Cúpula no Uruguai

Mercosul e UE devem fechar parte técnica do acordo nesta sexta

Apesar de avanços, texto final do acordo ainda não deve ser assinado

Mercosul e União Europeia avançam no acordo
Acordo Mercosul e UE vai ter parte técnica assinada/ Reprodução

O Mercosul e a UE (União Europeia) devem anunciar o encerramento da parte técnica das negociações do acordo entre os dois blocos nesta sexta-feira (6). A informação, divulgada pelo “Terra”, é de fontes próximas aos negociadores do Mercosul, presentes na Cúpula do grupo, que ocorre nesta quinta-feira (5) e sexta-feira (6).

Segundo as fontes, durante o evento os dois blocos devem assinar uma declaração conjunta confirmando a conclusão da parte técnica do acordo. Porém, o texto final ainda não deve ser assinado.

Na ocasião, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também deve assinar um fundo de cooperação ambiental em favor dos países do Mercosul. Inclusive, Leyen sinalizou recentemente que o acordo entre UE e Mercosul está próximo de ser finalizado.

“A linha de chegada do acordo UE-Mercosul está próxima. Vamos trabalhar, vamos atravessá-la. Temos a oportunidade de criar um mercado de 700 milhões de pessoas, a maior parceria comercial e de investimentos que o mundo já viu. Ambas as regiões serão beneficiadas”, escreveu a presidente, no X.

O tratado é negociado desde 1999 e passou por um consenso inicial em 2019. Ele busca estreitar as relações comerciais e políticas entre os dois blocos ao estabelecer benefícios mútuos como redução de tarifas, regulamentação de padrões técnicos e compromissos sociais e ambientais.

O debate sobre o assunto ganhou mais destaque com a Cúpula do G20. Durante o evento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Leyen reafirmaram a relevância estratégica do acordo.

Quais são as expectativas para os resultados das negociações entre Mercosul e UE?

Negociadores europeus e sul-americanos começaram a nova rodada com prioridades diferentes, destaca o economista e professor da Universidade Tiradentes Josenito Oliveira. Por um lado, a UE tem o objetivo de finalizar um anexo adicional ao acordo original que inclui exigências mais rigorosas de sustentabilidade ambiental e o cumprimento do Acordo de Paris.

Por sua vez, os negociadores do Mercosul pressionam para que as condições impostas pela União Europeia não sejam excessivamente restritivas ou protecionistas, especialmente em relação ao agronegócio.

“A cúpula de líderes no início de dezembro é vista como um momento estratégico para avançar as negociações, mas não há garantias de que todos os pontos serão resolvidos até lá“, afirma o Oliveira.

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, expressou otimismo sobre as negociações. Segundo ele, “os avanços são bastante animadores para que se chegue a um bom termo” e o “governo brasileiro nunca esteve tão perto desse acordo”.

Ao mesmo tempo, ainda há impasses significativas a serem vencidos. “A falta de consenso, tanto no Mercosul quanto na UE, somada à crescente complexidade das demandas ambientais e protecionistas, indica que o acordo pode não apenas enfrentar atrasos, mas também se tornar mais um exemplo de fracasso diplomático em um cenário internacional cada vez mais polarizado“, diz o advogado especializado em Políticas Públicas Marcello Rodante.

Outro fator preocupante é o ambiente de polarização dentro da própria União Europeia, que dificulta a formação de uma posição unificada em torno do tratado. Nesse contexto, os países têm se preocupado com questões internas acima do potencial econômico de uma parceria com o Mercosul, afirma Rodante.

Por sua vez, Oliveira acredita que a probabilidade de o acordo não se concretizar é baixa. “Líderes europeus e sul-americanos têm trabalhado para superar as divergências, com a possibilidade de uma conclusão durante a próxima cúpula do Mercosul, em dezembro, mas ainda não há garantia de que isso aconteça”, afirma.

Quais países europeus são contra e quais são a favor do acordo?

Para o Mercosul, o acordo significa uma oportunidade de ampliar a exportação de produtos agrícolas e matérias-primas, gerando empregos e fomentando o crescimento econômico. Mas, para isso, vai ser preciso atender padrões sanitários e ambientais rigorosos, impostos pela UE.

Mas o protecionismo agrícola da UE está entre os principais impasses para o acordo. Países como França e Irlanda se preocupam com a competitividade que o acordo pode trazer. “A recente rejeição do acordo pela Assembleia Nacional da França evidenciou a força desse protecionismo, que também utiliza questões ambientais e trabalhistas como justificativas para impor barreiras”, pontua o advogado.

Nesse contexto, são utilizados como argumento o desmatamento da floresta amazônica e o episódio de trabalho análogo à escravidão em vinícolas brasileiras. Mas o protecionismo também ganha força, uma vez que muitos países da UE têm uma produção agrícola altamente subsidiada.

Por outro lado, há países que focam nos benefícios estratégicos e econômicos que o tratado pode trazer.

  • Quem é a favor?

Alemanha

O país vê o acordo como uma oportunidade de ampliar exportações produtos industrializados e serviços de alto valor agregado, como máquinas, automóveis, produtos químicos e tecnologia, explica Rodante. 

“A Alemanha lidera na promoção do comércio internacional como mecanismo de crescimento econômico e está comprometida com tratados comerciais globais”, acrescenta Oliveira.

Espanha e Portugal

Para estes países, Rodante destaca que o acordo também tem um significado histórico, devido à proximidade linguística e cultural com os países do Mercosul, principalmente o Brasil e a Argentina.

“Esses países enxergam na parceria uma forma de consolidar a posição da UE como um ator global em comércio, além de diversificar sua rede de acordos em um contexto de crescente competição global”, diz o especialista em Políticas Públicas.

Além disso, o acordo beneficia exportações de espanhóis e portugueses, principalmente de produtos como azeite, vinho e equipamentos industriais, menciona Oliveira. Esse reforço de laços comerciais também ajuda a consolidar a posição desses dois países como “pontes” entre a Europa e a América Latina.

Países nórdicos (parcialmente)

Oliveira destaca que esses países estão interessados em diversificar parceiros comerciais fora da Europa, mas apoiam o acordo desde que haja garantias de sustentabilidade ambiental.

  • Quem é contra?

França

A França é líder da oposição, especialmente por temer competição com o setor agrícola do país, altamente subsidiado. Produtos brasileiros como carne bovina, açúcar e etanol são mais competitivos em relação aos franceses em preço e volume, destaca Rodante.

Assim, a forte influência de sindicatos agrícolas aumenta a resistência interna ao acordo, diz Oliveira.

Irlanda

O país tem as mesmas preocupações sobre competitividade agrícola, especialmente em relação às carnes, um setor vital para sua economia rural.

Áustria, Polônia e Bélgica

A principal preocupação destes países está relacionada a questões ambientais. Também há apoio a movimentos de agricultores locais.