A culinária é um tema saboroso, que se relaciona à cultura, à produção de alimentos de cada região, às preferências de gosto e tantos outros fatores. E, quando envolve harmonização do vinho, torna-se um assunto ainda mais sedutor.
Para uma combinação equilibrada, é preciso considerar as características do vinho e do prato: sua estrutura, as sensações que ambos proporcionam ao olfato, paladar e tato, bem como as melhores possibilidades de entender como um pode realçar as características do outro.
Ao analisar o vinho é preciso estar atento à sua estrutura, considerando aspectos como acidez, teor alcoólico, taninos, açúcar residual e corpo – que é o “peso” do vinho na boca. E, assim, os vinhos podem ser classificados como leves, de médio corpo e encorpados.
Os vinhos leves, por sua estrutura delicada, são ligeiros no paladar, que preenchem sutilmente a boca e, em geral, possuem um teor alcoólico menor. Já os vinhos de médio corpo são mais estruturados e preenchem a boca com um pouco mais de intensidade. E os vinhos encorpados apresentam maior estrutura, sendo considerados “volumosos” e, geralmente, apresentam maior percentual de álcool por volume, trazendo sensação de maior densidade à boca.
Cada tipo de vinho causa diferentes sensações na boca. Maior salivação e frescor, quando há maior presença de acidez; uma certa maciez, se os taninos estiverem redondos; ou mesmo adstringência (a percepção de secura em boca), se estes taninos estiverem presentes em maior quantidade. Pode haver sensação de calor, a depender da quantidade de álcool.
Dicas de harmonização
Conhecida a composição do vinho, seu estilo e origem, fica mais fácil pensar nas harmonizações. O pontapé inicial é entender a estrutura e a complexidade do prato, o que irá considerar os temperos, molhos, quantidade de gordura e tipo de proteína, bem como as sensações que essas características proporcionam para, assim, ter uma harmonização agradável. A harmonização de um vinho e um menu pode ser considerada sucesso quando o conjunto apresenta estruturas em equilíbrio e sensações ajustadas de tal forma que o vinho e a comida se realçam e se complementam, sem se sobrepor, criando um terceiro sabor.
Alguns exemplos de harmonizações bem conhecidas são: espaguete com molho, carne e vinho Chianti, ossobuco com vinho tinto Dolcetto, carne de caça com Shiraz Australiano, cordeiro com Bordeaux, empanada de carne com Malbec Argentino e queijo parmesão com Amarone.
A presença de ingredientes doces na comida salgada é um desafio, mas pode resultar em uma harmonização por contraste – quando as características opostas do vinho e do prato se misturam e se equilibram formando um novo sabor. Entre as possibilidades para este estilo de harmonização, estão gorgonzola com colheita tardia, acarajé com espumante rosé demi-sec, bolinho de bacalhau com vinho verde, entre outros.
Além disso, lembre-se que a suculência é desejável para facilitar a mastigação e a digestão. Ou seja, caso não esteja presente na comida, ela deve ser estimulada pela salivação proporcionada pela acidez do vinho.
Há também as harmonizações tradicionais, em que se considera a região onde o alimento e o vinho são produzidos e que resistem a inovações. São as chamadas combinações clássicas, em que o realce foi alcançado por anos de experimentação na cozinha e à mesa. Vamos a alguns exemplos: ostras com Chablis, caviar com champanhe, cordeiro assado com Bordeaux, foie gras com Sauternes, queijo de cabra com Sancerre.
Outra possibilidade, é harmonizar por similaridade, quando são conhecidos os princípios básicos da harmonização. Dessa forma, pode-se chegar a combinações naturais de características semelhantes tanto no prato como no vinho. É o caso dos embutidos leves com tintos leves como Beaujolais ou Pinot Noir, dos embutidos condimentados com Cabernet Sauvignon, da paella com vinho rosé, do filé condimentado com Shiraz ou dos bolos e das tortas com Moscatéis.
Na dúvida, vale sempre apostar em algumas harmonizações consagradas para não errar no cardápio e no vinho: ceviche faz uma boa dupla com vinhos brancos aromáticos; salmão fresco é um bom par para um branco frutado, carpaccio e estrogonofe acompanham bem um tinto leve; feijoada vai bem com espumantes e carnes leves como galeto harmonizam bem com brancos com boa acidez ou com mais corpo.
Gostou das dicas? Agora, é só deixar a imaginação ir longe.
Por Marina Bufarah, sommelière do Grupo Wine