Como os protestos na China podem afetar a economia global?

Grandes manifestações têm sido promovidas na China contra o PCC

O ano de 2022 tem sido turbulento para a China. De tensões com os EUA a inúmeros lockdowns, o país asiático se vê no meio de um novo problema: grandes manifestações têm sido promovidas em seu território contra o PCC (Partido Comunista Chinês). Desde o início do ano, o governo chinês tem promovido uma onda de quarentenas e bloqueios, visando combater a covid-19. Assim, milhares de chineses foram levados ao “limite”, causando uma indignação nacional. 

Segundo relatos da imprensa internacional, durante os atos, que começaram no final de novembro, inúmeros manifestantes podiam ser ouvidos gritando exigências para que o líder da China, Xi Jinping, e o Partido Comunista “renunciassem”.

De acordo com analistas consultados pelo BP Money, os protestos dentro da China não devem afetar a economia global. Por outro lado, os especialistas apontam que as políticas restritivas chinesas contra a covid-19 atrapalham sim o funcionamento da economia mundial. 

Protestos na China não irão prejudicar economia mundial

Segundo Vitelio Brustolin, professor do Instituto de Estudos Estratégicos da UFF, os protestos contra o PCC não prejudicam estruturalmente a economia chinesa e mundial, mas sim as políticas restritivas contra a covid-19 que têm sido promovidas pela China desde o início de 2022.

“O que prejudica estruturalmente a economia não são os protestos, mas sim a própria Covid e a forma como a China tem lidado com ela. O governo chinês não quis importar vacinas e a existente naquele país tem apresentado baixa eficácia às novas mutações do vírus, pelo que se constata nas pesquisas com linhagens da variante Ômicron”, explicou.

“A política chinesa tem sido de grande número de testagens, vacinação exclusivamente com a vacina existente no país e lockdowns rigorosos para tentar prevenir o alastramento do vírus. Com centenas de comunidades em quarentena em várias províncias, o consumo reduz, pois as pessoas estão fechadas em casa, ao mesmo tempo em que a produção desacelera, pois as fábricas não têm como manter o ritmo”, completou Brustolin.

Thiago Calestine, economista e sócio da DOM Investimentos, também criticou a política chinesa contra a covid-19, enfatizando que ela implica em uma inflação maior, prejudicando a economia global.

“É muito penoso para a economia mundial ter essa política contra a covid-19. Ela faz com que as fábricas não produzam e as pessoas não recebam. Se as pessoas não recebem, elas continuam tendo gastos. Então o governo chinês vai ter que imprimir um pouco mais de dinheiro para pagar essas pessoas, pois elas não estão recebendo o salário porque não estão produzindo. Logo você tem uma inflação maior com um nível de riqueza menor. Então para a economia global é muito prejudicial”, disse.

Na visão de Ricardo Julio Rodil, líder da área de Capital Markets na Crowe Macro, caso os protestos na China cresçam cada vez mais, haverá uma queda no consumo da China, influenciando a demanda mundial por alimentos e commodities.

“Se esses protestos crescerem desmedidamente, o consumo da China deverá diminuir. Assim, a demanda mundial por alimentos e commodities diminuirá na mesma proporção. Resta saber como esse aspecto se combinará com os impactos da falta de matérias-primas, insumos e algumas commodities causados pelo conflito Ucrânia-Rússia”, afirmou. 

Desdobramentos da política chinesa contra covid-19 afetam Brasil

Milhares de chineses têm deixado seus postos de trabalhos para protestarem contra as medidas restritivas chinesas contra a covid-19, esfriando a economia chinesa. De acordo com Calestine, o fato das fábricas chinesas estarem funcionando com um grande déficit no contingente de mão de obras implica em uma produção menor. Logo, com uma produção menor, menor será o número de importações. Tal cenário prejudica o Brasil, cujo principal parceiro comercial é a própria China.

“Com as fábricas chinesas trabalhando com um contingente super reduzido, há uma falta de produtos manufaturados e derivados do minério de ferro. Com baixa produção, a China vai comprar pouco minério do Brasil, forçando uma queda no preço do ativo. O Brasil é um país super exportador de minério, o produto tem um peso muito grande na composição do nosso PIB. Então, o Brasil, tendo a China como principal cliente, vai ser prejudicado”, explicou.

Brustolin reforça a visão de Calestine, afirmando que uma desaceleração da economia chinesa atrapalha diretamente a economia do Brasil, visto que o país asiatico é seu principal parceiro comercial desde 2009.

“A China é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009. No ano passado, a China foi responsável por mais de 30% das exportações e 20% das importações do Brasil. Diante disso, é claro que a desaceleração da economia chinesa traz impactos à economia brasileira. Exportamos soja, minério de ferro, óleos brutos, carne bovina, milho, entre outros para a China”, reiterou. 

Como os protestos afetam a imagem da China?

Analistas consultados pelo BP Money não acreditam que os protestos que ocorrem na China tenham o poder de mudar a imagem da China ou do Partido Comunista Chinês perante o mundo. Segundo Rodil, se as manifestações se alastrarem por todo o território chinês, o governo poderá tomar medidas mais brutas. No entanto, o especialista acredita que tais movimentos não mudariam a imagem do país perante as outras nações, visto que o PCC já é mal visto mundialmente.

“Acredito que, caso os protestos se alastrarem além das oito grandes cidades hoje conturbadas, a repressão poderá ser mais brutal. No entanto, não creio que isto mude a imagem da China perante o mundo, que já tem o PCC e seus mandatários de plantão na conta dos autoritarismos mais intensos do planeta”, disse.

Brustolin reitera que outros grandes protestos já aconteceram antes na China, relembrando o massacre da Praça da Paz Celestial  e os atos ocorridos em Hong Kong em 2020. Por conta disso, o analista acredita que é difícil afirmar se o mundo passará a ver a China de outra forma.

“Não se pode afirmar que o mundo vai passar a ver a China de uma forma diferente por conta dos protestos. Primeiro porque protestos pontuais historicamente ocorrem na China. Durante os lockdowns, por exemplo, houve panelaços e manifestações isoladas. Há também protestos históricos e conhecidos no mundo todo, como o massacre da Praça da Paz Celestial, em 1989. Em 2019 e 2020, o mundo assistiu manifestantes de Hong Kong protestando contra Pequim. Esses episódios são conhecidos e compõem a imagem que o mundo tem da China, inclusive em termos de censura”, relatou.