Em entrevista à BP Money a especialista no mercado de etanol e açúcar, responsável pela criação do novo índice de biodiesel brasileiro, Nicolle Castro da Platts ajuda a compreender se a elevação de petróleo é positiva para as commodities brasileiras. A questão acompanha o cenário de altas no preço do petróleo tipo Brent, que somente do início deste ano até o momento, superou inúmeras vezes valores históricos estabelecidos.
Confira a entrevista completa:
Como a commoditie brasileira, mais especificamente o açúcar, pode ser impactado com a alta do petróleo? O impacto será significativo?
Além de existir uma usual correlação de movimento de preços entre soft commodities e petróleo, no caso do açúcar, o impacto pode ser ainda mais significativo já que produtores podem optar por usar uma maior parte do ATR [açúcar total recuperável], para produzir etanol ao invés de açúcar, e ,portanto, reduzir a oferta do produto no mercado internacional.
O que estamos vendo majoritariamente deste julho de 2020 é que apesar da relevante alta nos preços dos combustíveis no Brasil, o qual está muito correlacionado com a desvalorização do real perante o dólar, o açúcar no mercado de exportação segue pagando um prêmio sobre o etanol hidratado no mercado doméstico, portanto não há expectativa de uma mudança no padrão de mix açucareiro assim como observado na última safra.
E quanto ao impacto no etanol?
Fundamentalmente o etanol está muito mais exposto a uma alta no preço do petróleo, isso porque o petróleo é um componente principal ou um dos principais componentes para precificar a gasolina no Brasil. E aqui vale destacar que preço de entrega, ou seja, gasolina e diesel no Brasil seguem um preço de paridade de importação. Esse preço de paridade de importação nada mais é do que petróleo, mercado internacional e câmbio, a devida logística para colocar nos principais pólos de distribuição. Então qualquer alta no preço do petróleo vai impactar diretamente no preço da gasolina, considerando que a política de preços siga inalterada de paridade de importação e qualquer alta no preço da gasolina a refletir com a mesma magnitude no preço do etanol hidratado que vai direto. Destacando que o etanol tem uma competitividade que se destaca perante a gasolina, quando o preço é 70% do preço da gasolina. Ou seja, se o preço da gasolina estiver R$ 1 por litro e do etanol R$ 0,70, ainda faz sentido abastecer com etanol, se o etano estiver R$ 0,71 ou pra cima disso, já perde competitividade. Portanto, espera-se que qualquer movimento de alta no preço da gasolina tenha um impacto direto no preço do etanol.
Neste cenário que nos encontramos, no qual o petróleo tem atingido altos preços, há a possibilidade do mercado buscar outras alternativas de combustíveis fósseis?
O mercado tende a buscar alternativas em combustíveis renováveis, principalmente no Brasil onde já temos uma ampla frota flex e com potencial de expandir a oferta de renováveis seja por uma produção de etanol de segunda geração ou com a oferta crescente de etanol de milho. O mercado está buscando uma mudança energética, e, por incrível que pareça, uma das partes mais fáceis de começar essa transição seja na área de combustível, principalmente quando se fala do Brasil. Nosso país já tem uma matriz energética renovável de participação de muita expressiva, muito mais do que o resto do mundo. Neste sentido, o Brasil já tem uma certa liderança de renováveis ??na matriz energética total. O mercado está buscando essa transição energética e reduzir o consumo de combustível fóssil tende a aumentar a demanda por etanol.
A elevação na competitividade do mercado de etanol no Brasil, impulsionada pela busca de alternativas ao petróleo, pode vir a ser uma realidade?
O Brasil também possui uma política nacional de biocombustíveis, chamada “Renovabio” a qual tem como principais objetivos promover a descarbonização dos combustíveis oferecidos no país e a expansão dos biocombustíveis na matriz energética, portanto este cenário já é uma realidade no país. O etanol já é uma alternativa à gasolina, uma vez que no Brasil os proprietários de carros flex podem optar por abastecer com etanol hidratado, E100 ou mesmo ao abastecer com gasolina estão consumindo 27% de etanol anidro, devido ao mandato nacional de mistura obrigatória.