SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A crise política criada pelo governo federal impede que o Banco Central tenha sucesso no combate à inflação e coloca em risco o cumprimento da meta para 2022.
A avaliação é do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), que também vê o risco de que sua projeção de crescimento da economia de 1,5% para o próximo ano seja frustrada por conta da necessidade de um aperto monetário cujo limite depende dos riscos trazidos pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido).
“Ele [BC] vai ter que subir mais os juros, infelizmente, e não dá para acreditar que isso é culpa do BC. Temos de colocar a culpa em quem realmente merece. Os juros vão continuar subindo, a gente não sabe onde vai parar. Vai ficar lutando aí sozinho por muito tempo, e espero que esse tempo não seja tão demorado, porque o custo para a sociedade fica mais alto”, afirmou a economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV Ibre, durante o 3º Seminário de Análise Conjuntural da instituição, em parceria com o jornal O Estado de S. Paulo.
Matos prevê crescimento de 4,9% para este ano e de 1,5% no ano que vem, mas com risco para esses números, muito influenciados pelo carregamento estatístico da recuperação com a abertura da economia a partir do início da vacinação.
Armando Castelar, pesquisador associado do FGV Ibre, afirma que a crise política faz com que o Brasil abra mão de se beneficiar dos efeitos positivos da reabertura da economia e de um cenário externo positivo para economias emergentes.
“É a gente mesmo que está criando problema. Quando na questão do meio ambiente fez tanta coisa ruim e agora também afasta o investidor com a questão política, estamos abrindo mão de um cenário que poderia estar muito melhor. O que é inacreditável é que, com tanto vento a favor, estejamos atirando nos pés dessa forma maluca.”
“Uma surpresa, que é surpresa a toda hora, é a subestimação das projeções de inflação pelo mercado e pelo Banco Central”, afirmou. “Acho que tem muito otimismo em relação ao ano que vem, achar que vai trazer uma inflação de 10% para 3,9%. Parece um não aprendizado com todas essas subestimações que a gente vê desde o final do ano passado.”
O economista José Júlio Senna, também do FGV Ibre, afirma que a inflação é um fenômeno mundial raro provocado pela pandemia, que interrompeu cadeias de suprimento e desviou o consumo de serviços para alguns bens, mas destacou que o problema no Brasil também inclui a questão da crise hídrica e os impactos da questão política e incertezas fiscais sobre o câmbio.
“Aqui é um processo muito mais difícil de ser combatido, em especial porque isso não é tarefa apenas do Banco Central, mas tarefa de governo como um todo, e o interesse do governo por questões de economia parece bastante modesto”, afirmou.
Ele afirma que o que o BC está fazendo em matéria de juros era para levar a taxa de câmbio para um patamar muito mais confortável –o dólar está atualmente em torno de R$ 5,30–, mas que a crise política impediu a valorização do real e aumentou o custo do combate à inflação.
“Não precisaria ter um aumento de juros tão expressivo para combater a inflação. Sem a ação do governo, acalmando os ânimos, o BC sozinho não vai resolver essa parada. Não há a menor chance. Toda a confusão política que está armada agrava muito o problema.”