CMN: possível reajuste das metas de inflação movimenta mercado

O CMN realiza a sua primeira reunião do ano, a primeira do novo governo Lula nesta quinta (16)

O CMN (Conselho Monetário Nacional) realiza a sua primeira reunião do ano, a primeira do novo governo Lula, e o encontro vem movimentando o mercado há uns dias. O motivo? Possível reajuste das metas de inflação. 

Diferente dos últimos anos, a reunião agora conta com dois representantes do Poder Executivo: estarão presentes o ministro da Fazenda Fernando Haddad e a ministra do Planejamento Simone Tebet, que estarão acompanhados do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. 

“O mercado de renda variável permanecerá mais suscetível a oscilações decorrentes de declarações políticas que normalmente aumentam o receio quanto aos rumos da política fiscal e uma consequente piora no resultado das contas públicas que acabam também por resultar em câmbio, inflação e juros mais elevados”, projetou Marcelo Castanha Ramos, sócio da Matriz Capital, ao BP Money.

Já o presidente Campos Neto, durante entrevista no Programa Roda Viva, afirmou que o BC é contrário a ideia e que uma revisão dos alvos a serem perseguidos pela instituição neste momento teria efeito contrário ao desejado sobre os juros.

“Um ajuste para cima da meta de inflação pode gerar aumento da desconfiança do investidor e um aumento do prêmio de risco reduzindo a margem para redução da taxa de juros que seria o objetivo principal dessa medida”, explicou Ramos. 

Ainda de acordo com o especialista, uma possível mudança neste momento passaria uma sensação ruim ao mercado. 

“Qualquer mudança, caso ocorra, precisa vir acompanhada de estudos de seu impacto na economia que validem essa alteração e do anúncio de um novo arcabouço fiscal e de reformas, a fim de transmitir ao mercado um sentimento real do compromisso do novo governo com o controle das contas públicas”, afirmou Ramos. 

Mudança de meta de inflação poderá acontecer, avalia economista

Estrategista-chefe e sócio da Nomos, Rodrigo Correa não descarta uma mudança de meta de inflação, principalmente por conta das duras e consecutivas críticas do presidente Lula (PT) a Campos Neto. 

“Objetivamente a mudança de meta de inflação poderá acontecer. Lula está desde o início do governo e mais intensamente agora nas últimas duas semanas a criticar publicamente a postura e atuação do Banco Central (BC) em relação ao combate a inflação. Essa postura tem sido tão agressiva (e contrária a postura de seus principais ministros – ie Haddad) que tem gerado toda uma discussão pública sobre a gestão dos juros básicos da economia”, analisou Correa. 

Ele também destaca que, além de Campos Neto, a maioria dos economistas e dos agentes econômicos têm se mostrado contrários a uma possível alteração, pois ela impactaria negativamente na economia. 

“Os fatos se inclinam para a conclusão óbvia de que a alteração nas metas de inflação fará os juros mais longos aumentarem, e a curva “abrir”. A abertura da curva tem sido o movimento padrão do mercado, nesses poucos dias de novo governo, como resposta à direção de mais gastos governamentais em momento de alto endividamento. Isso é negativo para o país, sem possibilidade de avaliação diferente”, opinou Correa. 

Pesquisador do LEPDESP/UERJ e PhD em Direito, Lier Pires Ferreira entende que a política de juros básico do BC e sua parca meta de inflação são um erro. Para ele, embora seja uma autarquia, o BC não pode agir em descompasso com a política econômica definida pelo presidente.

“A independência do BC à uma suposta influência negativa da “política” não pode ser substituída por uma “submissão” da autoridade monetária brasileira aos interesses do mercado financeiro. Portanto, se as tensões entre governo e BC persistirem, o cenário econômico de 2023 tende a se deteriorar, com elevação da taxa de inflação e diminuição do investimento e das atividades econômicas, em detrimentos de todos os brasileiros, em particular os mais vulneráveis”, afirmou Ferreira. 

O pesquisador também elogiou a postura de Campos Neto, em que o mesmo se mostrou disposto a trabalhar em conjunto com o novo governo. De acordo com Ferreira, a atitude repercutiu positivamente no Planalto. 

“Em resposta, o ministro Haddad – certamente um dos mais próximos do presidente Lula – acolheu a “bandeira branca” e ressaltou aspectos importantes da entrevista do presidente do BC, como seu reconhecimento de que algumas das medidas econômicas já postas em curso pela Fazenda, como a questão do teto de gastos e da âncora fiscal estão na direção correta, vindo a contribuir para a melhoria do cenário econômico em geral”, destacou. 

Nas últimas semanas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva travou uma batalha contra o Banco Central por causa da taxa Selic, que está sendo mantida em 13,75% ao ano desde agosto. Para o presidente, a taxa básica de juros está muito alta e até começou a questionar se a autonomia do Banco Central foi uma boa decisão.

“Neste sentido, tenho boas expectativas de que a polarização havida na política partidária pode ficar tanto quanto possível apartada da condução da economia, em favor de todos os brasileiros. Com o diálogo aberto, Campos Neto parece reconhecer-se cada vez mais como presidente do BC brasileiro, e não como arauto do ex-presidente Bolsonaro”, completou o pesquisador, lembrando que o atual presidente do BC era apoiador do ex-presidente. 

Em relação ao encontro desta quinta (16), o pesquisador acredita em uma “saída política” entre os participantes. 

“Nesta primeira reunião o CMN não mexerá na meta de inflação, até porque, como você mesmo disse, ela não está na pauta. Em reuniões futuras, todavia, já com um cenário menos abrasivo, de maior tranquilidade e diálogo, os desejos e expectativas do governo passarão gradualmente a serem considerados, em um processo de aproximação recíproca entre o Planalto e o BC”, projetou. 

Para este ano, o índice fixado é de 3,25%, com tolerância de 1,5 ponto percentual. Em 2024 e em 2025, a taxa a ser perseguida é de 3%.