A bolsa tem passado por um período extenso de correções, saindo da máxima de 130.776,27 pontos para os atuais 110.393,09 pontos (queda de 15%) do índice (fechamento desta segunda-feira, 4). Alguns fatores que explicam tal queda estão diretamente associados a questões macroeconômicas e de percepção de risco, como:
• Crise energética global, com China e alguns países da Europa tendo que tomar medidas de racionamento;
• Persistentes gargalos nas cadeias de suprimento;
• Descarbonização da China – país pediu as empresas estatais para produzirem em níveis similares/inferiores aos do ano de 2020 (ano da pandemia), com base a alcançar o target de descarbonização de 2030;
• Redução do crédito imobiliário chinês e um aumento do nível de rigor, quanto a fiscalização e controle dos níveis de endividamento das empresas do país – principalmente do setor imobiliário;
• Problemas com a gigante do setor imobiliário Evergrand e um aumento de percepção de risco por parte dos investidores, acreditando que o calote da dívida que representa 2% do PIB do país poderia contaminar outros setores e o sistema financeiro doméstico e quiçá, global;
• Impasse quanto ao aumento do teto da dívida dos USA e a possibilidade de calote,
caso não se chegue a uma resolução até meados deste mês;
• Impasse quanto a aprovação do projeto de lei para gastos trilionários em infraestrutura dos USA, tal como financiamento deste e aprovação de gastos para projetos sociais e mais “verdes”;
• Redução do consumo e expectativas dos consumidores;
• Variantes do coronavírus e medidas restritivas sendo reimpostas pelos governos;
• Inflação generalizada;
• Redução dos estímulos monetários/aumento dos juros dos Bancos Centrais, consequente aumento dos yields dos títulos públicos e encarecimento/aumento da taxa de desconto usado na valoração dos ativos.
Todos estes fatores acarretam numa desaceleração do PIB global, redução do otimismo de curto prazo e revisão de targets de crescimento tanto para as economias quanto para a receita das empresas. É bem verdade que as bolsas mundiais passaram por um período esticado de alta e recuperação pós o início da pandemia, com um otimismo exacerbado tomando conta dos mercados, justificado pela grande injeção de liquidez e medidas de estímulo, sendo
esperado em algum momento um “choque de realidade” e correção de toda essa euforia.
Digo choque de realidade pois por muito tempo tem sido ignorado o fato de que a pandemia causou o fechamento definitivo de muitas empresas, o que por seguinte deixou e deixará um gap no mercado onde poderemos ver uma manutenção um pouco mais elevado dos índices de desemprego e queda de consumo e renda das famílias, já que
houve uma perda permanente de emprego.
Assim sendo, o que estamos vendo hoje nada mais é do que uma revisão dos alvos de crescimento e expansão das atividades econômicas, que deverão vivenciar uma desaceleração e um crescimento menos robusto do que antes era esperado para um cenário de céu de brigadeiro e famosa recuperação em “V”.
Não obstante, é importante termos em mente que mesmo com a desaceleração, a visão geral é de que ainda haverá crescimento, e que muitos dos problemas enfrentados hoje – principalmente dos gargalos nas cadeias de suprimento que tem afetado tanto a inflação e oferta de bens e serviços – deverão ser solucionados até meados do ano que vem, e que assim sendo, o momento atual tem se mostrado como uma boa oportunidade de entrada em alguns ativos que do ponto de vista fundamental tem tudo para experimentar valorizações em seus preços.
A bolsa brasileira está bastante descolada quando comparada com o par americano e no momento isso nos entrega duas questões, sendo uma positiva e outra negativa:
1. Positiva: Empresas mais descontadas e maior oportunidades de valorização no longo prazo, facilitando a busca por “barganhas” e ativos locais com diferencial de preço que em muitas vezes não se justifica, quando comparado a outros pares estrangeiros.
2. Negativa: Bolsa americana em “all time high” é preocupante, pois uma correção por lá geraria também uma correção em outras praças, independente do nível de desconto que algumas já possam estar vivenciando, devido a alta correlação entre os mercados.
S&P500 vs Bolsa Brasileira de 28/02/2020 até 04/10/2021 | Refinitv Eikon
SPX x Bovespa dolarizado | Refinitv Eikon
Relação Preço/Lucro de negociação – Bovespa na esquerda e S&P500 na direita | Refinitv Eikon
Importante lembrar que a diferença e o descolamento entre a bolsa brasileira e a americana é completamente justificada principalmente por uma questão de qualidade, onde podemos encontrar ativos melhores, mais sólidos e saudáveis, mais bem preparados para enfrentar os percalços globais do que os brasileiros. A grande questão aqui é: Mas até que ponto é justificado o tamanho desse desconto? Por fim, não devemos nos esquecer de que os próximos meses/ano, deverão ser de volatilidade elevada e aumento do prêmio de risco, com questões relacionadas a precatórios, teto de gastos, inflação elevada, segurança das eleições, e a própria eleição do ano que vem, trazendo um monte de incertezas para os ativos locais. Em suma, oportunidades estão aparecendo e continuarão a aparecer, seja na renda variável ou na renda fixa, para onde quer que olhe, dá para encontrar boas oportunidades, dependendo apenas da sua disposição de risco e horizonte. Porém, não custa dizer que o cenário está bastante desafiador.
Mas como diria o ditado: “Mar calmo nunca fez bom marinheiro.”
Abraço a todos.