primeiro trimestre. Nos empregados sem carteira, a variação negativa foi de 0,6%.
Já nos trabalhadores por conta própria com CNPJ, a queda chegou a 8,5%. Nos autônomos sem o registro, a redução foi de 1,6%.
Para Mattos, da PUCRS, a recuperação da renda vai depender em grande parte da velocidade da retomada da economia como um todo. A reação da atividade, no entanto, é ameaçada por fatores como a pandemia prolongada e a crise hídrica, que encarece as contas de luz e pressiona a inflação.
A inflação mais alta, lembra o economista, diminui o poder de compra das famílias, enquanto o desemprego permanece em nível elevado. “Além de o rendimento ter ficado menor, o trabalhador também sente a pressão inflacionária”, diz Mattos.
Estudo da consultoria IDados, produzido antes da Pnad do segundo trimestre, apontou que, na fase inicial da pandemia, em 2020, o setor de serviços foi o mais prejudicado pela crise no mercado de trabalho. É que, no ano passado, atividades que pertencem a esse segmento tiveram queda tanto na ocupação quanto no rendimento médio.
“Combinados, esses resultados indicam que o setor de serviços sofreu duplamente com a crise [em 2020], com a diminuição do emprego e dos rendimentos dos trabalhadores que conseguiram se manter empregados. Em outros setores, como a indústria e o comércio, embora a ocupação tenha caído, os rendimentos subiram com a crise [no ano passado]”, frisa o levantamento.
No segundo trimestre de 2021, atividades do ramo de serviços tiveram desempenho positivo na ocupação, embora a renda tenha seguido em baixa, apontam os dados da Pnad.
Serviços de alojamento e alimentação, por exemplo, viram a população ocupada subir 9,1% em relação ao primeiro trimestre. O rendimento, contudo, teve variação negativa de 10,2% frente ao mesmo período.
A taxa de desemprego entre abril e junho (14,1%) ficou abaixo do esperado pelo mercado. Analistas consultados pela agência Bloomberg projetavam taxa de 14,4%.
Em nota, o Banco Original afirmou nesta terça que o “mercado de trabalho sinaliza recuperação mais rápida do que o esperado, embora alguns sinais de cautela persistam”.