Uma recomendação do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) pode trazer o horário de verão de volta para a rotina dos brasileiros. A entidade avalia que a medida pode ajudar a garantir a segurança energética e a conter o preço das contas de luz, em um contexto de calor extremo, seca e bandeira vermelha patamar 2 em setembro.
A medida consiste em adiantar os relógios em uma hora durante os meses de primavera e verão, de modo a aproveitar a luz natural e economizar energia elétrica.
O horário de verão foi implementado pela primeira vez no Brasil em 1931 e extinto em 2019, após o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro avaliar que a medida tornou-se pouco efetiva para a economia energética.
Apesar da recomendação, o martelo ainda não foi batido pelo governo federal. O ministro de Minas e Energia Alexandre Silveira disse que os efeitos da adoção do horário de verão ainda estão sendo considerados, sobretudo os impactos financeiros.
Especialistas consultados pelo BP Money esclareceram o nível de impacto no setor de energia elétrica, bem como a outros segmentos da economia.
Impacto financeiro do horário de verão para empresas do setor de energia elétrica é moderado
Caso o horário de verão seja levado adiante, empresas geradoras e distribuidoras de energia devem ser impactadas financeiramente, mas de modo limitado, garantiu Ana Neves, especialista em gestão de negócios e fundadora da 2B2B.
De acordo com a especialista, a economia de energia durante o horário de verão girava em torno de 4% a 5% no horário de pico, mas as mudanças nos padrões de consumo e eficiência energética ao longo dos anos reduziram a relevância dessa economia para o setor.
“Com a medida, as distribuidoras de energia podem enfrentar uma redução de consumo nos horários de maior demanda, o que pode impactar diretamente suas receitas nesse período. No entanto, em termos absolutos, o impacto é pequeno”, disse Neves.
O especialista em economia circular Edson Grandisoli chamou atenção para o fato de que estudos recentes indicam que a economia de energia durante o horário de verão era de aproximadamente 0,5% a 1% no consumo de eletricidade no horário de pico.
Portanto, segundo ele, as ações das empresas também não devem ser seriamente impactas. “Se acontecer, tenderá a se manter limitado e a curto prazo”, afirmou Grandisoli.
Já para Gláucia Fernandes, professora da Escola de Negócios da UFRJ, o horário de verão pode pode impactar positivamente as ações das principais empresas do setor.
“A economia gerada pela redução de custos operacionais, como a menor necessidade de acionamento de usinas termelétricas, pode melhorar a margem de lucro dessas empresas, algo que costuma ser visto de forma positiva pelos investidores”, explicou Fernandes.
A professora também ressaltou, porém, a redução do impacto financeiro da medida ao longo dos anos. Segundo ela, em 2017, a economia foi de R$ 145 milhões, um valor significativamente inferior aos R$ 405 milhões registrados em 2013.
“Esse declínio se deve, principalmente, à modernização do setor elétrico, com o avanço das tecnologias de iluminação mais eficientes, como lâmpadas de LED, além de mudanças nos padrões de consumo de energia da população, que reduzem a dependência da medida para economizar energia”, afirmou Glaúcia.
E o bolso do consumidor?
Do ponto de vista do consumidor, o impacto financeiro direto também tende a ser limitado, destacou Washington Mendes, especialista em finanças da WMO Digital.
Segundo Mendes, com a crescente participação de eletrodomésticos e ar-condicionados, que tendem a aumentar o consumo de energia independentemente da iluminação natural, o impacto do horário de verão na conta de luz é cada vez mais reduzido.
“O horário de verão pode gerar uma leve redução no consumo de energia, especialmente em regiões onde a iluminação artificial é usada intensamente no fim da tarde. Isso pode resultar em uma pequena economia na conta de luz, mas dificilmente será significativa para a maioria das famílias ou empresas”, disse o especialista.
Outros segmentos impactados
Enquanto o setor de energia elétrica deve ver um impacto moderado com a implementação do horário de verão, outros segmentos da economia serão mais diretamente afetados, como o comércio.
“O horário de verão pode prolongar o período útil do dia, incentivando maior consumo no comércio e em serviços de lazer, como restaurantes, bares e shoppings. Esse setor tende a se beneficiar pela maior movimentação de pessoas em horários com luz natural, o que pode aumentar as vendas”, destacou Washington Mendes.
O setor de turismo também deve ser beneficiado, uma vez que a medida permite um maior aproveitamento das atividades ao ar livre, aumentando a demanda por viagens, passeios e entretenimento.
Na mesma linha, o setor de lazer e entretenimento, incluindo cinemas, restaurantes e parques, também se favorece, já que as pessoas tendem a prolongar suas atividades sociais, especialmente em regiões onde o clima favorece atividades ao ar livre, destacou Gláucia Fernandes.
Já em relação ao agronegócio, o impacto é mais comportamental do que financeiro, afirmou Mendes. “As atividades no campo costumam ser ajustadas conforme a luz solar, portanto, dependendo da região, o horário de verão pode facilitar o planejamento das atividades diárias”, pontuou Washington.
Ana Neves chamou atenção para a indústria, que pode enfrentar desafios logísticos caso a medida seja implementada. “As indústrias precisam, muitas vezes, adaptar seus processos para horários de menor demanda, o que pode aumentar os custos de operação em termos de planejamento”, afirmou a especialista.
Neves ressaltou, no entanto, que a adaptação à medida já é uma prática comum para muitas empresas industriais.