O mercado vive, nesta semana, a expectativa do anúncio de Fernando Haddad ao cargo de ministro da Fazenda pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que terá início em 1º de janeiro de 2023. Para especialistas, o nome “político” para o cargo já era esperado no lugar de alguém mais técnico. Dessa forma, a definição que realmente deve importar mais para os investidores está ligada aos outros nomes da equipe econômica.
Para Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, o mercado já reagiu mal às especulações de Haddad na Fazenda. Por isso, esta nomeação já deve estar precificada pela maior parte dos investidores.
“Quando a gente fala de secretarias, tem várias que são importantes dentro da Fazenda e que a gente espera que tenha pessoas técnicas. Se tiver pessoas técnicas, acredito que o mercado pode ficar um pouco mais otimista, porque nesse caso teríamos um balanço entre os anseios políticos, para querer gastar mais, e pessoas técnicas que entendem que a situação é delicada e o melhor remédio, agora, deve ser o equilíbrio fiscal”, explicou Komura.
Komura reiterou que caso Haddad seja o ministro da Fazenda e as secretarias sejam ocupadas por nomes políticos, ou pessoas que são técnicas mas que podem ceder aos anseios políticos, o mercado pode dar uma resposta ruim, já que as perspectivas econômicas, como de dívidas, por exemplo, passariam a ser de “altas descontroladas”.
“Caso tenha muitos nomes políticos, o dólar pode subir bastante, dado o risco no Brasil, e a Bolsa pode cair mais. Então acho que a notícia do Haddad está na conta e agora a gente espera a definição de alguns ajustes finos”, disse Komura.
Apesar de dizer que a reforma tributária é prioridade do próximo governo, Haddad mexeu com os ânimos dos investidores, na tarde da última sexta-feira (25), ao falar em “rever o teto de gastos”, em almoço da Federação Brasileira de Bancos (Frebraban). Segundo o ex-prefeito de São Paulo, a chamada “âncora fiscal” não teria conseguido inibir “a piora do gasto público” nos últimos anos.
Paulo Luives, assessor de investimentos da Valor, destaca que parte do mercado já precificou a possibilidade de Haddad no comando da Fazenda. Existe, entretanto, um espaço para uma queda do mercado, considerando a equipe que será montada e os nomes de outras pastas da área econômica, como a do planejamento.
“Um nome ‘político’ para o Ministério da Fazenda já era esperado, o que o mercado ainda não tem clareza é sobre a equipe econômica por trás. Por isso, a depender da equipe que será formada, o mercado pode reagir de maneira adversa”, disse Luives.
Sob outra perspectiva, Fábio Sobreira, analista chefe e sócio da Harami Research, afirma que o que o mercado quer é alguém que seja “pró-mercado”, independente de ser mais político ou técnico.
“Se o Haddad entrar e o primeiro discurso dele for um discurso pró-mercado, o mercado vai acreditar que, apesar de ser um nome mais político e social, vai conseguir entregar aquilo que o mercado quer, que é a responsabilidade fiscal”, disse Sobreira.
O especialista do mercado financeiro também afirmou que a ideia do novo governo de separar o social do econômico em alguns discursos é equivocada.
“O mercado busca gente que se responsabilize pelo lado social, sim, mas que também vai pelo lado econômico, financeiro, afinal de contas está tudo ligado. É o mercado que gera emprego, renda e gera crescimento. A gente acredita que quem sofre mais, inclusive com a própria taxa de juros alta, da irresponsabilidade, da inflação, é muito mais o lado social, que é o pobre, do que quem investe. Quem investe sempre vai ter como investir”, destacou Sobreira.
O analista da Harami Research relembrou que a primeira semana pós-eleições 2022 teve uma reação positiva no mercado, já que grande parte dos investidores acreditavam que o novo governo teria uma proposta parecida com o “Lula 1” (primeiro mandato do Lula), entre 2003 e 2006.
“A bolsa já caiu 5% desde a eleição do Lula. A primeira semana foi boa, subiu mais de 3%. O pessoal acreditava no “Lula 1”, primeiro mandato do Lula, que era mais pró mercado. E agora o pessoal tem chamado de “Dilma 2”. Lula está prezando mais pelo social e não pela responsabilidade fiscal”, disse Sobreira.
Primeiro governo Lula foi marcado pela melhora econômica do País
Quando Lula assumiu, em 2003, nomeou para cargo de presidente do Banco Central o ex-presidente mundial do Bank Boston, Henrique Meirelles, e manteve os outros profissionais da diretoria anterior, dando sinal de continuidade ao trabalho que estava sendo feito pelo governo anterior, que era mais pró-mercado. O presidente eleito em 2022 pela 3ª vez também anunciou metas de inflação para 2003 e 2004, em seu primeiro mandato, reforçando a política antiinflacionária, além de ter definido um aperto da meta de superávit primário, que passou de 3,75% para 4,25% do PIB em 2003.
Novos cortes nos gastos públicos para viabilizar o objetivo fiscal do governo também foram anunciados, indo na contramão do que o mercado imaginava, de maiores gastos devido às novas políticas públicas.
Para Sobreira, da Harami Research, pelas falas de Lula e Haddad, nas últimas semanas, o teto de gastos não parece ser prioridade para o novo governo, o que assusta o mercado.
“A prioridade é o social, mas furar o teto em R$ 70 bilhões ou em R$ 200 bilhões é muito diferente. Furar o teto em R$ 200 bilhões, em quatro anos seguidos, dá R$ 800 bilhões em quatro anos. Então você percebe que tem a diferença entre furar o teto em um ano, por R$ 70 bi, e em quatro anos por R$ 200 bi… é quase 10 vezes mais. então o que o mercado não quer é essa irresponsabilidade”, disse o analista.
Segundo Rodrigo Glatt, sócio e analista da GTI, Haddad não é visto como uma surpresa pelo mercado.
“Para quem acompanha há mais tempo o cenário político, mais de perto, já esperava algo nessa linha do ‘PT raiz’, mas para parte do mercado deve ser uma decepção, para uma parte que esperava que o PT tivesse uma linha mais amena ou mais parecida com 2003, quando tivemos o Palocci como ministro da Fazenda, que era mais ‘market friendly’”, disse Glatt.