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Quando tarifas revelam oportunidades: O Brasil e a Nova Guerra Comercial

Artigo de Tallis Gomes, Sócio-fundador, mentor e Presidente do G4, maior base de dados sobre o pequeno e médio empresário

Foto: EUA e China / CanvaPro
Foto: EUA e China / CanvaPro

Por Tallis Gomes
Sócio-fundador, mentor e Presidente do G4, a maior base de dados sobre o pequeno e médio empresário brasileiro

Os Estados Unidos acabam de acionar uma alavanca silenciosa, mas poderosa: pausaram tarifas para a maioria dos seus parceiros comerciais — exceto uma nação, a China, cujas tarifas subirão para 125%. Para muitos, esse tipo de manchete passa batido no meio do noticiário econômico. Para quem empreende, ela deveria soar como um sinal de alerta — ou melhor, como um raro convite da história.

Esse movimento, por mais técnico que pareça, marca uma nova fase da reorganização econômica global. Não é sobre números. É sobre poder. E quando o poder muda de lugar, surgem brechas. Brechas por onde empresas sobem, países reposicionam sua relevância e fortunas se constroem.

A guerra tarifária entre EUA e China já não é mais uma disputa pontual. É um capítulo de uma guerra fria moderna — menos ideológica, mais comercial. E como toda guerra, ela redesenha rotas, confiança e dependência.

O que me chama atenção não é o aumento da tarifa em si. É a mensagem por trás: os Estados Unidos estão oficialmente colocando um preço na dependência da China. E o mundo corporativo entendeu o recado. Se você é uma empresa global, cada vez mais depender de produtos, insumos ou componentes chineses significa pagar mais caro. Mais do que isso: significa carregar risco.

E onde há risco, há demanda por alternativas.

É aí que o Brasil entra. Ou melhor, é aí que o Brasil poderia entrar — se estiver pronto.

O país vive uma espécie de paradoxo: temos abundância de recursos, capacidade industrial ociosa, capital humano subutilizado e um mercado interno vibrante. Mas ainda operamos com a mentalidade de fornecedor de commodities. Assistimos à história passar, quando poderíamos escrevê-la.

Agora temos uma chance rara de corrigir isso.

Estamos longe dos epicentros de tensão geopolítica, temos estabilidade institucional comparativa, e podemos — com visão e coragem — nos posicionar como uma plataforma industrial alternativa para o Ocidente.

Empresas brasileiras que entenderem esse jogo e se moverem agora poderão ocupar um espaço que antes era da China. Sim, é ambicioso. Mas a história favorece os ousados.

O que isso exige, na prática?

Primeiro, inteligência de mercado. Saber onde estão as fraturas nas cadeias de suprimento globais. Quais empresas estão relocalizando produção. Quais setores estão buscando “nearshoring” ou “friend-shoring”. Esse mapa existe. Está disponível. Só falta quem o use.

Segundo, capacidade de adaptação. O mundo não quer só produto mais barato. Quer produto confiável, rastreável, alinhado a critérios ambientais, sociais e de governança. Isso não é moda. É exigência de sobrevivência no mercado internacional.

Terceiro, comunicação. O Brasil precisa parar de se vender como “país do futuro” e começar a se apresentar como parceiro confiável do presente. Isso começa por cada empresa. Toda marca é, no fim, uma narrativa.

Quarto, ambição estratégica. Estamos diante da oportunidade de transformar polos industriais subutilizados em hubs de exportação. O Brasil precisa pensar como plataforma. E isso exige empresários com visão continental, não apenas regional.

As grandes transformações econômicas da história começaram assim: com um movimento sutil de placas tectônicas. O mundo busca hoje aquilo que temos em abundância: estabilidade, capacidade e espaço para crescer.

Mas o tempo é curto. Outros países também enxergam essa oportunidade. O Vietnã, a Índia, o México — todos estão se movendo. A diferença é que nenhum deles tem o tamanho de mercado que o Brasil oferece somado à distância segura das tensões do Pacífico.

O recado é simples: se não formos protagonistas agora, não seremos sequer coadjuvantes depois. A história está oferecendo uma nova chance ao Brasil. Mas ela não espera por indecisos. Quem entender isso agora vai colher enquanto os outros ainda estiverem reclamando da burocracia. Porque o mundo não está apenas mudando. Ele está, mais uma vez, sendo redesenhado. E dessa vez, o Brasil pode ser mais do que território. Pode ser direção.