Nas últimas semanas, voltou à tona a discussão sobre o fim da isenção de impostos aos produtos importados até o valor de US$ 50. Desde agosto do ano passado, empresas inscritas no programa Remessa usufruem do benefício.
O retorno do debate aconteceu após o deputado Átila Lira (PP-PI) incluir o fim da isenção no relatório do Programa Mover (Mobilidade Verde e Inovação). Como justificativa, o parlamentar defendeu que a manutenção do benefício pode “gerar desequilíbrio com os produtos fabricados no Brasil, que pagam todos os impostos”.
Em reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), na terça-feira (7), a maioria dos líderes partidários se posicionaram contra o benefício. Ao mesmo tempo, varejistas e indústrias brasileiras pressionam para o fim da faixa de isenção.
Na avaliação do advogado tributarista Erick Quedevez, a taxação das importações tem como plano de fundo, principalmente, a proteção do mercado nacional. Segundo o especialista, embora o programa Remessa tenha possibilitado o pagamento antecipado da alíquota de ICMS e fortalecido a fiscalização, os varejistas ainda estão insatisfeitos.
De acordo com Quedevez, o benefício cria uma concorrência desleal porque os cursos de produção em outros países são muito baixos. “Se todos os produtos tiverem que pagar 60% de imposto de importação, essas aquisições vão acabar, porque o custo vai ficar muito alto. E certamente, isso refletiria no mercado interno, já que, se você não comprar de fora, será obrigado a comprar no mercado interno”, explica o advogado.
“Do outro lado, temos um mercado consumidor que precisa ter acesso a produtos mais baratos e que, às vezes, nem tem aqui [no Brasil]. Então, para o mercado consumidor, é importante ter acesso a esses produtos com preços atrativos”, completa Erick.
Outro debate, pontua o economista Marcelo Ferreira, diz respeito ao espaço para a sonegação. Segundo Ferreira, argumentos contra o fim da isenção defendem que a decisão pode gerar um alto custo para o governo fiscalizar produtos a preços reduzidos e que, de alguma forma, poderia haver espaço para a sonegação, frustrando, assim, as expectativas da União em relação à arrecadação.
“Por outro lado, os que são a favor do fim do benefício costumam respaldar a opinião justamente na ideia de que vai haver um combate à sonegação, com a alegação de algumas empresas estavam encontrando formas de burlar a legislação, fazendo com que produtos mais caros do que US$ 50 pudessem entrar no Brasil como se valessem até US$ 50. Consequentemente, escapando da tributação”, diz Marcelo.
Deliberação sobre isenção de impostos implica em trade off
Na avaliação dos especialistas ouvidos pelo BP Money, como qualquer decisão econômica, a deliberação sobre a manutenção ou fim da isenção do benefício implica em um trade off, ou seja, em uma escolha de assumir determinadas consequências ou determinados riscos para se obter determinados ganhos.
De acordo com o especialista em finanças e investimentos Marlon Glaciano, como toda isenção e sua respectiva falta de arrecadação, há um desequilíbrio que será justificado em outra fatia de arrecadação para prover equilíbrio financeiro.
“Caso o benefício termine, é normal que se tenha um aumento do valor que justifique esse repasse a mais no imposto. Os principais produtos impactados ainda são os eletroeletrônicos, os mais cobiçados pelos brasileiros”, destaca Glaciano.
Nesse contexto, a Receita Federal, em seu relatório bimestral, defendeu a manutenção da isenção do imposto de importação enquanto se avalia “os efeitos da estratégia adotada em relação à política tributária para remessas internacionais”.
Para Marcelo Ferreira, essa postura, somada a proposta de meio-termo feita por setores do governo, com imposto de importação na faixa dos 28%, denota um viés político, não econômico.
“Quem faz compras nessas plataformas é, majoritariamente, a população de menor renda, que busca alternativas para suprir suas necessidades de consumo sem se onerar tanto. Uma medida como essa [o fim da isenção] é, obviamente, impopular junto a essa camada da população e implicaria, em um primeiro momento, pelo menos, a uma insatisfação com o governo, na piora das avaliações. Isso, certamente, seria um tema para ser utilizado contra o governo”, explica o economista.
Devido a isso, completa Ferreira, o governo federal tenta equilibrar uma série de aspectos para fazer valer um potencial ganho de arrecadação em cima dessa nova tributação, mas com a ideia de minimizar danos em termos de consequências para a população de menor renda e, consequentemente, para a avaliação do governo.
Além do impacto no segmento de eletroeletrônicos citado anteriormente por Marlon Glaciano, Marcelo chama atenção para os aumentos que devem variar de 10% a 30% em produtos de menor valor agregado, como roupas e brinquedos.
“Esse aumento poderá alcançar até 92% nos casos mais extremos, então, pode inviabilizar totalmente o consumo, a depender da forma com que o governo e com que o poder legislativo decidam implantar essa nova tributação”, avalia Ferreira.