Economia verde e Rússia serão desafios para Dilma no Brics

Encontro com Lula em Xangai deverá ser marcado pela posse oficial de Dilma no banco que ela própria ajudou a fundar, em 2014

 

Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegar a Xangai, na etapa final da viagem à China, será recebido por uma velha conhecida. A essa altura, a ex-presidenta Dilma Rousseff estará no comando do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB, na sigla em inglês), nome oficial do Banco do Brics, bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Com US$ 32 bilhões em projetos aprovados desde 2015, o banco atualmente investe US$ 4 bilhões no Brasil, principalmente em rodovias e portos.

Previsto para ocorrer entre 29 e 31 de março, o encontro com Lula em Xangai, onde fica a sede do NDB, deverá ser marcado pela posse oficial de Dilma no banco que ela própria ajudou a fundar, em 2014. Segundo especialistas ouvidos pela Agência Brasil, a nova comandante da instituição tem a oportunidade de ampliar a inserção internacional no banco, mas terá dois grandes desafios: impulsionar projetos ligados ao meio ambiente e driblar o impacto geopolítico das retaliações ocidentais à Rússia, um dos sócios-fundadores.

Em relação à economia verde, o principal desafio de Dilma, que enfrentou conflitos com a área ambiental do governo nos dois mandatos de Lula, não será a adaptação às novas exigências ambientais dos projetos de infraestrutura. Na 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (COP-27), no Egito, o NDB assumiu o compromisso de aumentar o financiamento a projetos ambientalmente sustentáveis, mas o sucesso dessa missão depende da vontade da China e da Rússia e injetarem dinheiro nesse tipo de empreendimento.

“Nesse ponto, vai depender mais de quem coloca o dinheiro e financia os projetos, principalmente a Rússia e a China, que não têm esse perfil ambientalista, decidir colocar valores em projetos mais ambientais. A adaptação da Dilma ao perfil de economia verde é o menor dos problemas”, diz Carla Beni, economista e professora de MBAs da Fundação Getulio Vargas (FGV) em São Paulo. Ela, no entanto, lembra que a China pode usar o banco para suavizar a imagem de grande emissor de carbono e financiar esses projetos.

 

Guerra ficou cara, mas sair deixaria Rússia desmoralizada, diz analista

A Guerra na Ucrânia completou um ano recentemente sem muita perspectiva de ser encerrada, mesmo com algumas complicações. Advogado especializado em Direito Econômico Internacional e Governança Corporativa, Emanuel Pessoa aponta que o conflito já se tornou caro para a Rússia, mas não crê em um final próximo, pois deixariam os russos desmoralizados. 

“Os EUA estão bancando toda a defesa da Ucrânia e eles estão com o bolso muito melhor que o bolso russo, então para eles se acabasse logo seria economicamente melhor. No entanto, os russos não podem acabar antes, pois se tiver uma perda militar nesse momento, ficam completamente desmoralizados. A situação é um pouco mais complicada do que parece, e por isso talvez não acabe agora”, afirmou Pessoa em entrevista ao BP Money. 

Buscando contribuir para o fim do conflito, a ONU (Organização das Nações Unidas), em Assembleia Geral, aprovou uma nova resolução pedindo o encerramento da guerra. A atitude foi até louvável, mas só na teoria, como explica o especialista. 

“As pessoas, às vezes, não percebem que as resoluções da ONU não têm muito efeito prático, especialmente quando são tomadas contra outros membros do Conselho Permanente de Segurança. Por mais que isso seja importante do ponto de vista moral, fato é que não deverá se traduzir necessariamente em atuação militar. O efeito ele é moral e serve mais como uma forma de constranger a Rússia em Fóruns internacionais”, explicou o Mestre em Direito pela Harvard Law School e pela Universidade Federal do Ceará.

Único país dos Brics a votar favorável para o fim da guerra, o Brasil teve sua participação avaliada pelo especialista. Pessoa analisou o País governado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e agora pelo presidente Lula (PT). 

“O papel do Governo Bolsonaro foi ponderado. As pessoas gostam muito de falar do jeito dele, mas ele entendeu muito bem que 80% dos fertilizantes do Brasil são importados, e aproximadamente um terço da nossa importação vem da Rússia e Bielorússia. Se tivéssemos entrado em choque direto com os russos, eles teriam condições de retalhar o Brasil de uma maneira que realmente doeria absolutamente no País”, destacou.

“Hoje, Lula está tentando ter uma postura mais protagonista. Podemos imaginar que ele quer o prêmio Nobel da Paz, lustrar sua biografia, mas fato é que, hoje, o Brasil está tentando assumir uma posição de liderança nas negociações de paz, por conta da tradição brasileira de solução pacífica de conflitos e não intervenção nos aflitos alheios. O fato de o Brasil defender a paz é positivo para a Ucrânia, e o fato de o Brasil não atacar a Rússia é positivo para os russos. Isso nos dá uma posição que faz com que ambos os lados do conflito entendam que o Brasil tenta se manter o mais distante de uma posição parcial possível”, avaliou Pessoa.