
Por anos, o setor cripto nos Estados Unidos viveu sob um clima de incerteza. A falta de clareza regulatória — e a preferência das autoridades, especialmente a SEC, por uma postura punitiva em vez de colaborativa — empurrou muitos projetos inovadores para fora do país. Com isso, os EUA perderam terreno em uma das revoluções tecnológicas mais promissoras das últimas décadas.
A recente proposta da SEC de criar exceções à inovação — ainda em fase de consulta pública — pode representar uma virada importante nesse cenário. Se aprovada, ela sinalizaria uma mudança de mentalidade: a de que a regulação pode — e deve — caminhar junto com o avanço tecnológico, e não contra ele. Ao oferecer zonas de segurança temporárias (safe harbors) para projetos emergentes de tokens e protocolos de DeFi, a Comissão reconhece que é possível estimular o desenvolvimento sem abrir mão da proteção ao investidor.
O impacto potencial é significativo. Com regras mais claras e previsíveis, startups e desenvolvedores teriam mais confiança para inovar em solo americano, sem o medo constante de ações judiciais imprevisíveis. Ao mesmo tempo, investidores institucionais — fundos de pensão, gestoras, bancos — poderiam entrar nesse mercado com muito mais segurança. Isso abriria espaço para uma nova onda de investimentos, impulsionando a profissionalização e a maturidade do setor.
Ainda assim, é preciso cautela. Como o texto da proposta ainda não é definitivo, há o risco de que sua implementação acabe favorecendo apenas grandes players, que têm recursos e estrutura para atender a exigências de governança, auditoria e compliance mais complexas. Se isso ocorrer, o efeito pode ser o oposto do desejado — em vez de estimular a inovação, a medida poderia concentrar ainda mais o mercado.
O que acontece nos EUA reverbera globalmente. Outros mercados observam atentamente e podem ser pressionados a modernizar suas próprias regulações para não perder competitividade. Países com regras mais rígidas podem perder startups, investimentos e talentos para jurisdições que oferecem maior previsibilidade. Nesse sentido, a iniciativa da SEC pode servir como um novo parâmetro internacional, incentivando governos ao redor do mundo a equilibrar inovação e proteção ao investidor.
Cabe também à indústria fazer sua parte. A conquista de um ambiente regulatório mais aberto não deve ser encarada como um salvo-conduto, mas como uma oportunidade para elevar padrões. Isso inclui adotar boas práticas de governança, fortalecer a transparência e garantir que cada projeto de token tenha propósito e utilidade reais. Esse amadurecimento é essencial para que o setor conquiste a confiança do investidor tradicional e avance rumo à adoção em massa.
Se bem implementadas, as “exceções à inovação” podem inaugurar uma nova fase para o mercado cripto global — uma fase em que a inovação não é reprimida, mas estimulada dentro de um marco de segurança e transparência. E, nesse contexto, os Estados Unidos podem puxar a fila.