SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A programação para o Simpósio de Jackson Hole chegou oficialmente nesta quinta-feira (26) e, com ela, uma enxurrada de expectativas sobre qual será o destino da economia americana -e, consequentemente, da economia mundial.
O evento anual promovido pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) é amplamente aguardado pelo mercado e costuma dar as diretrizes da política monetária global.
Com o ritmo de retomada da economia mundial e o avanço no número de casos da variante delta do coronavírus no radar, todas as atenções estarão voltadas para as falas de Jerome Powell, presidente do Fed, que devem acontecer nesta sexta (27).
A expectativa é que o executivo traga uma visão mais clara sobre o programa de estímulos americanos e sobre a expectativa de inflação -que vem sendo um gatilho importante para as perspectivas de juros.
Desde o início da pandemia, em 2020, o governo americano injetou mais de US$ 3 trilhões (R$ 15,7 trilhões) na economia dos Estados Unidos.
Neste ano, o Fed começou a comprar US$ 120 bilhões (R$ 629,2 bilhões) em títulos públicos daquele país, também como forma de injeção de dinheiro. Desse total, US$ 40 bilhões (R$ 209,7 bilhões) são destinados para a compra de títulos hipotecários e US$ 80 bilhões (R$ 419,4 bilhões) em títulos do Tesouro americano, os chamados Treasuries.
Com a melhora da economia e dos números de emprego dos Estados Unidos, a autarquia já começa a debater qual seria a melhor forma (e o melhor momento) para diminuir ou até parar com essa injeção de dinheiro.
Na prática, a sinalização de uma desaceleração no ritmo dos estímulos americanos (tapering) significa uma redução no montante de títulos públicos comprados pelo Fed e refletem, consequentemente, em uma redução de liquidez -e em uma possível alta de juros no médio e longo prazo.
“Ao que tudo indica essa redução deve começar no final deste ano, mas isso ainda não foi dado como certo e, por isso, todos esperam alguma sinalização de Powell nesta sexta”, afirmou a chefe de economia da Rico, Rachel de Sá.
Segundo a economista, o mercado ainda não percebe um consenso entre os membros do Fomc (comitê de política monetária do Fed) e, apesar de o banco central americano já ter indicado que só dirá quando e quanto vão retirar dos estímulos na próxima reunião, há uma espera por mais clareza sobre os rumos que o Fed deverá tomar -o que significa que qualquer diretriz que Powell traga deve mexer com os mercados globais.
“O Fed já deixou claro que o tapering não necessariamente significa aumentar os juros logo. A expectativa é que a taxa só suba em 2023. Mas é importante dizer que mesmo sem os juros subirem, essa redução de liquidez impacta mercados emergentes, como o Brasil”, disse Sá.
Esse impacto seria perceptível de maneira mais direta na Bolsa de Valores. Com uma maior probabilidade de ganho nos Estados Unidos, a tendência é que investidores (principalmente estrangeiros) optem pelo mercado americano -que também é mais seguro- em detrimento de outros lugares do mundo.
Assim, quanto mais rápida ou maior é a retirada dos estímulos, pior é o impacto para os países emergentes.
Além disso, sendo uma referência mundial, o aumento de juros nos Estados Unidos também reflete em um aumento da taxa básica brasileira , que já sofre influência da inflação local e do cenário político e fiscal. O movimento de alta da Selic impacta não apenas investimentos, mas outros pontos da economia, como o crédito.
Para Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, o ponto de virada em relação aos estímulos deve ser colocado apenas para o ano que vem e todos os movimentos da autoridade monetária tendem a ser condicionados à evolução da conjuntura econômica.
“Com os preços em níveis elevadíssimos, ainda que categorizados como temporários, a autoridade deverá intensificar a mensagem sobre o mercado de trabalho ao afirmar que sucessivas surpresas conduzirão a uma condução mais austera da política monetária”, afirmou.
Segundo Sanchez, o reflexo dessa decisão para os investidores só será sentido no médio e longo prazo -e grande parte de seus efeitos já estão precificados pelo mercado.
“Há uma perspectiva de alta dos juros mas isso só vai acontecer lá na frente e já está precificado. São alterações muito sutis. Do lado dos investidores, é possível que esse movimento exija uma reorganização das finanças, uma vez que haverá uma melhor remuneração na renda fixa e parte dos recursos alocados em ações acabam migrando para essa categoria”, completou.