O supersalário no Judiciário se tornou um dos principais vilões das contas públicas. Em 2023, o Brasil destinou R$ 156,6 bilhões ao sistema de Justiça. Isso representou 1,43% do PIB (Produto Interno Bruto), segundo o Tesouro Nacional. O Judiciário destinou 80,2% desse valor ao pagamento de salários e benefícios de juízes e servidores
O levantamento também colocou o Brasil em segundo lugar no ranking mundial de gastos com Justiça, atrás apenas de El Salvador. A média entre os 50 países analisados foi de 0,3% do PIB, ou seja, o gasto brasileiro foi quase cinco vezes maior.
Essa escalada preocupa especialistas, já que o crescimento de 11,3% entre 2022 e 2023 evidencia um modelo insustentável. Os chamados “penduricalhos” ajudam a burlar o teto constitucional e inflar os salários da elite do funcionalismo.
Supersalário no Judiciário se apoia em brechas legais e decisões corporativas
Três mecanismos impulsionam diretamente os supersalários: licenças compensatórias, verbas indenizatórias e pagamentos retroativos. Embora pareçam legais, esses instrumentos criam distorções e aumentam o gasto público.
Segundo Bruno Carazza, professor da Fundação Dom Cabral, os benefícios se espalham por decisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Como esses conselhos são compostos majoritariamente por membros da própria carreira, eles costumam aprovar medidas que favorecem a categoria.
Além disso, verbas como auxílio-alimentação e auxílio-saúde, apesar de serem benefícios regulares, são classificadas como indenizações. Essa manobra permite que os valores fiquem isentos do teto e de tributos.
Supersalário no Judiciário cresce com retroativos milionários
A ONG Transparência Brasil revelou um dado alarmante: em 2023, sete em cada dez magistrados receberam pagamentos retroativos. Dentre eles, 1.657 juízes embolsaram mais de R$ 500 mil em apenas uma rubrica.
Entre 2018 e abril de 2025, o Judiciário distribuiu R$ 10,3 bilhões em retroativos. Além disso, 2.679 magistrados receberam mais de R$ 1 milhão cada.
De acordo com Cristiano Pavini, da Transparência Brasil, muitos desses pagamentos compensam supostos direitos antigos, acumulados por até 15 anos. Só em 2023, o valor distribuído com esse tipo de benefício chegou a R$ 3 bilhões.
Novos projetos de lei podem aumentar vencimentos ainda mais
Enquanto o STF tenta impor limites aos gastos, o Congresso analisa o projeto de lei 2721/21. A proposta pode agravar ainda mais o cenário ao permitir, por exemplo, o pagamento em dobro de auxílios como saúde e refeição.
Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, afirma que apenas quatro trechos do projeto podem gerar um impacto adicional de R$ 3,4 bilhões já em 2025. Para ela, o problema está na forma como os órgãos classificam as verbas.
— Precisamos corrigir essa distorção. Verbas remuneratórias não podem continuar sendo tratadas como indenizações. Isso dribla o teto e prejudica o equilíbrio fiscal — afirmou.
Supersalário no Judiciário vira pauta prioritária no Senado
O debate sobre supersalários chegou ao Congresso. O senador Ciro Nogueira (PP-PI) declarou que o tema é “o mais importante a ser enfrentado no país”. Jorge Kajuru (PSB-GO) chamou os números de “estarrecedores”.
O ministro do STF Gilmar Mendes também se manifestou. Ele classificou a situação como “desordem institucional”. Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) propôs uma solução legislativa definitiva:
— Precisamos de critérios claros. As verbas só devem ser criadas por lei, com base em interesse público e dentro dos limites fiscais.
Dessa forma, enquanto a sociedade lida com cortes e ajustes, o Judiciário continua operando com brechas que favorecem altos salários. O desafio, agora, está nas mãos dos parlamentares.