
Recebido entre o fim de novembro e o início de dezembro, o décimo terceiro salário costuma ser visto como um alívio para o orçamento, mas o destino desse dinheiro pode determinar como será o início do próximo ano. Em um cenário de juros ainda elevados, inflação persistente e aumento das despesas típicas de janeiro, especialistas apontam que o benefício deve ser encarado como ferramenta de planejamento, não como um “extra” para consumo livre.
Embora cada família tenha uma realidade financeira distinta, há consenso entre economistas e planejadores: usar o décimo com intenção e estratégia é o que separa quem inicia o ano com estabilidade de quem entra em 2026 já endividado.
Para grande parte dos brasileiros, o 13º acaba servindo para “tapar buracos” do orçamento. Porém, economistas apontam que esse é justamente o momento ideal para reorganizar as finanças.
Segundo o planejador financeiro, Jeff Patzlaff, o uso inteligente passa por três pilares: “resolver o passado, garantir o presente e proteger o futuro”. Isso significa priorizar dívidas caras, provisionar despesas de início de ano e só então pensar em lazer ou investimentos.
A Conselheira do Corecon-SP e professora de Economia da Universidade de Marília – UNIMAR, Marisa Rossignoli reforça que, quando as contas estão equilibradas, o ideal é destinar o benefício a objetivos estruturais, como investimentos, aumento de patrimônio e pagamento de obrigações sazonais como IPVA e IPTU. “O problema é quando o décimo é incorporado ao salário do mês sem planejamento algum”, alerta.
Investir vale a pena? Sim, mas depende da fase financeira de cada um
Com a Selic ainda elevada, aplicações conservadoras têm oferecido retornos acima da inflação, o que torna o investimento do 13º uma opção atrativa para quem já tem as contas organizadas. Segundo Rossignoli, o cenário atual favorece a renda fixa. “Com a Selic alta, os investimentos de renda fixa têm se apresentado como boa opção”, afirma.
Patzlaff lembra que quem não possui reserva de emergência deve priorizar essa etapa, direcionando recursos para aplicações pós-fixadas, como Tesouro Selic e CDBs de liquidez diária. Para prazos maiores, ele destaca prefixados, IPCA+ e até oportunidades na bolsa.
Já para Leonardo Andreoli, analista da Hike Capital, sugere diferentes caminhos conforme o perfil do investidor:
• Conservadores: Tesouro Selic e CDBs de liquidez diária.
• Moderados: fundos de crédito, multimercados de baixa volatilidade e ETFs globais de renda fixa.
• Arrojados: ações, ETFs e BDRs dentro de um plano de longo prazo.
O mais importante, segundo os três especialistas, é não deixar o dinheiro “parado” na conta corrente, onde perde valor para a inflação.
Quitar dívidas: quando faz sentido usar o décimo para isso
Se o orçamento inclui dívidas com juros elevados, a orientação é unânime: o pagamento deve ser prioridade. Patzlaff destaca que nenhuma aplicação conservadora supera o custo de dívidas como cartão e cheque especial, que chegam a 449,9% e 135,5% ao ano, respectivamente. “A opção mais inteligente é eliminar juros abusivos e só depois pensar em investir”, afirma.
Marisa Rossignoli no entanto pondera que a antecipação só faz sentido quando há cobrança de juros. “Se o financiamento foi contratado sem juros, como alguns de veículos, a vantagem é menor. Mas, para dívidas caras, antecipar é sempre positivo”, diz.
Não existe fórmula única, mas o consenso é manter equilíbrio entre prioridades e desejos. É recomendado que o trabalhador defina percentuais específicos para curto e longo prazo, evitando que todo o valor seja absorvido pelo consumo de fim de ano. Já Patzlaff sugere modelos simples, como o 50/30/20, adaptado à realidade de cada um.
Como evitar o gasto impulsivo típico de dezembro
Black Friday, festas e a sensação de “dinheiro extra” criam um ambiente propício ao consumo emocional. Rossignoli recomenda separar uma parcela específica para lazer e tirar o restante da conta corrente, direcionando-o para uma aplicação ou pagamento de dívidas. “Transferir o valor logo que recebido ajuda no controle”, diz.
Patzlaff orienta estratégias práticas, como esperar 24 horas antes de comprar itens caros, evitar visitas a shoppings sem objetivo claro e cancelar o recebimento de e-mails promocionais. “A impulsividade é inimiga do planejamento”, afirma.
Os erros mais comuns e como evitá-los
Entre os equívocos mais recorrentes estão:
- tratar o décimo como renda mensal;
- gastar tudo em compras de fim de ano;
- ignorar dívidas caras;
- deixar o valor parado na conta;
- subestimar despesas de janeiro;
- fazer compras motivadas por emoção.
Maria destaca que a falta de planejamento é o ponto central. “O 13º deve ser pensado com propósito, seja para investimento, compra planejada ou quitação de dívidas”.
O 13º pode ser um aliado para começar 2026 com estabilidade?
Sim e, para os especialistas, esse deveria ser o objetivo principal. Usar o décimo para quitar dívidas, reforçar a reserva e organizar gastos de início de ano cria um colchão de segurança que reduz estresse e evita recorrer a crédito caro.
Rossignoli considera este um momento ideal para revisar a vida financeira. Já Andreoli afirma que o décimo funciona como um “amortecedor” que facilita a construção de patrimônio.
Patzlaff resume o impacto: ao usar o décimo com estratégia, o trabalhador deixa de pagar juros e passa a recebê-los, uma mudança que transforma a relação com o dinheiro ao longo de todo o ano.