Ascensão da tecnologia

O fim da tabela de preços: como a IA muda a precificação

A mudança pode parecer sutil, mas é profunda: trata-se de abandonar o conceito de preço como produto e assumir o preço como variável viva

O fim da tabela de preços: como a IA muda a precificação

Recentemente, a Delta Airlines anunciou que está migrando para um modelo de precificação impulsionado por inteligência artificial. Em vez de valores fixos, os preços das passagens serão definidos com base em fatores como histórico do cliente, urgência da compra e comportamento de navegação.

A mudança pode parecer sutil, mas é profunda: trata-se de abandonar o conceito de preço como produto e assumir o preço como variável viva. Um reflexo direto da ascensão da IA como motor de decisões personalizadas, e da queda de modelos padronizados que já não acompanham o comportamento do usuário.

Esse movimento ressoa além da aviação. Ele expõe uma fragilidade nos modelos SaaS tradicionais, especialmente em mercados complexos como o financeiro: tabelas estáticas, pricing por volume de usuários ou por pacotes de funcionalidades serviram bem em uma era de previsibilidade. Mas estamos entrando em outra fase.

Hoje, empresas buscam elasticidade: pagar mais quando usam mais, pagar menos quando operam de forma enxuta. E querem que o pricing acompanhe essa jornada, com inteligência e contexto. A IA, nesse cenário, torna-se mais do que uma tecnologia, vira uma aliada estratégica para ler sinais e recalibrar a proposta de valor em tempo real.

Em resumo, podemos dizer que não é sobre preço, e sim sobre disposição a pagar. Não é sobre tabela, é sobre contexto.

Como afeta a infraestrutura financeira?

Em infraestrutura financeira, isso é ainda mais crítico. O custo marginal de uma transação já é praticamente zero, mas muitos modelos ainda cobram como se cada operação carregasse um peso técnico. A consequência: margens pressionadas e barreiras à escala.

Adotar precificação dinâmica, orientada por dados, uso real e valor percebido, não significa abandonar a previsibilidade. Significa redesenhar a lógica do contrato para que ela acompanhe o ciclo de vida do cliente, e não o congele. Esse movimento deveria servir de alerta para todos os setores que enquadram suas propostas em caixas e ignoram o contexto geral e o uso real. Ignoram o valor percebido, o timing do cliente.

Enquanto isso, a IA está moldando uma nova lógica:

  • Preço que aprende com o comportamento dos clientes;
  • Cobrança que se adapta ao ciclo de maturidade do cliente;
  • Monetização que muda conforme o contexto de uso.

É o fim do “one size fits all” e o começo do “value fits now”. O futuro da precificação é probabilístico, não fixo. É orientado por dados, não por convenções de mercado. É vivo, iterativo e individualizado.

Empresas que internalizarem essa mudança sairão na frente não apenas tecnicamente, mas estrategicamente: com propostas mais flexíveis, contratos mais inteligentes e uma relação mais próxima com seus clientes.

Porque o futuro da precificação não está mais na tabela, mas na análise de comportamento e necessidades do consumidor.

Sobre o articulista

Fred Amaral é fundador da Lerian (2024), que desenvolve software open source para infraestrutura financeira. Antes, criou a Dock, primeira plataforma de Banking-as-a-Service (BaaS) da América Latina, que se tornou um unicórnio (US$ 1,5 bi) em 2022. Iniciou sua carreira no Deutsche Bank (2008) e BTG Pactual (2009-16), liderando operações de M&A e IPOs, e depois atuou como Head de Business Development na Uber (2017) e Movile/LBS (2016). Hoje, dedica-se ao que mais ama: construir produtos de infraestrutura financeira – e, o mais importante, se divertir no processo.