Os resultados de investimentos globais de venture capital no primeiro trimestre de 2025 podem dar a impressão de um mercado aquecido, mas essa percepção esconde nuances importantes. De janeiro a março, foram movimentados US$ 113 bilhões em aportes no mundo, um crescimento de 54% em relação a 2024, segundo o Crunchbase. Mas, esse salto tem nome e sobrenome: OpenAI. A empresa liderada por Sam Altman recebeu uma rodada de US$ 40 bilhões, representando sozinha um terço de todo o volume global e mais da metade do capital investido, só nos Estados Unidos.
Fora do epicentro da inteligência artificial (AI), o cenário é bem menos entusiasmante, sobretudo na América Latina. A região somou US$ 1,1 bilhão em aportes no trimestre, distribuídos entre 147 rodadas, incluindo equity, dívida e antecipação de recebíveis. Trata-se de uma retração expressiva: queda de 37% na comparação anual e 67% frente ao último trimestre de 2024, de acordo com levantamento da Sling Hub. Os recursos existem, muitos fundos estão bem capitalizados, mas para onde estão sendo direcionados e com quais critérios de mercado e território, é uma outra questão.
O Brasil liderou a captação regional, com US$ 500 milhões, o equivalente a 42% do total. Mesmo assim, os aportes foram pontuais: a healthtech Alice se destacou com uma rodada de US$ 22 milhões, enquanto o site de jornalismo Jota atraiu US$ 8,9 milhões em fase seed. Fora isso, a consagração do novo unicórnio latino-americano — a fintech mexicana Plata Card — aponta um desvio do protagonismo – antes quase monopólio – brasileiro. O que se conclui, é que cada vez mais o capital está indo para onde percebe haver eficiência operacional e visão clara de crescimento.
Como não poderia ser diferente, AI segue como força dominante nos investimentos e, de acordo com o PitchBook, 77% do valor movimentado nos EUA teve como destino soluções de tecnologia, em grande parte puxado pelo deal com a OpenAI. Mesmo excluindo essa transação, o setor absorveu quase metade dos recursos e um terço das operações realizadas no trimestre. Isso evidencia não apenas uma tendência, mas uma mudança estrutural: AI está afetando tudo à nossa volta e os investidores estão mais do que prontos para fomentar essa grande transformação.
Nesse contexto, o ecossistema de startups LATAM enfrenta um desafio duplo. De um lado, precisa demonstrar robustez, clareza estratégica e capacidade de tração desde os estágios iniciais. De outro, precisa competir por atenção em um ambiente global onde as apostas estão cada vez mais concentradas. O capital continua circulando, mas agora exige mais do que promessas. E, nesse novo jogo, só sobreviverá quem conseguir unir propósito, performance e um potencial altamente transformacional.
*Luiz Gustavo Neves é cofundador e CEO do GigU, anteriormente StopClub, um copiloto inteligente que aumenta a performance financeira e a segurança de motoristas e entregadores de aplicativo.