O endividamento do governo vai se manter acima do nível pré-Covid por ao menos mais dez anos, de acordo com projeções do Tesouro Nacional.
A previsão é que a dívida líquida do setor público (a DLSP), que representou 54,6% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2019, encerre 2021 em 58,3% e continue em elevação até chegar a 68,2% em 2030.
A elevação gradativa é motivada por fatores como a perspectiva de juros mais altos e de um maior tempo de déficit nas contas públicas, o que demandará um esforço fiscal maior caso se queira reduzir o endividamento ao longo dos anos.
O Ministério da Economia trabalhava com projeções internas nos últimos meses que apontavam superávit no resultado do governo em 2023, mas a perspectiva de mais gastos (inclusive pela flexibilização no pagamento dos precatórios) vão adiar a volta dos resultados no azul.
Agora, a previsão é de superávit apenas em 2024, completando um ciclo de 12 anos de déficit.
O ministro Paulo Guedes (Economia) entrou no governo defendendo um resultado positivo o quanto antes e chegou a pregar que poderia alcançar o objetivo ainda em 2019, o primeiro ano de governo. A tarefa não foi concluída nem antes nem depois da pandemia de Covid-19.
Agora, mais despesas estão previstas em decorrência da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios que expande o teto de gastos.
A proposta também estabelece um limite para o pagamento com decisões judiciais contra o Estado e joga o excedente para os anos seguintes, com a possibilidade de pagamentos fora do teto.
A estratégia forma uma possível bola de neve de passivos, ao mesmo tempo em que abre espaço para novos gastos, impulsionando o endividamento.
A trajetória do endividamento é sensível ao resultado primário, às taxas de juros e ao PIB.
De acordo com o Tesouro, a evolução do indicador depende de fatores como “a criação de um ambiente de estabilidade macroeconômica que sustente o crescimento real do PIB, um balanço fiscal capaz de entregar superávits primários e condições para a redução das taxas de juros no médio prazo”.
O Tesouro diz que o patamar está acima de pares e emergentes e cita que, em um cenário de piora nas condições econômicas, o esforço fiscal para a redução no grau necessário seria até mesmo inviável.
“Em um cenário de juros mais altos e de menor PIB, de forma estrutural, o esforço fiscal necessário para reduzir a dívida será significativo e, em algumas combinações, até mesmo inviável na magnitude necessária”, afirma a pasta em relatório.
Os dados são divulgados no momento em que o mercado monitora o surgimento da variante de coronavírus ômicron, que desperta receios sobre possíveis novas ondas de Covid e a necessidade de novas rodadas de gastos públicos para conter um eventual recrudescimento da crise sanitária.
Paulo Valle, secretário do Tesouro, afirma que ainda está muito cedo para falar sobre os riscos da nova variante e que a equipe econômica depende de avaliações do Ministério da Saúde sobre a necessidade de atuar.
Ele foi questionado sobre como o governo enfrentará uma eventual nova onda e se a estratégia incluiria os chamados gastos extraordinários (fora do Orçamento tradicional e, portanto, do teto de gastos).
Em resposta, ele defendeu a PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, que foi aprovada na Câmara e agora tramita no Senado, como um instrumento para abrir espaço para mais gastos, inclusive para a Covid. Mas não descartou o uso de créditos extraordinários a depender da gravidade da pandemia.
“Quanto à nova onda da cepa da África do Sul, ainda está muito cedo e dependemos da avaliação do Ministério da Saúde, que vai nos atualizar sobre a necessidade de atuar”, afirmou.
“Mas, a princípio, queria chamar atenção que estamos atuando fortemente na aprovação da PEC, que abre um espaço bastante significativo para implementar o Auxílio Brasil”, disse.
“A princípio, nossa estratégia está focada em aprovar a PEC, que vai nos dar uma margem de manobra inclusive se tiver piora nesse cenário. Por ora, não trabalhamos com nenhuma outra alternativa. Mas isso vai depender da gravidade ou não dessa segunda onda”, afirmou.
Enquanto isso, o governo central (que inclui Tesouro Nacional, Previdência e Banco Central) registrou um superávit de R$ 28,1 bilhões em outubro, o terceiro maior da história para o mês (considerando dados atualizados pela inflação).
O resultado representa uma reversão do déficit de R$ 3,4 bilhões registrado um ano antes.
O resultado de outubro veio acima da mediana das expectativas da pesquisa Prisma Fiscal, do Ministério da Economia, que indicava um superávit de R$ 10,1 bilhões para o mês.
De acordo com o Tesouro, o resultado foi influenciado tanto pela evolução da arrecadação como pelo melhor direcionamento dos gastos ligados à crise da Covid-19.
No ano passado, o país enfrentava o primeiro ano da pandemia e o governo executava medidas com impacto fiscal mais forte, como o auxílio emergencial maior e adiamentos mais amplos de impostos.