Safra recorde

Soja: produção deve ser maior que o previsto e pressiona cotações

Guerra comercial entre China e EUA é um dos únicos fatores que pode sustentar preços da soja brasileira, avalia especialista

Soja
Foto: Arquivo CNA

Enquanto a Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) projeta uma safra 2024/25 de 166 milhões de toneladas para a soja (o que já seria um recorde), a Hedgepoint Global Markets prevê uma produção ainda maior, de 170.7 milhões de toneladas.

Mas, para o coordenador de Inteligência de Mercado da Hedgepoint, Luiz Fernando Gutierrez, essas projeções devem ser ajustadas em breve e a colheita pode ser ainda maior, com grande potencial para pressionar os preços da commodity.

“O mercado da soja no Brasil está no momento de início de pressão sobre os preços, eu diria assim. Especialmente porque a gente está começando a colheita”, destaca Gutierrez.

Na quinta-feira (13), o preço da oleaginosa no porto de Paranaguá caiu 0,73% em relação ao dia anterior, para R$ 130,68 por saca de 60 quilos, de acordo com as cotações do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP.

Para Gutierrez, o que tem salvado os preços de quedas ainda maiores são as cotações da Bolsa da Chicago, que têm estado em um patamar mais elevado nas últimas semanas, em relação ao final do ano passado, como reflexo da seca na Argentina e no Rio Grande do Sul, além de uma produção menor que o esperado nos EUA.

Outro fator que tem sustentado os preços da commodity é o câmbio. Porém, nenhum desses suportes deve superar a pressão exercida pela safra recorde.

“A grande questão é que, mesmo que tenhamos perdas no Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul (estados que passam por seca), o resto do país, especialmente Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais e Bahia, deve colher muito bem e compensar essas perdas, nos levando a uma produção recorde, acima de 170 milhões de toneladas”, diz Gutierrez.

“Os preços da soja atuais não remuneram ao produtor”, afirma o vice-presidente da Aprosoja-RS (Associação Brasileira dos Produtores de Soja no Rio Grande do Sul), Décio Lopes Teixeira. Isto porque há altas nos custos das lavouras.

“Esses custos subiram quando a soja estava em cerca de R$ 190 a R$ 200 e não voltaram mais. Se voltaram, voltaram muito pouco”, comenta o vice-presidente, destacando a alta principalmente nos preços dos químicos.

“Na nossa perspectiva, a soja deveria estar valendo, hoje, acima de R$ 180. E não alcança esse preço”, avalia. “Tem muito produtor falando em abandonar o plantio de soja, em função dos custos“.

Nesse cenário de pessimismo para os preços da commodity, o mercado está atento às tensões comerciais entre os EUA e a China.

De acordo com Gutierrez, as tarifas do presidente do país norte-americano, Donald Trump, podem levar a retaliações da China envolvendo a soja, o que favoreceria o Brasil, uma vez que o país asiático procuraria outras nações para substituir os EUA no fornecimento do grão.

Nesse caso, o país veria um cenário semelhante ao de 2018, quando uma queda na demanda chinesa pela soja dos EUA, decorrente de tarifas, aumentou a demanda pela soja brasileira, o que sustentou os preços, especialmente no segundo semestre do ano.

“Mas, se isso não acontecer, a tendência nesse primeiro momento, nesse primeiro semestre, é de preços um pouco mais pressionados, exatamente por essa colheita cheia aqui no Brasil que pressiona os prêmios”, destaca o especialista.

Além de baixa nos preços, a produção recorde deve levar a desafios logísticos, que vão dificultar o escoamento da safra. “Sempre quando entra uma safra muito grande, como a que está entrando, a gente vê esses problemas de uma forma um pouco mais clara”, comenta Gutierrez. Esses problemas incluem alta de fretes, estradas obstruídas e filas de caminhões.

Alguns estados têm dificuldades na soja, mas não alteram expectativa de recorde

Mesmo no Rio Grande do Sul, estado que deve enfrentar as maiores perdas, os estragos em 2024/25 não se comparam aos prejuízos dos últimos anos no estado, marcados por enchentes e estiagens que afetaram pesadamente a produção.

“O grande ponto é que, mesmo com perdas, a gente está longe de um desastre, longe de uma catástrofe que a gente já viu em anos anteriores”, diz o coordenador de Inteligência de Mercado da Hedgepoint, Luiz Fernando Gutierrez. “Então ainda assim vai ser uma produção razoável no Rio Grande do Sul”, completa.

Segundo o vice-presidente da Aprosoja-RS (Associação Brasileira dos Produtores de Soja no Rio Grande do Sul), Décio Lopes Teixeira, o estado das lavouras gaúchas é muito difícil de avaliar nesse momento, porque houve diferentes níveis de chuvas entre regiões do estado, mas a expectativa é de quebra de safra.

“De quanto será e quebra é difícil de estimar. Mas a gente fala em torno de 30%, talvez um pouco mais. Agora vai depender da sequência das chuvas”, afirma o vice-presidente.

Porém, Teixeira destaca que as perdas não afetam as perspectivas para as exportações do estado. “O Rio Grande do Sul vai ter uma exportação quase que normal, porque as lavouras que estão bem vão representar a parcela do estado nos embarques”, diz o vice-presidente. Ele destaca, ainda, a grande participação do Rio Grande do Sul nas exportações de sementes.