SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Bolsa de Valores brasileira teve a pior semana desde março de 2020, quando o Brasil sofreu o primeiro baque da pandemia. O Ibovespa recuou 7,28% na semana encerrada nesta sexta (22) ?na semana encerrada em 20 de março de 2020, a queda foi de 18,88%. Em 2021, o índice acumula queda de 13,15%.
No dia, a queda foi de 1,34%, a 106.296 pontos. A recuperação parcial ocorreu após o ministro Paulo Guedes (Economia) garantir, ao lado de Jair Bolsonaro (sem partido), que permanecerá no cargo, depois de rumos de que o economista poderia deixar o governo após a decisão do Planalto de driblar o teto de gastos.
Guedes disse nesta sexta que não “irá rever a arquitetura fiscal brasileira”, embora tenha confirmado que aceitará o aumento nos gastos. Ainda durante a fala do ministro, a Bolsa subiu 0,01%, oscilando pela primeira vez no azul no pregão, chegando à máxima de 107.749 pontos.
Antes da fala de Guedes, a Bolsa chegou a recuar 4,53% no início da tarde, à mínima de 102.853, com o mercado reagindo aos rumores da saída de Guedes.
As declarações do ministro também ajudaram o dólar a recuar 0,74%, a R$ 5,6250. Mais cedo, a moeda americana tinha alcançado a máxima de R$ 5,7550, alta de 1,55% ?o maior valor desde o fechamento de 30 de março (R$ 5,7580). Na semana, o dólar acumula alta de 3,13%. Em 2021, a moeda teve uma valorização de 8,4%.
O mercado vem impondo preços mais altos para investir no país devido ao aumento da percepção de risco após a gestão Bolsonaro propor um drible na regra do teto de gastos. A manobra causou uma debandada no time de Guedes nesta quinta-feira (21) e gerou rumores sobre a saída do ministro.
A disparada do dólar e a forte queda da Bolsa ocorrem desde a última terça-feira (19). Na ocasião, Bolsonaro, determinou que o novo Bolsa Família, o Auxílio Brasil, seja de R$ 400, acima dos R$ 300 estimados anteriormente.
Para cumprir a determinação do presidente, a ala política avaliou que precisaria furar o teto de gastos ?regra que limita o crescimento das despesas públicas. Para driblar a regra, nesta quinta, o governo e seus aliados no Congresso inseriram na PEC (proposta de emenda à Constituição) que adia o pagamento de precatórios uma mudança nas regras do teto de gastos que, na prática, expande o limite das despesas federais.
Pelo plano, aprovado nesta quinta pela comissão especial da Câmara que analisa a proposta, a Constituição será alterada para que o teto seja corrigido anualmente pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acumulado em 12 meses de janeiro a dezembro. Atualmente, o período usado como base para o limite anual considera o IPCA acumulado em 12 meses até junho do ano anterior.
Para abrir ainda mais espaço no Orçamento, também serão retirados do teto de gastos do próximo ano recursos destinados ao pagamento de precatórios, que será parcialmente adiado. A PEC cria um limite para despesas com sentenças judiciais dentro do teto.
O conjunto das alterações previstas cria um espaço orçamentário para despesas de R$ 83 bilhões no ano eleitoral de 2022.
A manobra levou a uma debandada na Economia. Saíram do governo o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt ?subordinado a Funchal.
A secretária especial adjunta do Tesouro e Orçamento, Gildenora Dantas, e o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Rafael Araujo, também pediram exoneração.
Apesar de terem freado a alta no dólar e desacelerado as perdas no mercado de ações, as declarações de Guedes não desfizeram o cenário de aversão ao risco e futuras turbulências são esperadas, segundo Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest.
“Embora tenha ocorrido esse ajuste, após a permanência do ministro Paulo Guedes como único braço liberal do governo, o dólar rodando perto de R$ 5,60 significa aversão ao risco”, diz Consorte. “O que isso sugere é que o mercado ainda enxerga isso [o drible no teto] como uma pedalada fiscal”, afirma.
“Há muita incerteza no curto prazo que pode empurrar o dólar para cima ante o real. Por outro lado, os players acham que o real está gravemente desvalorizado, o BC [Banco Central] provavelmente aumentará seu ritmo de alta dos juros e intervenções cambiais ainda são possíveis. Portanto, a estabilidade nesses níveis não parece ser o cenário-base”, disse o Citi em nota.
Os juros futuros mantinham-se sob intensa onda de compra, com as taxas disparando mais 51 pontos-base em alguns vencimentos, aumentando a pressão para o Bacen acelerar o ritmo de aumentos da taxa Selic.
As empresas listadas na Bolsa de Valores brasileira perderam R$ 284 bilhões em valor de mercado em três dias após o governo revelar a intenção de furar o teto de gastos para aumentar o valor do novo Bolsa Família.
Na segunda-feira (18), as ações na Bolsa valiam R$ 4,984 trilhões. Ao final do pregão desta quinta, o valor caiu para R$ 4,700 trilhões, segundo dados levantados pela Economatica.
O petróleo Brent, referência mundial, subiu 1,18%, a US$ 85,61 (R$ 488,92). A alta da commodity não foi suficiente para valorizar a Petrobras, que vem caindo com o agravamento da crise fiscal do país. Os papéis PETR3 e PETR4 recuaram 2,03% e 1,12%, respectivamente.
A Vale subiu 1,2%, mesmo em dia de queda dos preços do minério de ferro. A visão do mercado sobre os setores de mineração e de siderurgia foi beneficiada pelo pagamento de um cupom de dívida da incorporadora Evergrande. Isso amenizou temores de crise no setor imobiliário chinês, principal mercado da companhia. Gerdau, Usiminas e CSN subiram 0,6%, 1,3% e 0,1%, respectivamente.
Nos Estados Unidos, o Dow Jones subiu 0,21%. Os índices S&P 500 e Nasdaq, porém, caíram 0,11% e 0,82%, em reação à declaração do presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), Jerome Powell, que disse nesta sexta que a autoridade monetária deve começar a reduzir suas compras de ativos em breve.
Powell também afirmou que ainda não deve aumentar as taxas de juros porque a geração de emprego no país está baixa e que a inflação provavelmente arrefecerá no próximo ano. A manutenção dos juros perto de zero nos Estados Unidos melhora a atratividade de países que oferecem títulos de dívidas com juros mais altos, como é o caso do Brasil.