O casamento indissociável

Dupla de sucesso: a barrica de carvalho e o vinho

Entenda as diferenças entre as diferentes origens das barricas de carvalho e como ela chegou no mundo dos vinhos

Foto: Freepik
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Por Marina Bufarah, sommelière da Wine, o maior clube de assinatura de vinhos do mundo

Por vários séculos, o carvalho e o vinho formaram um casamento indissociável. A madeira cumpria inúmeras funções: cuba de fermentação, recipiente de guarda e transporte, além de afinar os vinhos mais duros.

O uso do carvalho se intensificou na era dos descobrimentos, quando as caravelas carregadas de vinho cortavam os oceanos. Naquela época surgiu a necessidade de se criar tonéis específicos para os navios de carga e, com a intensificação do comércio, houve a especialização do marceneiro na construção de barricas e tonéis, assim nasceu a tonelaria.

Com isso, sempre que lemos um catálogo de vinhos ou uma ficha de degustação de determinado produtor, somos informados acerca do uso do carvalho francês ou do carvalho americano, mais comumente, mas qual a diferença entre eles e o que determina a utilização de um ou de outro? 

A resposta não é fácil de obter, pois existem muitas versões sobre o tema. Além do carvalho francês e do norte-americano, são muito populares o húngaro e o russo. Muitas vinícolas do Brasil, do Chile e da Argentina também utilizam o carvalho esloveno.

Carvalho francês 

Na França, a madeira é extraída principalmente das florestas de Limousin, Tronçais e dos Vosges, sendo que a origem da madeira determina algumas características. O carvalho de Limousin, por exemplo, é mais poroso, pois a árvore cresce um pouco mais depressa que em Tronçais, o que permite uma maior troca com o oxigênio externo. Já em Tronçais, a madeira é mais compacta e apresenta poros menores, que transmitem sabores mais intensos ao vinho que a das demais regiões da França. 

Outra característica do carvalho francês é no modo de preparo das barricas, que não são partidas com serras elétricas, mas fendidas (merrain), respeitando as fibras do lenho, preservando mais suas características de porosidade e flexibilidade. 

A secagem ao ar livre e não em estufa também é um grande diferencial, já que confere ao carvalho um aroma próprio e diferenciado. Quanto aos sabores e aromas que a madeira passa para o vinho, o carvalho francês é mais especiado, tem notas mais delicadas de frutas secas e textura mais macia que o carvalho das demais regiões. É recomendado para elaboração de vinhos sutis, brancos ou tintos em que se busca mais a elegância que a potência. 

Carvalho norte americano 

O carvalho dos Estados Unidos possui mais taninos e é mais intenso em óleos essenciais que o da França, por isso a tosta é sempre mais alta, para arredondar e conferir maior riqueza de aroma e sabor à madeira. O sistema americano de preparo da madeira é mecanizado, por meio de mira laser e serra elétrica, além da secagem ser feita em estufa onde o ambiente é controlado. 

O carvalho americano é o preferido para os tintos mais robustos de regiões clássicas como Rioja e Napa Valley, além de ser muito utilizado para o amadurecimento de Chardonnays em regiões quentes. Os aromas mais característicos são de café, baunilha, caramelo e coco queimado.

Carvalho do leste europeu 

Outra opção é o carvalho do leste europeu, mais especificamente da Hungria e Eslovênia. De granulação menos fina e mais neutra, em termos de compostos aromáticos, do que os demais. Além disso, é mais comum a presença de barris maiores (de 1.000 a 10.000 litros), que retardam a micro-oxigenação, trazem uma aeração suave e, como consequência, exigem mais tempo e paciência. Um exemplo de sucesso é o famoso Barolo, que nesse cenário ganha mais maciez e longevidade.

Em linhas gerais, costumam ter aromas de cravo e tabaco. Se usados na medida certa, podem ser uma opção mais sutil para vinhos tintos mais robustos.

Hoje em dia não há muitas florestas repletas de carvalho para serem derrubados, uma vez que a árvore demora várias décadas para atingir a idade adulta, fica muito lento o reflorestamento. Além disso, o final do século XX trouxe ainda a demanda dos países emergentes do vinho como Chile, Estados Unidos, Austrália, Argentina, África do Sul e até mesmo o Brasil, que nos últimos 30 anos passaram a consumir imensas quantidades de madeira, encarecendo o produto, o que contribuiu para que o carvalho se tornasse um verdadeiro luxo. 

Uma barrica de carvalho francês chega a custar mil euros e uma de madeira norte-americana sai por cerca de 800 dólares. Para amortizar os custos, os produtores estão recorrendo a alternativas, tais como farelo de madeira, chips, ripas, entre outros recursos polêmicos, mas este já é um tema para outro artigo.