*Por Luiz Fernando Araújo, CEO da Finacap Investimentos
A atividade de um gestor profissional de investimentos é marcada pela constante evolução e pautada no aprendizado diário. Somos eternos estudantes do mercado e de suas vicissitudes. Dentre as virtudes para conseguir trilhar essa jornada, atribuímos a capacidade de aprender com os investidores mais experientes – aqueles que carregam anos e anos de história do mercado, remontando, inclusive, a épocas em que não havia smartphones, notícias em tempo real e robôs para negociação em alta frequência.
Em nossas andanças, um desses grandes investidores tradicionais de ações nos recomendou um livro que não conhecíamos, cujo título era, no mínimo, audacioso: “Dividendos Não Mentem” (Dividends Don’t Lie), escrito por Geraldine Weiss.
Também conhecida como “A Grande Dama dos Dividendos”, Geraldine nasceu em março de 1926 em São Francisco, nos Estados Unidos. Foi responsável por fundar a Investment Quality Trends (IQT), uma das principais newsletters sobre finanças americana. A principal tese defendida por ela foi sobre a importância de construir uma carteira de ações de qualidade (conhecidas no jargão como blue chips) com histórico de pagamentos de dividendos e efetuar a seleção desses papéis com base no dividend yield (métrica de análise que compara o preço da ação com o dividendo por ação, avaliando o potencial retorno em forma de dividendos com base no preço da ação).
Geraldine buscou inúmeras formas de ingressar no mercado financeiro, porém, infelizmente, pelo preconceito sofrido à época por ser mulher, sempre encontrou portas fechadas. Até que, em 1966, fundou sua própria companhia, principal veículo que usou para propagar suas teses de investimento. Dessa forma, se tornou a primeira mulher proprietária de uma empresa de newsletter especializada em finanças.
Por mais de uma década, assinou seus relatórios abreviando seu primeiro nome (G. Weiss) para que não ficasse evidente à clientela que se tratava de uma opinião feminina. A Dama dos Dividendos acreditava que o principal foco de um investidor deveria ser no fluxo de pagamento de dividendos aos acionistas, pois se trata de um retorno sobre o capital direto no “bolso” dos investidores sem margem para discussões e análises relativas.
O tema de dividendos sempre foi central em nossa atividade de garimpar as melhores oportunidades de investimento aos nossos investidores. Para Geraldine, “o preço é absoluto e o valor é relativo”, ou seja, o preço de um ativo é informado em tela, para isso não há discussão. A principal pergunta é qual o valor justo deste ativo – apenas dessa forma, podemos responder se é uma oportunidade ou uma armadilha. Dentro da tradicional escola de investimento em valor, os fundamentos de um ativo são determinantes para definir seu valor justo.
A principal visão de Geraldine era relacionar o valor justo das companhias com seu retorno de dividendo. Desta forma, ações que estejam negociando com alto índice de dividend yield são oportunidades de compra e aquelas com baixo índice de dividend yield devem ser vistas com cautela.
Vale reforçar, no entanto, que mesmo utilizando métricas quantitativas para seleção dos ativos Geraldine recorria à profunda análise da companhia e de seu balanço. Neste sentido, salientamos o momento ímpar que o mercado de ações brasileiro apresenta, especialmente quando analisado sob a ótica dela sobre companhias de qualidade e bons retornos sobre os dividendos.
Em um simples exercício, filtramos as ações que compõem o índice Ibovespa e a ordenamos pelas ações que tiveram o maior dividend yield dos últimos 12 meses, em ordem decrescente, com base no fechamento de julho. A média de dividend yield das 15 primeiras companhias é de 24,53%.
A bolsa brasileira presenciou três movimentos relevantes que levaram a negociar no patamar de dividend yield atual: a queda acentuada das ações em resposta à elevação da taxa de juros e cenário macroeconômico; os resultados corporativos das empresas brasileiras mantiveram-se resilientes e, em alguns casos, especialmente das companhias atreladas às commodities, apresentaram um crescimento significativo dos seus resultados; e algumas companhias negociadas em bolsa aumentaram sua distribuição de dividendos e recompra de ações.
Geraldine Weiss faleceu em abril aos 96 anos. Mas seus ensinamentos sobre investimentos e sua luta por um mercado financeiro equânime permanecerão vivos. Ela entrou no hall das maiores investidoras que seguiram os ensinamentos do pai do value investing, Benjamin Graham.