SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Negociações demoradas, abatimentos, benefícios, muita dúvida e expectativa com a retomada da atividade econômica. A rotina de quem trabalha com imóveis comerciais em São Paulo tem sido de muita visita e pouca assinatura.
E, ainda assim, a situação já é melhor do que a registrada em 2020, quando milhares de imóveis e salas comerciais foram desocupadas em decorrência da crise econômica e das medidas de quarentena determinadas no início da pandemia.
Roseli Hernandes, diretora de locações comerciais da Lello Imóveis, diz que o volume de contratos não-residenciais fechados de janeiro a junho deste ano representa um crescimento de 45% na comparação com o mesmo período do ano passado.
Em relação ao primeiro semestre de 2019, no pré-pandemia, o resultado é 16% menor. ?Ainda está ruim, mas já melhorou. Começamos a ver mais interesse em salas, mas é um mercado que ainda vai sofrer um pouco?, diz.
Dúvidas quanto ao ritmo da vacinação e a solidez da retomada das atividades acabam freando o ritmo de novos negócios.
Valentina Caram ?conhecida na capital paulista por incluir sua foto nas placas de aluga-se ou vende-se? diz ter percebido uma melhora no mercado de salas e imóveis comerciais nos últimos três meses.
Os acordos, segundo a corretora, têm sido demorados e difíceis. ?Cada negociação é um parto. Só fecha com escalonamento no pagamento e carência, ou benefícios do tipo?, diz. Com o aumento na vacância, os proprietários estão mais propensos a ceder.
Segundo a consultoria RealtyCorp, a cidade de São Paulo tem 5,04 milhões de metros quadrados locáveis em salas comerciais, além de 11,04 milhões de metros quadrados em edifícios corporativos de todos os padrões.
As consultorias não monitoram a situação das salas comerciais, mercado mais pulverizado entre investidores pessoas físicas, que são os que sofrem mais nessas situações de paralisia. Ainda assim, Roseli, da Lello, diz que o número de imóveis à venda não aumentou de maneira significativa.
?Tradicionalmente, já há no mercado secundário um número elevado de salas e conjuntos para vender.?
Segundo Valentina Caram, existem negociações alternativas em andamento, como o arrendamento de prédios para redes de hotéis ou para a conversão em imóveis residenciais, como no caso do Flamingo Palace, no Rio de Janeiro.
Esse processo, porém, é tecnicamente complicado, diz o corretor Hirao Sakamoto, pois demanda licenças específicas para cada atividade.
Para o advogado Adson Maia da Silveira, a retração do mercado no início do ano passado foi a oportunidade de investir em uma laje de quase 500 metros quadrados no 15º andar de um prédio na avenida Paulista (região central de São Paulo).
?Queríamos imobilizar parte do patrimônio e surgiu essa oportunidade. Conseguimos um bom desconto pelo período?, diz o advogado, que fechou negócio no fim de abril de 2020, pouco mais de um mês depois do início da pandemia.
Do espaço disponível, onde é possível montar até dez salas, somente duas estão alugadas. Para o investidor, porém, o desempenho está dentro do esperado. ?Projetamos até dois anos mais lentos. Foram muitos fechamentos [de empresas], muita gente entregou imóvel, mas temos o diferencial da localização e o preço foi muito bom.?
No mercado de lajes corporativas de alto padrão, a taxa de vacância atual na região da av. Paulista é considerada neutra, em 15% ?quando não é mais vantajosa para o proprietário, nem para quem vai locar.
No segundo trimestre deste ano, segundo dados da SiiLA, o mercado de escritórios classe A e A+ registrou mais contratos fechados do que devoluções. No fim de junho, a taxa de ocupação estava em 76,4%.
Para a Cushman&Wakefield, a absorção líquida ?a relação entre locações e devoluções? ficou negativa em 17,4 mil metros quadrados na capital. A consultoria registrou uma ligeira melhora no número de locações contratadas. O ritmo, porém, ainda é lento e não dá conta de superar as devoluções.
EM ALPHAVILLE, FILA POR CASAS E SALAS VAZIAS
Salas comerciais e lajes corporativas vagas de um lado, fila de espera por casas prontas, de outro. O mercado imobiliário em Alphaville, bairro planejado do município de Barueri, na Grande São Paulo ?e também em Santana de Parnaíba, cidade vizinha? vive uma contradição: enquanto os escritórios vazios se abundam, o aumento no interesse por casas na região vem elevando preços e esgotando o estoque de imóveis terminados.
A valorização no preço final de casas prontas chega a ser de R$ 1 milhão entre meados de 2020 e o início deste ano.
Segundo o índice Fipezap, os imóveis em Barueri tiveram valorização de 1,95% em junho e acumulam alta de 6,60% em 12 meses. O preço médio do metro quadrado residencial está em R$ 7.176, o oitavo maior entre as 50 cidades nas quais a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) realiza a pesquisa. A variação média nacional ficou em 0,57% em junho, e chegou a 4,76% em um ano.
Corretores que atuam na região dizem que a adoção do home office e a percepção de que ele será mantido, ainda que parcialmente, colaboraram para o aumento no interesse nos conjuntos residenciais da região, onde o forte são as casas espaçosas para famílias de renda alta.
