Contexto de transformação

Stablecoins, DREX e Tokenização: por que o futuro do dinheiro já começou (e talvez você não tenha notado) 

Onde leis, moedas e criptoativos se encontram

Foto: Reprodução
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Imagine um mundo onde o dólar – mesmo diante de ventos contrários – buscando manter seu posto como padrão monetário global, inesperadamente, encontra uma boia  de salvação na blockchain, chamada stablecoin. Enquanto isso, o Brasil avança com seu  próprio projeto de moeda digital, o DREX. 

O cenário parece complexo? Ele é mesmo. Mas também é fascinante. Depois de duas  guerras mundiais, de whiskys e charutos em Bretton Woods, do “choque Nixon” e do  nascimento do Petrodólar, parece que a crise do Subprime (2008) e as sanções contra a  Rússia – após o início do conflito com a Ucrânia (2022) – produziram abalos significativos  na confiança mundial em relação ao uso do dólar como moeda padrão para trocas  internacionais. 

Nesse contexto de transformação, stablecoins, CBDCs e a tokenização de ativos diversos  estão moldando o futuro financeiro. Entender o que isso significa não é mais um “luxo  para iniciados” – é uma necessidade para qualquer um que queira compreender para  onde o dinheiro está indo (literalmente). 

1. A guinada dos EUA para o cripto: Genius Act e a defesa da hegemonia do dólar 

Recentemente, o então presidente Donald Trump sancionou o Genius Act, criando um  marco regulatório para as stablecoins – ativos digitais emitidos por empresas privadas,  normalmente lastreados em ativos do mundo real, como títulos do Tesouro norte americano, e que buscam refletir fielmente o valor da moeda fiduciária que representam  (no caso, o dólar). 

As stablecoins são, até aqui, o caso de uso mais bem-sucedido de blockchain pelo mercado financeiro. Não é coincidência que o MiCA (Marco Legal Europeu para os Criptoativos) tenha dedicado tanta atenção a elas. Há diversos tipos e arranjos de  stablecoins e mecanismos diante dos quais as emissoras desses tokens prometem  

manter a sua paridade com a moeda (dita) estável representada. Falaremos muito disso  aqui na coluna, inclusive sobre o pulsante processo regulatório que tem ocorrido ao  redor do mundo e como o Brasil tem se posicionado.  

Voltando ao Genius Act, passaram a ser exigidas reservas integrais e auditorias mensais,  o que trouxe mais segurança jurídica e atraiu pesos pesados, como o Citigroup, para o  setor. O pano de fundo é claro: em um contexto de incertezas no comércio global e de  tarifas agressivas, as stablecoins estão sendo vistas como um reforço estratégico ao  dólar, cuja participação nas reservas mundiais caiu para 57,7% em 2025, segundo o FMI.  É o Tio Sam vestindo roupagem digital para continuar mandando na festa.

2. O DREX e o Brasil na vanguarda digital 

Enquanto isso, por aqui, o DREX – nosso Real em formato digital compatível com  blockchain – segue em fase piloto, tendo avançado desde 2023. Diferente das  stablecoins, que decorrem da iniciativa privada, o DREX vem sendo trabalhado como  uma CBDC (Central Bank Digital Currency), uma moeda estatal e programável, que pode  ser usada nas diversas automatizações que os contratos inteligentes (smart contracts)  propiciam.  

A CBDC brasileira, diferente da maioria dos países que tem projetos nesse mesmo  caminho, não possui como objetivo principal resolver questões específicas de  pagamento. Com as estratégias viabilizadas desde 2013, pelo Sistema de Pagamentos  Brasileiro, e pelo sucesso dos arranjos de pagamento – inclusive do PIX – essa já é uma  questão bem consolidada no país.  

Por outro lado, percebe-se que o DREX busca servir de catalisador para a oferta de novos  produtos financeiros pelas instituições, pretensamente mais acessíveis e em maior  escala, focando também na eficiência do mercado financeiro. 

Outra curiosidade: enquanto o Genius Act proíbe CBDCs de varejo nos EUA, alegando  preocupações com privacidade, o Brasil aposta justamente na possibilidade de  aproximar a moeda digital oficial da população. Um contraste interessante entre  estratégias, que ganha mais um capítulo após o anúncio pelo Banco Central de que a  primeira fase do lançamento do DREX deverá ser feita ainda sem blockchain. Aposta-se  numa solução de gravames e garantias, que acompanharemos de perto por aqui. 

