
O Vaticano, lar espiritual de mais de um bilhão de católicos, esconde por trás de sua arte sublime e arquitetura milenar uma crise financeira alarmante. Com a morte do Papa Francisco, em abril, seu sucessor, o norte-americano Robert Francis Prevost, que passará a se chamar Leão XIV, herda um buraco fiscal crescente, um fundo de pensão à beira do colapso e uma burocracia que resiste a qualquer tentativa de reforma.
Sob a liderança de Francisco, houve avanços importantes contra a corrupção, mas o cerne do problema persiste: má gestão, falta de transparência e uma cultura interna resistente à prestação de contas.
Desde que assumiu em 2013, Francisco viu o déficit orçamentário do Vaticano triplicar. O fundo de pensão da Santa Sé, com quase 2 bilhões de euros em passivos, não tem liquidez suficiente para cumprir com suas obrigações nos próximos anos.
Enquanto isso, muitos setores da Cúria continuam operando com contabilidade manual — literalmente feita por freiras em cadernos.
Novo Papa e a velha dependência de museus e doações
Com uma base tributária inexistente, o Vaticano depende cada vez mais das doações dos fiéis e da venda de ingressos para seus museus. Em 2023, mais de sete milhões de turistas visitaram o Estado e garantiram a receita que sustenta desde o serviço diplomático até a emblemática Guarda Suíça.
Mas nem o turismo escapa das pressões financeiras. Manter obras como a Capela Sistina custa caro, e o Vaticano as registra com valor simbólico de 1 euro, em respeito ao seu valor espiritual — o que limita sua utilidade contábil como ativos financeiros.
A missão de Francisco foi marcada por tentativas ousadas de modernizar as finanças do Vaticano. Ele contratou auditores profissionais, criou uma Secretaria de Economia e apoiou treinamentos para padres lidarem com finanças. Em resposta, alguns setores da Cúria esconderam fundos, dificultaram investigações e até espionaram o auditor-chefe.
A situação chegou ao ponto de um banco internacional cortar laços com o Vaticano, sinalizando desconfiança generalizada na governança financeira da Santa Sé.
O auge do caos veio com o escândalo de um investimento de 400 milhões de dólares em um prédio em Londres. O cardeal Angelo Becciu, figura de alta confiança de Francisco, foi condenado por fraude e desvio de dinheiro. Ele ainda gravou secretamente o próprio Papa tentando validar um pagamento polêmico para libertar uma freira sequestrada — outro episódio que terminou em escândalo.
Cortes salariais e alerta vermelho: “déficit zero” ou colapso
Nos últimos meses de vida, Francisco cortou salários de cardeais e removeu privilégios, como moradia subsidiada. Também determinou que o Vaticano atingisse “déficit zero” em curto prazo, embora não tenha vivido para ver essas mudanças aplicadas.
Em carta de 2023, o Papa alertava sobre um “grave desequilíbrio prospectivo” no sistema de pensões e deixava claro: decisões difíceis precisavam ser tomadas com urgência.
Enquanto alguns cardeais americanos e alemães pressionam por reformas financeiras estruturais, outros insistem que a missão espiritual da Igreja deve estar acima das questões monetárias. Mas a verdade inescapável é que, sem dinheiro, não há como manter a estrutura que sustenta a missão espiritual global da Igreja.
Em suma, o novo pontífice eleito, Papa Leão XIV, enfrentará, além da condução da fé, um desafio hercúleo de recuperação econômica.