O anúncio do pedido de recuperação judicial da Agrogalaxy caiu como uma bomba no mercado. Isso porque a dívida bilionária de um dos principais players do agronegócio brasileiro expõe algo mais profundo: a crise no mercado de crédito agro.
O caso Agrogalaxy desencadeou uma onda de cautela, afetando a percepção de risco no setor e gerando discussões sobre as condições econômicas que cercam a concessão de crédito ao agronegócio.
Ao BP Money, o advogado especialista em reestruturação e recuperação empresarial, Washington Pimentel, esclareceu o impacto da RJ da Agrogalaxy no setor e nas instituições financeiras e avaliou as perspectivas de recuperação do crédito no agro.
Como a recuperação judicial da Agrogalaxy afetou a percepção do risco de crédito no setor agro?
O pedido de recuperação judicial da Agrogalaxy intensificou a percepção de risco no setor agro. Nos últimos trimestres, os pedidos de recuperação judicial no agronegócio dispararam, muitos deles sem um trabalho real de reestruturação da dívida.
Quais impactos você tem observado nas instituições financeiras?
As empresas têm utilizado essa ferramenta para impor o insucesso da atividade empresarial aos credores, exigindo descontos, liberação de garantias e prazos, mesmo havendo ativos suficientes para liquidar as dívidas e resolver o estresse financeiro. No caso da Agrogalaxy, o impacto foi mais severo devido à sua exposição a FIAGROs e CRAs, o que afetou o mercado de capitais de maneira sistêmica.
De que maneira a atual situação mercado agro reflete as condições econômicas gerais do País? Há uma correlação entre esses fatores?
O agronegócio está inserido em um ecossistema global, com muitas commodities sendo precificadas pela demanda internacional, mas as condições locais de crédito influenciam diretamente nossa competitividade.
O Brasil ainda oferece um dos créditos mais caros para o agronegócio em comparação com outras economias, o que afeta a capacidade das empresas de operar em um cenário de alta competitividade internacional.
O descontrole fiscal, a inflação persistente e a elevação das taxas de juros complicam ainda mais o cenário, tornando o acesso ao crédito mais restrito e oneroso.
Quais são as principais preocupações dos investidores e credores em relação à concessão de crédito ao agro, especialmente após o caso da Agrogalaxy?
A principal preocupação dos investidores e credores é a confiança no sistema de garantias e na governança das empresas do setor agro. O caso da Agrogalaxy trouxe maior cautela, especialmente em relação à solidez das garantias que respaldam títulos como CRAs e os lastros das emissões e capitações de FIAGROs.
A preocupação crescente é que os devedores não tenham capacidade de honrar seus compromissos financeiros, dado ao endividamento realizado com premissas demasiadamente otimistas, o que torna os investidores mais criteriosos ao avaliar novas oportunidades de crédito no setor.
Como você avalia as perspectivas de recuperação do crédito no setor nos próximos meses? E quais fatores poderiam impulsionar ou dificultar essa recuperação?
A recuperação do crédito no setor agro depende, em grande parte, de uma estabilização econômica e de uma política fiscal mais equilibrada. A queda nas taxas de juros e o controle da inflação poderiam melhorar a oferta de crédito.
No entanto, a percepção de risco, especialmente em função dos recentes pedidos de recuperação judicial, pode ser um fator dificultador. Além disso, o setor ainda enfrenta desafios externos, como a volatilidade dos preços das commodities e as condições climáticas, que podem impactar a confiança dos investidores.
Acredito que mercado de crédito precisa se posicionar de forma proativa, reestruturando suas operações de forma atencipada olhando a saúde do tomador, melhorando sua estrutura de garantia e preenchendo lacunas nos lastros e garantias eventualmente mal estruturadas.
Que estratégias as empresas do setor agro estão adotando para mitigar riscos e garantir acesso ao crédito em um ambiente de maior cautela?
As empresas do setor agro estão adotando diversas estratégias para mitigar riscos, como a melhoria da governança corporativa, renegociação antecipada de dívidas e busca por maior eficiência operacional.
Também há um movimento de diversificação das fontes de financiamento, com uma crescente captação via mercado de capitais nos últimos anos utilizando CRAs e FIAGROs. Além disso, muitas empresas estão fortalecendo suas estruturas de garantias para atrair credores e investidores.
Na sua opinião, quais são os segmentos do mercado agro que ainda apresentam boas oportunidades de crédito, apesar das recentes turbulências?
Os segmentos ligados à exportação de commodities essenciais, como soja, milho e carne bovina, continuam posicionados como boas oportunidades de crédito, devido a exposição à demanda internacional. Empresas com boa capitalização, governança sólida e posição de destaque no mercado são menos arriscadas para os investidkores.