3. Tokenização: uma ponte para o varejo 

A tokenização – potencializada tanto pelo Genius Act quanto pelo DREX – é um  verdadeiro divisor de águas. Ela permite transformar ativos como imóveis, títulos ou  obras de arte em representações digitais fracionadas, negociáveis de forma simples e  rápida. Na prática atual, esse processo tem envolvido camadas de contratos e acordos  dentro e fora da blockchain, muitas vezes atrelados a processos de securitização. 

Na prática, significa que alguém pode comprar uma fração de um prédio por alguns  milhares de reais, em vez de milhões, ou fazer transações globais com stablecoins pagando taxas muito menores que as tradicionais. O processo atual ainda precisa de  aperfeiçoamento e regulação mais clara, inclusive sobre a liquidação dos ativos e  garantias. É como se o mercado financeiro, antes um clube restrito, estivesse abrindo a  porta e dizendo: “Entre, mas venha preparado”. 

4. Criptoativos e reservas descentralizadas 

O dólar não está sozinho nessa nova disputa por relevância. Ativos como Bitcoin e  Ethereum ganham cada vez mais espaço como reservas de valor e alternativas de  investimento. Em tempos de incerteza comercial, eles são vistos como opções  descentralizadas, que escapam do controle direto de governos e bancos centrais.

Até mesmo o JP Morgan admite: incluir criptoativos pode ser uma estratégia válida de  diversificação, desde que feita com cuidado – lembrando sempre da volatilidade e da  necessidade de regulação. Aqui, não se trata de idolatrar moedas digitais, mas de  reconhecer que elas já estão redesenhando o mercado financeiro. Ignorá-las pode ser  tão arriscado quanto se aventurar nelas sem conhecimento. 

5. Educação: a chave para navegar o futuro 

As oportunidades são enormes, mas os desafios também. A volatilidade, os riscos de  fraude e as constantes mudanças regulatórias exigem atenção e preparo. O Genius Act, ao apostar numa regulação mais robusta para emissores de stablecoins, e  o DREX, com a proposta de modernizar a moeda oficial brasileira, mostram que estamos  diante de um cenário em construção acelerada. 

E, nesse contexto, não há dúvida: o maior ativo de qualquer pessoa é o conhecimento.  Educação financeira e jurídica deixa de ser um diferencial para se tornar um requisito  básico. 

6. O horizonte à frente 

O futuro financeiro já começou a ser escrito – e, spoiler, ele é virtual, vive em redes de registro distribuído e se veste de criptografia. Com cautela e estudo, é possível  transformar desafios em oportunidades. O papel desta coluna será justamente  acompanhar esse processo, analisando as mudanças com profundidade e clareza, para  que você possa entender como essas tecnologias e regulações afetam diretamente o seu  cotidiano, o seu trabalho e a gestão do seu patrimônio. 

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Colunistas 

Lucas Carapiá – Advogado e Professor, Mestre em Direito pela Universidade Federal da  Bahia (UFBA). Especializado em Blockchain e Regulação de Criptoativos, atua na fronteira  entre o Direito e a inovação financeira, com destaque nacional pela contribuição no  campo jurídico dos ativos digitais. 

Gustavo Guitzel Cafezeiro – Sócio da SVN Investimentos e assessor de investimentos  credenciado pela XP. Atua no planejamento patrimonial e na construção de portfólios de  alta performance, unindo conhecimento técnico e sensibilidade de mercado para  identificar oportunidades e mitigar riscos num ambiente financeiro em constante  transformação. 

DISCLAIMER 

ESTA COLUNA TEM CARÁTER EXCLUSIVAMENTE INFORMATIVO E EDUCACIONAL. AS OPINIÕES AQUI EXPRESSAS  NÃO CONSTITUEM CONSULTORIA JURÍDICA NEM RECOMENDAÇÃO DE INVESTIMENTO, E NÃO SUBSTITUEM A  ANÁLISE INDIVIDUALIZADA DE CADA CASO CONCRETO.