A pandemia de coronavírus provocou mudanças no perfil dos desempregados de longa duração, que procuram trabalho há dois anos ou mais. Durante a crise sanitária, o Brasil registrou aumento na proporção de homens, negros e trabalhadores com 30 anos ou mais nessa situação, indica levantamento da consultoria IDados.
A análise foi produzida a partir de resultados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) trimestral, divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O desemprego de longa duração descreve a realidade de profissionais que estão sem trabalho e procuram novas vagas (formais ou informais) há pelo menos dois anos. No primeiro trimestre de 2021, quase 3,5 milhões de brasileiros enfrentavam esse quadro. Trata-se do maior número da série histórica da Pnad Contínua, com dados desde 2012.
Conforme a IDados, as mulheres ainda são maioria entre os desempregados de longo prazo, mas os homens aumentaram sua participação no grupo ao longo da pandemia. No primeiro trimestre deste ano, eles passaram a responder por 41,1% do total de pessoas nessa situação.
Um ano antes, no primeiro trimestre de 2020, a fatia masculina era de 37%. Ou seja, houve alta de 4,1 pontos percentuais no intervalo de um ano. Enquanto isso, a parcela feminina baixou de 63% para 58,9%.
Responsável pelo levantamento, o pesquisador da IDados Bruno Ottoni lembra que as estatísticas oficiais costumam sinalizar maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho entre as mulheres. Entretanto, com a chegada da pandemia, a fatia masculina também passou a enfrentar obstáculos, o que se reflete nos dados de desemprego de longa duração, aponta o economista.
No recorte por idade, a parcela de adultos com 30 anos ou mais foi aquela que elevou sua participação entre os desocupados há dois anos ou mais. Entre o primeiro trimestre de 2020 e igual período de 2021, subiu três pontos percentuais, de 50,2% para 53,2%. Assim, distanciou-se da fatia mais jovem, com 29 anos ou menos, que recuou de 49,8% para 46,8%.
Ottoni ressalta que o grupo mais velho costuma reunir profissionais com experiência no mercado, mas isso não foi suficiente em muitos casos para garantir recolocação. Segundo ele, o quadro preocupa porque pode indicar que mais chefes de famílias tenham entrado na fila do desemprego de longa duração.
“Os resultados trazem preocupações. Grupos que antes não sofriam tanto no mercado de trabalho também passaram a sofrer. Em geral, a parcela com 30 anos ou mais não teria tantas dificuldades para se inserir, mas sofreu. Homens teriam maior facilidade, mas aí vem a pandemia, e eles não conseguem emprego”, ressalta.
O levantamento traz ainda recorte por cor. No primeiro trimestre deste ano, profissionais negros passaram a responder por 64,4% do total de desempregados havia dois anos ou mais.
A marca representa aumento de 1,3 ponto percentual em relação ao começo de 2020 (63,1%). Trabalhadores negros, frisa Ottoni, já amargavam mais dificuldades no mercado de trabalho antes da crise, registrando um aumento menor se comparado a homens e adultos de 30 anos ou mais.
Os profissionais brancos que estavam no desemprego de longa duração passaram de 36,9% para 35,6% durante a pandemia. “Houve aumento entre os trabalhadores negros, mas não tão grande. A situação já era preocupante”, sublinha o pesquisador.
Na visão de Ottoni, a volta dos desocupados de longa duração ao trabalho depende, principalmente, da retomada do setor de serviços. É que esse segmento é o maior empregador do país e, na pandemia, foi atingido em cheio por restrições.
A destruição de vagas ocorreu porque serviços diversos dependem da circulação de consumidores. Hotéis, bares e restaurantes fazem parte das atividades do setor.
Se a vacinação contra a Covid-19 acelerar, há uma perspectiva de melhora dos negócios – e do mercado de trabalho -a partir do segundo semestre deste ano, conclui Ottoni.
“O que vai acontecer com esse grupo [desempregados há mais de dois anos] vai depender muito de serviços. Se houver recuperação, podemos ter recontratações primeiro de quem está há menos tempo desempregado e, depois, de quem está afastado no longo prazo. Esse pessoal é o que fica mais para o final da fila, porque, na hora de contratar, o empregador costuma buscar antes alguém desempregado há menos tempo”, analisa.