O planejamento sucessório ou, em outras palavras, a organização de como um patrimônio será distribuído após o falecimento de seu titular sempre foi um tema relevante no mundo inteiro. E, com a crescente globalização e a maior complexidade sobre quais elementos de fato se enquadram como bens, essa questão passou a ganhar ainda mais destaque.
No Brasil, a prova disso está nas recentes mudanças na legislação tributária, em especial aquelas relacionadas ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). O PLP 108/2024, aprovado pela Câmara dos Deputados em agosto deste ano, trouxe alterações substanciais nesta tributação, abrindo portas para um novo cenário ligado às heranças e doações em vida.
Os maiores impactos, sem dúvida, são referentes a patrimônios internacionais e empresas familiares. Hoje, é necessário comprovar o pagamento do ITCMD para que as operações cambiais sejam bem-sucedidas. No entanto, diante das novas regras, os elementos dessa obrigatoriedade precisam ser analisados com atenção, visto que há diversos interesses envolvidos no processo.
Por um lado, há a necessidade de garantir a arrecadação de recursos para o Estado e de combater a evasão fiscal. Por outro, é preciso considerar os efeitos sobre aqueles que possuem esses legados, de maneira que o sistema tributário seja cada vez mais justo e, ao mesmo tempo, eficiente.
Distribuição desproporcional de lucros
Uma das mudanças mais impactantes na legislação diz respeito à tributação da distribuição desproporcional de lucros em empresas familiares. A lei considera essa prática como uma doação e, portanto, sujeita ao ITCMD.
A ideia dessa alteração é coibir a utilização dos mecanismos que permitiam que os lucros fossem distribuídos de forma desigual entre os sócios, sem a incidência do imposto. Dessa maneira, espera-se promover uma maior equidade na tributação e certificar que os devidos pagamentos sejam realizados. Além disso, há a expectativa da perpetuação das companhias, visto que foram criados aparatos que favorecem a sucessão familiar.
Contudo, precisamos compreender que, de um modo ou de outro, trata-se de um aumento da carga tributária. Ou seja, também há uma maior burocracia para garantir a transferência de bens e ações entre gerações, o que pode levar algumas famílias a aderir a estratégias de gestão e sucessão menos custosas, tanto em termos de tempo quanto de dinheiro.
Imóveis localizados no exterior
Outra grande alteração é a inclusão de imóveis localizados em outros países no cálculo do ITCMD. O objetivo da medida é ampliar a base de tributação e aumentar a arrecadação, uma vez que as pessoas com patrimônio no exterior passarão a contribuir de forma mais proporcional para os cofres públicos.
Assim como acontece em relação à questão das empresas familiares, essa mudança também é uma faca de dois gumes. Aqui, estamos falando de termos de avaliação de bens e obrigações tributárias de diferentes nações, as quais exigem uma adequação constante a regras internacionais.
Será que essa conformidade realmente passará a ser seguida pelos contribuintes e pelo Estado? Ainda não há uma resposta para essa pergunta, já que depende do que veremos acontecendo na prática.
O que podemos esperar?
Podemos perceber que a implementação bem-sucedida das novas regras dependerá não apenas de como elas serão regulamentadas, mas também aplicadas no dia a dia. Por isso, é fundamental que o governo estabeleça normas claras e objetivas, que garantam a segurança jurídica, evitando assim que as mudanças se tornem obstáculos para os contribuintes.
A missão prioritária agora é encontrar o equilíbrio entre a necessidade de arrecadação e a preservação da saúde financeira das empresas familiares e do patrimônio dos indivíduos. Obviamente, a nova legislação busca tornar o ITCMD mais adequado aos dias atuais, mas isso só acontecerá se as incertezas forem eliminadas ao longo do processo.
O fato é que estamos diante de um novo cenário para as heranças e doações. Que todas as partes possam fazer um esforço conjunto para concretizá-lo como o melhor possível.