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Arte e mercado imobiliário: o olhar de Bel Borba

Em entrevista ao BP Money, artista visual fala sobre o papel das intervenções artísticas na valorização econômica de bairros

Bel Borba (Foto: BP Money)
Bel Borba (Foto: BP Money)

Por décadas, o artista visual baiano Bel Borba tem sido presença marcante nas ruas de Salvador e de várias outras cidades, do Brasil e do exterior. Reconhecido por suas esculturas, mosaicos e intervenções urbanas, Bel não apenas ocupa os espaços — ele os transforma. Em conversa exclusiva com o BP Money, o artista reflete sobre como a arte pública pode mudar o valor simbólico, afetivo e até financeiro de um bairro.

Para Bel, não é exagero dizer que uma escultura bem colocada tem o poder de alterar a paisagem — e com ela, a percepção econômica de uma região. “É como um sinal de vida inteligente por perto”, afirma.

Mais do que decorar, ele acredita que a arte tem uma função estruturante nos ambientes urbanos, podendo atrair investimentos, turismo, melhorias públicas e fomentar um novo ciclo de crescimento.

Veja a entrevista na íntegra

Qual o papel da arte pública na valorização econômica dos bairros?

Quando você vê uma obra de arte, seja ela modernista ou contemporânea, aquilo projeta ao seu redor uma aura de lugar evoluído, consciente, com um pé na cultura e no conhecimento. A presença da arte comunica que há vida inteligente por perto. Você pode estar num lugar totalmente deserto, mas se há uma escultura ali, você pensa: “a civilização está por perto”. Isso agrega muito valor ao espaço.

A arte carrega essa aura mesmo nos espaços mais inesperados?

Sim. A arte tem essa virtude, essa qualidade de grandiosidade. É algo subjetivo, que vai além da compreensão imediata. Mesmo quando parece simples, ela sempre deixa algo para ser descoberto com o tempo. A obra tem esse mistério. Ela sempre carrega algo a mais.

Já presenciou mudanças urbanas reais provocadas por obras suas?

Já vi lugares se transformarem. Fiz intervenção artística em bairro popular e, depois, a comunidade começou a cobrar mais limpeza, mais cuidado. A prefeitura passou a olhar diferente. Já vi melhorias acontecerem em escadarias, por exemplo, só porque o lugar virou ponto de visitação. A arte pode ter esse impacto transformador.

Como os artistas contribuem diretamente para que os espaços urbanos se tornem mais atrativos economicamente?

Depende do tema que o artista escolhe, da relevância da obra. Se aquilo que está sendo exaltado tiver força, pode dar muita visibilidade, oxigênio para o bairro, para a cidade. Um monumento pode mudar um vetor de crescimento, atrair comércio, ônibus, turismo. Quando coloco uma obra numa praça ou esquina, quero esse impacto. Ela arrebata atenção, carrega carisma, e transforma o entorno.

O mercado imobiliário tem dado mais atenção à arte nos empreendimentos?

Existe uma legislação que exige que todo novo empreendimento tenha uma obra de arte pública associada, para conseguir o alvará de habite-se. Essa obrigatoriedade existe aqui na Bahia e em Recife, por exemplo. Mas, nos últimos dez anos, essa exigência tem sido negligenciada. Antes, era fiscalizada com mais rigor. Algumas construtoras mais nobres ainda seguem essa regra, mas outras não.

Essa legislação precisa ser mais respeitada?

Com certeza. Ela tem que ser resgatada com ênfase. A presença da arte no espaço urbano é um direito da cidade. Ela valoriza não só o prédio, mas todo o entorno. E isso precisa voltar a ser levado a sério.

E quanto à relação entre artistas e arquitetos? Há espaço para mais colaboração?

Sim, mas é preciso mais abertura. Temos poucos escritórios de arquitetura que trabalham com grandes estruturas e sabem dialogar com arte pública. Sempre digo: escolham um bom lugar para a escultura, um lugar visível da rua. Porque não adianta esconder a obra. Ela precisa dialogar com a cidade.