Para quem trabalha na capital, o trabalho remoto significa evitar vias de trânsito intenso, como a rodovia Castelo Branco (BR-374, SP-280) e a marginal Pinheiros. Em dias bons, esse deslocamento leva pelo menos uma hora.
?Estamos ficando sem produto no residencial. Do ano passado para cá, vendeu o que estava no preço, e quem viu oportunidade e subiu o preço, também vendeu?, diz Moira Barauna, da Viva Prime.
O perfil de novos moradores da região também vem mudando, na avaliação dela. ?Vemos que aquele profissional em home office, que morava em apartamento, passa a procurar Alphaville. Temos visto demanda forte de gente que mora na zona norte [da capital] e das cidades do ABC?, afirma.
Até o início da pandemia, a corretora via procura maior entre moradores de bairros de classe alta como Alto de Pinheiros e Vila Leopoldina, na zona oeste, e Brooklin, na zona sul.
O metro quadrado em Alphaville não é barato, mas, na comparação com a capital, é o equivalente ao cobrado em Santana, bairro de classe média na zona norte da capital.
Com tanta procura, até imóveis mais antigos, os da primeira fase do bairro desenvolvido a partir do fim dos anos 1970, despertaram interesse, ainda que demandem reformas para atualizar estruturas como esquadrias e melhorar instalações elétricas e hidráulicas.
?As pessoas esperam algo mais de Alphaville, um produto que elas não encontram na capital. O bairro é antigo e, nos primeiros residenciais, as casas estão velhas, mas, mesmo assim, há procura. São casas na faixa de R$ 2 milhões, R$ 2,5 milhões.?
Dario Ferraço, da SF Consultoria, diz que a região tem atributos, como segurança, limpeza e tranquilidade, que ficam atraentes diante da perspectiva de manutenção do home office. ?O preço subiu muito. De R$ 6.500 a R$ 6.800, pode chegar a R$ 10 mil hoje.?
No segmento comercial, mesmo com os espaços desocupados os preços não caem e, segundo Vicent, da Alphalink, o mercado está devagar, mas não está parado.
Desocupações importantes, como as realizadas por Enel e Cielo, chamam a atenção pois colocam no mercado muitos metros quadrados de uma só vez.
A Enel deixou Barueri para ocupar lajes em um dos edifícios do Parque da Cidade, complexo na região da avenida Chucri Zaidan, na capital. A Cielo também entregou parte dos andares que ocupava no município da Grande SP.
A C&A, que tem escritório na região, também devolveu espaços locados e reformulou a distribuição das mesas de trabalho na sede.
Somadas a essas devoluções, um volume importante de entregas foi feita nos últimos anos. A maioria dos espaços, no entanto, não se encaixa no conceito do A+ ou AAA, o triple A, como os prédios corporativos de elite são chamados.
?Alphaville sempre foi um pulmão de São Paulo. Era a primeira a vagar em tempo de crise, e a última a ocupar em tempos de bonança. Obviamente, as empresas sempre preferiram estar em São Paulo. Desde 2012, quando se construiu muito, a taxa de vacância está na média em 25%, nunca estabilizou. Já chegou a 40%, e agora está em 33%, e temos tendência de alta?, diz Fernando Didziakas, sócio-diretor da consultoria Buildings.
Na avaliação dele, a situação do segmento comercial na região é uma espécie de ?bomba-relógio?, uma vez que a temporada de devoluções continua.
Segundo a RealtyCorp, a taxa de vacância na região está entre 19%, nos edifícios tipo A+, e chega a 41%, nos demais padrões.
O perfil dos imóveis em Alphaville é misto, com lajes livres e andares com salas comerciais, muitas delas de diversos pequenos investidores pessoa física.
Apesar do aperto, corretores da região dizem que os proprietários não negociam, comportamento que vem de um acordo tácito ?se um não cede, nenhum outro é obrigado a ceder. A manutenção dos preços vem também do modelo de investimento.
?Quem constrói em Alphaville é investidor da região. Ou é uma grande construtora ou é um pool de construtores. Eles criam um cartel entre eles para segurar o preço de salas comerciais. Tem lajes inteiras paradas, mas o proprietário não quer ver cair de R$ 7.000 para R$ 3.000 [o preço do metro quadrado]?, diz Moira, da Viva Prima.
Outros corretores ouvidos pela reportagem confirmam a percepção do comportamento de cartel. Segundo ele, muitos dos prédios das zonas comerciais, especialmente em Alphaville Industrial e no 18 do Forte, foram erguidos por grupos de investidores da região, já preparados para encarar eventuais flutuações na ocupação.
Vincent Henri Ducarme, da Alpha Link, diz que há absorção ocorrendo. Mesmo que os preços continuem iguais, o custo para montar um escritório na região é muito menor do que nos bairros de interesse na capital paulista. Negócios novos, empresas jovens e de tecnologia veem a região como vantajosa, pois o custo é menor.
O aumento na ocupação residencial também tende a ter um efeito positivo sobre os imóveis comerciais, atraindo outros tipos de clientes, como médicos, dentistas e toda uma gama de comércio.