
Uma semana após o governo Donald Trump suspender a tarifa recíproca de 10%, os EUA anunciaram a eliminação do tarifaço de 40% aplicado a cerca de 200 produtos brasileiros, entre eles carne e café.
O comunicado ocorreu durante o feriado do Dia da Consciência Negra, quando a B3 não operava. Com a reabertura do mercado na última sexta-feira (21), os papéis de companhias ligadas aos setores afetados passaram a reagir ao anúncio.
Entre os destaques, frigoríficos como JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3) e Minerva (BEEF3) apareceram entre as principais altas do pregão. Já no caso de café e frutas, não há grandes exportadoras listadas na bolsa brasileira.
Segundo cálculos da XP Investimentos, os produtos que perderam a taxação somaram cerca de US$ 4,4 bilhões em 2024 — o equivalente a 11% das exportações do Brasil para os EUA.
A Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham) estima que a remoção das tarifas anunciada pelo presidente Donald Trump afeta positivamente 44% do total de itens vendidos pelo Brasil ao mercado americano em 2024.
Migração das compras dos EUA pode favorecer o Brasil
Para Felipe Sant’Anna, especialista em investimentos do grupo Axia Investing, afirmou em reportagem do Exame que o cenário americano passa por um problema concreto: a escassez de proteína animal, fator que pressiona a inflação no país.
Com a liberação das exportações brasileiras de carne, o analista avalia que, no curto prazo, os EUA podem redirecionar parte das importações que vinham sendo feitas da Austrália e de outros países da América Latina para os frigoríficos do Brasil.
Apesar dessa perspectiva, Sant’Anna pondera que os efeitos reais desse movimento ainda vão demorar a aparecer: “Mas hoje, se o papel subir, é só por especulação, porque o resultado disso a gente vai visualizar somente no próximo resultado trimestral dessas empresas”, afirma.
Efeito limitado das tarifas para algumas companhias
Apesar do movimento positivo observado na bolsa, uma análise mais detalhada indica que o impacto da retirada das tarifas tende a ser discreto para empresas como a MBRF. A companhia já utilizava unidades na Argentina e no Uruguai para abastecer o mercado americano, o que reduz o efeito direto da mudança sobre sua operação no Brasil.
“Esse impacto na operação brasileira ainda é pequeno, seria em torno de 0,18% das vendas”, afirma Alexandre Pletes, head de renda variável da Faz Capital. Às 11h53, as ações da empresa avançavam 1,77%, negociadas a R$ 21,89.
De acordo com o especialista, um possível desdobramento desse novo cenário é a reativação de plantas brasileiras que foram descontinuadas durante o período do tarifaço.
Impactos distintos entre os frigoríficos e outros setores
No caso da Minerva, o efeito da retirada das tarifas segue a mesma lógica observada em outras empresas do setor. A companhia já possui uma presença relevante na Argentina, Uruguai e Paraguai — justamente os maiores fornecedores de carne para os Estados Unidos — e, por isso, o peso do mercado americano em sua receita é relativamente baixo, cerca de 5%.
“A Fitch já havia destacado que a diversificação dessas empresas ajudava a mitigar riscos tarifários, mas a retirada da sobretaxa reduz ainda mais a pressão sobre suas operações internacionais”, afirma João Abdouni, analista da Levante Inside.
O especialista acrescenta que a decisão tem efeito retroativo: importações realizadas após 13 de novembro poderão ter parte das tarifas reembolsadas, o que melhora o cenário financeiro de curto prazo.
Já a JBS tende a sentir um impacto mais expressivo. Como lembra Alexandre Pletes, a empresa abastece diretamente a cadeia produtiva de suas plantas nos Estados Unidos. “Eles alimentam essa cadeia produtiva das plantas lá nos Estados Unidos, a maior produção, com gado daqui”, diz o especialista.
Além dos frigoríficos, nomes da cadeia de madeira e celulose — como Suzano (SUZB3) e Klabin (KLBN11) — também aparecem entre as possíveis beneficiadas, ainda que de maneira moderada, já que produtos de madeira não estavam incluídos na sobretaxa adicional.
Em contrapartida, setores que ficaram de fora da lista de isentos continuam expostos. Aeronaves, componentes aeronáuticos, produtos ligados à mineração, metalurgia e segurança nacional permanecem sob regimes tarifários sem alívio. Isso significa que empresas como Embraer (EMBR3), Gerdau (GGBR4) e Usiminas (USIM5) não recebem um impulso direto da medida e seguem sujeitas ao risco tarifário em parte de suas exportações.
A ampliação da lista de produtos isentos reforça o movimento de flexibilização. Os cerca de 200 itens recém-liberados se somam a outros 700 já excluídos da tarifa de 40% anteriormente. Com o fim da sobretaxa, produtos agrícolas ganham fôlego significativo, especialmente carne bovina, café, frutas como laranja, abacaxi, banana, manga, açaí e cacau, além de especiarias e fertilizantes.
Com isso, itens que antes enfrentavam uma taxação total de 50% — resultado da combinação entre o tarifaço de 40% e a tarifa recíproca de 10% — agora passam a ter alíquota zerada. Ainda assim, a cobrança de 40% permanece para máquinas, motores, calçados, café solúvel, pescados e mel, mantendo parte do comércio bilateral sob pressão.