Foto: Reprodução
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A chamada “pejotização” está ocupando espaço no STF (Supremo Tribunal Federal), que busca estabelecer limites quanto ao modelo de contratação PJ (Pessoa Jurídica). Apesar dos movimentos intensos no Judiciário, é observado que o modelo pode vir a gerar perdas para os cofres públicos.

Nesse cenário, as opiniões sobre a deliberação da “pejotização” divergem. O Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, acredita que “deixar o tema da pejotização só para o Judiciário seria um perigo”. A afirmação foi feita durante um seminário da Comissão de Trabalho da Câmara, na segunda-feira (10), para tratar dos efeitos da escala 6×1, que consiste em seis dias de trabalho para um de folga.

“O Congresso deve se debruçar sobre o tema e não deixar esse debate só para o STF”, disse Luiz, de acordo com o Poder360. Segundo o chefe da pasta, a Corte tem “cumprido um papel relevante em defesa das instituições democráticas”, mas “está derrapando no tema trabalho”.

O termo “pejotização” se refere à modalidade de contratação que envolve PJs e trabalhadores autônomos, sem vínculo empregatício. O imbróglio sobre o tema se intensificou com a expansão dos serviços de profissionais de tecnologia, comunicação, advocacia, saúde e até motoristas de aplicativo, que atuam como pessoas jurídicas, emitindo nota fiscal.

“O STF vem trabalhando, aparentemente, um processo de enfraquecimento de atos trabalhistas e um processo de admitir um debate sobre parte do mercado de trabalho autorizado que seja PJ”, acrescentou o ministro. Marinho destacou que a movimentação do STF representa um “enfraquecimento da Previdência Social e aumento dos problemas relacionados à Previdência”.

Analistas avaliam impacto da pejotização nos cofres públicos

Na percepção de analistas, o modelo de contratação pode gerar outro problema: a redução da arrecadação para os cofres públicos. Essa redução ocorre em meio à corrida que o governo tem feito para alcançar a meta orçamentária. Apesar de a meta de déficit zero do governo para 2025 estar aparentemente no caminho certo, a meta de 2026 ainda é incerta.

Especialistas ouvidos pelo BP Money foram unânimes: a “pejotização” reduz a arrecadação federal.

“Estimativas indicam perdas significativas: o Ministério da Previdência aponta que uma queda de 10% na formalização via CLT representa R$ 47 bilhões a menos no INSS por ano”, comentou Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.

“Esse tipo de vínculo contribui menos: não paga INSS nem IR da mesma forma que um CLT, o que compromete a sustentabilidade fiscal”, completou.

Por outro lado, há quem pondera sobre a real causa do desequilíbrio nas contas públicas, embora concorde com a redução na arrecadação. “É fundamental entender que a pejotização não é a causa central desse desequilíbrio, mas sim […] consequência direta de um sistema tributário que penaliza a geração de empregos […]”, declarou Jhonatas Deodato, planejador financeiro e especialista em investimentos.

“Há perdas bilionárias em contribuições, mas esses números refletem muito mais a rigidez da CLT e a alta carga sobre a folha do que um ‘problema’ na adoção de pessoas jurídicas”, completou Deodato.

Ou seja, o crescimento do modelo de contratação se coloca como uma alternativa, mas gera perdas. Todo esse cenário acaba expondo uma fragilidade, segundo os analistas: esses trabalhadores pagam significativamente menos impostos em comparação aos 35% de carga tributária que um CLT pode pagar.

O advogado-geral da União, Jorge Messias, chegou a declarar, em audiência pública do STF, que o fenômeno provocou um déficit estimado de R$ 60 bilhões na Previdência Social, além de perdas de R$ 24 bilhões ao FGTS, entre 2022 e 2024.

Descompasso entre pejotização e estrutura tributária atual

No Brasil, há uma estrutura voltada a um modelo tradicional de emprego, com vínculos formais (como o CLT). Analistas apontam que o sistema tributário nacional ainda opera sob uma lógica industrial e centralizada, desenhada para o mercado dos anos 1940.

Contudo, a economia atual é pautada em serviços, tecnologia e capital humano, marcada por autonomia e flexibilidade. Enquanto a tributação sobre a folha tradicional pode superar 40%, a carga de um PJ no Simples Nacional ou no Lucro Presumido é consideravelmente menor. Diante desse contexto, especialistas entendem que a migração para o modelo PJ acaba sendo uma escolha racional e eficiente.

“A substituição de empregados por PJs reduz a base de arrecadação, pois a tributação sobre o faturamento das PJs é significativamente menor e não inclui contribuições sociais como o FGTS e a Previdência Patronal”, explicou Fernando Zarif, advogado especializado em direito do trabalho e sócio do Zarif Advogados.

Além disso, o Simples Nacional e o Lucro Presumido existem para incentivar micro e pequenas empresas. Contudo, as ferramentas são amplamente utilizadas para viabilizar a pejotização. “Esses regimes permitem que trabalhadores PJ paguem menos tributos do que pagariam como empregados formais”, completou Zarif.

Assim, com a ausência de uma regulamentação específica para lidar com o aumento desse déficit arrecadatório, é possível afirmar que o sistema fiscal brasileiro não está preparado para o crescimento desse modelo de trabalho. Ou seja, é necessária uma revisão estrutural para equilibrar a tributação entre as diferentes formas de contratação.

Advogados apontam medidas juridicamente viáveis sem comprometer o mercado de trabalho

Diante das problemáticas, foram apontadas algumas soluções para revisar regras. A advogada do escritório Arman Advocacia, Daniela Poli Vlavianos, considerou propor medidas que mitiguem as perdas de arrecadação associadas à pejotização.

Segundo Vlavianos, as medidas juridicamente viáveis, que não comprometem o dinamismo do mercado de trabalho, incluem:

  1. Critérios objetivos de “safe harbor” para prestação por PJ que evidenciem risco empresarial, pluralidade de tomadores, ausência de subordinação e autonomia técnica;
  2. Reforço à fiscalização baseada em materialidade, com diretrizes claras para requalificação quando presentes os elementos do emprego (aplicação combinada da CLT e do CTN);
  3. Ajustes paramétricos nos regimes de PJ unipessoal intensiva em mão de obra (por exemplo, limites, anexos e alíquotas em regimes favorecidos quando houver essencialmente “venda de horas” do próprio sócio);
  4. Neutralidade entre formas de contratação para bases comuns, aproximando a tributação do trabalho pessoal independentemente do rótulo jurídico, sem punir a verdadeira atividade empresarial;
  5. Incentivos à formalização celetista em setores críticos via desoneração calibrada da folha, desde que condicionada à manutenção ou geração de empregos. Tudo isso preserva dinamismo enquanto reduz arbitragens.