O desempenho do Ibovespa, principal índice acionário brasileiro, surpreendeu em 2023. Em um ano marcado pela volatilidade do mercado, a bolsa superou desconfianças e bateu recordes seguidos nos últimos pregões do período.
De janeiro a dezembro, o Ibovespa acumulou alta de mais de 22%, a maior desde 2019, último período antes da pandemia da Covid-19. Na sessão derradeira do ano, na quinta-feira (28), a bolsa fechou em queda de 0,01%, aos 134.185 pontos, a maior pontuação em termos nominais (sem considerar a inflação) já observada na história do indicador.
O percurso percorrido para culminar nos números positivos ao final de 2023 foi árduo, especialmente no primeiro semestre. Ainda no final de 2022, quando Fernando Haddad foi confirmado como ministro da Fazenda, o ceticismo tomou conta do mercado e a preocupação com o fiscal não saia da cabeça dos investidores.
Aliado a isso, uma bomba de proporção catastrófica explodiu com o anúncio do rombo fiscal bilionário da Americanas (AMER3). Ainda no cenário interno, na primeira metade do ano o BC (Banco Central) não dava sinais claros de redução na taxa de juros.
No exterior, o quadro também não era nada animador. Os EUA atravessam uma séria crise no seu sistema bancário com a falência de quatro grandes instituições financeiras: o Silicon Valley Bank (SVB), o Signature Bank, o Silvergate e o First Republic Bank.
Como tentativa de conter a inflação, o Fed (Federal Reserv) optou por manter o ciclo de alta na taxa de juros norte-americanas. Nesse contexto, a bolsa brasileira chegou à mínima de 97 mil pontos em março.
Porém, aos poucos, o cenário foi mudando. Ainda que com algumas dúvidas e resistências, as propostas econômicas do governo começaram a avançar no Congresso Nacional e foram ganhando adesão do mercado.
O arcabouço fiscal e a reforma tributária passaram por meticulosas análises da Câmara dos Deputados e Senado, foram aprovados e sancionados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo semestre.
Na virada para a segunda metade do ano, os números começaram a convergir de forma positiva para economia brasileira. O Copom (Comitê de Política Monetária) do BC iniciou a sequência de cortes de 0,5 p.p. na Selic, encerrando o ano em 11,75%. Por sua vez, o Fed pausou as altas e iniciou a manutenção dos juros nos EUA. Por lá a taxa está no patamar de 5,25% a 5,50%.
“No final do ano passado, quem focou mais nos fundamentos das empresas do que no ruído político percebeu que o preço não refletia a real situação de muitas empresas, que apresentavam balanços sólidos, lucros crescentes e pagamento de dividendos. A alta no ano de 2023 veio para reduzir a discrepância que existia entre preço versus fundamento”, avalia o especialista em finanças e investimentos, Hulisses Dias.
“O arrefecimento da inflação, seguido por reduções nas taxas de juros contribuíram para um ambiente de menor aversão ao risco. A introdução do arcabouço fiscal, mesmo causando questionamentos por parte do mercado sobre a sua eficiência, serviu para que tivéssemos uma menor incerteza quanto a política fiscal, tema este de suma importância para o futuro do país”, complementou.
Ações de destaque
A campeã em ganhos no Ibovespa em 2023 foi a Yduqs (YDUQ3). A companhia é a nova marca da Estácio Participações, empresa especializada em educação com atuação focada no Ensino Superior, que foi constituída em 2007, ano em que realizou seu IPO.
Suas ações valorizaram 123,14% nos últimos 12 meses. “O setor de educação é destaque na bolsa em 2023, com retorno bastante acima do Ibovespa. Dentro do setor, a Yduqs foi a vencedora. O desempenho pode ser explicado pela capacidade de geração de caixa, que contribuiu para a desalavancagem, e pela expectativa de continuidade no crescimento do EBITDA”, avaliou Hulisses Dias.
Na outra ponta ficou a Casas Bahia (BHIA3). A gigante do varejo passou por importantes mudanças ao longo do ano, o que impactou diretamente no seu desempenho na bolsa. A companhia teve queda de 81,03%, a maior de 2023.
“A Casas Bahia, dentre as varejistas, se mostrou a mais frágil diante de um cenário de taxas de juros altas e consumo fraco. A empresa apresenta alto endividamento, índices de liquidez bem abaixo do ideal e margens baixas. Em um setor de forte concorrência, a Casas Bahia não demonstra capacidade de bater de frente com Mercado Livre, Amazon e Magazine Luiza, que foram as empresas que se beneficiaram com o escândalo da Americanas”, analisou Dias.
“O cenário para o varejo em 2024 é mais favorável, no entanto, Casas Bahia juntamente com a Americanas deverão seguir numa posição desfavorável frente as concorrentes”, projetou.
Projeções
Apesar da perspectiva de redução da atividade econômica no próximo ano, a expectativa é de que o Ibovespa continue a performar bem, segundo a projeção da estrategista de renda variável da InvestSmart XP, Mônica Araújo.
“A perspectiva para o principal índice da bolsa brasileira para 2024, é positiva, basicamente pela fundamentação da continuidade da redução da taxa de juros e de suas consequências para a atividade econômica no médio e no longo prazo. Além disso, estamos com um cenário internacional que pode contribuir positivamente para essa perspectiva, dado que a fase mais restritiva das condições financeiras implementadas pelos BC´s para redução dos índices de inflação parece ter ficado para trás”, afirmou.
“Nesse aspecto é possível que tenhamos o início de corte na taxa de juros das principais economias do mundo, o que também traz um panorama positivo para os ativos de riscos. Como o Brasil começou esse processo de ajuste nas taxas de juros antes que outros países, acreditamos que a desaceleração econômica, reflexo dessa fase restritiva, deva também ser observada antes, o que é decisivo para as empresas brasileiras”, complementou.
A estrategista acredita que a bolsa tem condição de bater novos recordes em 2024. “Esperar que o Ibovespa termine 2024 num intervalo entre 140 e 150 mil pontos é possível, dadas as condições destacadas anteriormente. É importante ressaltar que essa perspectiva não significa que não tenhamos volatilidade no mercado de renda variável, com a percepção dos agentes econômicos sobre a precificação momentânea dos ativos”, finalizou.