Reforma tributária

‘Governo quer arrecadar mais sem fomento à economia’, diz analista

As discussões sobre os projetos de leis complementares que tratam da regulamentação da reforma avançaram nos últimos dias

Reforma Tributária/Foto: Freepik
Reforma Tributária/Foto: Freepik

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está “correndo” para tentar aprovar o texto da regulamentação da reforma tributária. Todas as movimentações em torno do tema estão sendo observadas de perto pelo mercado, especialmente após o presidente Lula pedir urgência constitucional, na última quinta-feira (8).

O especialista Rogério Bittencourt, sócio Tributário Nankran Mourão Brito Massoli, traz sua perspectiva em relação à pressão do governo sobre a reforma.

“Enquanto há setores mais proativos, que buscam junto ao Congresso Nacional evitar serem prejudicados pela regulamentação da reforma, há outros setores que acompanham com apreensão o desenrolar das discussões”, disse ele ao BP Money.

“De maneira geral, a percepção é a de que o governo busca o aumento de arrecadação e manutenção de poderes fiscais, sem grande preocupação com simplificação ou fomento à atividade econômica”, acrescentou.

As discussões sobre os projetos de leis complementares que tratam da regulamentação da reforma avançaram nos últimos dias na Câmara dos Deputados. A casa se prepara para uma semana de esforços para aprovar o texto antes do recesso parlamentar.

O primeiro texto a tramitar na segunda-feira foca na construção dos três tributos que formarão o novo sistema. Entre eles estão a CSB (Contribuição sobre Bens e Serviços), o IS (Imposto Seletivo) e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços).

Já o segundo texto (PLP 108/2024), que também tramitou na segunda-feira, trata da questão federativa sobre o IBS. Nesse contexto sãoforam abordados temas como a instituição e estruturação do Comitê Gestor do novo imposto, disposições sobre a transição a partir do sistema vigente e, segundo o “InfoMoney”, o contencioso administrativo relacionado ao tributo.

Mercado vê ‘pressão’ do governo sobre reforma com bons olhos, mas ‘imposto seletivo’ dá o que falar

No entendimento do advogado especialista André Mendes Moreira, “a reação do mercado tende a ser positiva”.

Moreira, professor de direito tributário da USP e sócio do escritório Sacha Calmon – Misabel Derzi Advogados, ainda destacou que qualquer decisão pode gerar impactos à economia nacional.

Nesse sentido, ele mencionou a “concessão de benefícios fiscais, abrangência da não-cumulatividade e a seletividade do novo imposto [Imposto Seletivo]”.

O Imposto Seletivo foi um tema que tomou conta do noticiário por muito tempo. Também chamado de “imposto do pecado”, o tributo vem para substituir o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

No último domingo (7), a “Agência Brasil” publicou uma atualização pela Câmara dos Deputados no texto sobre o tema. Na relação foram incluídos os carros elétricos e apostas.

Além disso, Moreira acrescentou que esse novo imposto deve afetar o lucro de companhias que atuam no Brasil.

“No caso da seletividade [Imposto Seletivo], a afetação recai diretamente sobre um maior ou menor consumo (e, portanto, afetando o faturamento e lucro das empresas)”, comentou.

De fato, as empresas afetadas não acharam de bom tom a ideia do imposto seletivo. Como exemplo, após a última atualização da lista dos itens a quem recairá o imposto, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) publicou uma nota expressando o descontentamento.

“O Brasil já possui uma das maiores cargas tributárias do planeta sobre a compra de veículos. Depois de tantos anos lutando pela eliminação do IPI, não faz o menor sentido criar um imposto adicional, que se somaria ao IVA, tornando os veículos vendidos no Brasil inacessíveis a uma grande parcela da população”, disse a nota, de acordo com o “Metrópoles”.

Governo ‘precisa buscar’ déficit zero, ‘mas não é cortando em áreas sociais’, diz presidente da Corecon

Outro ponto, nesse cenário, também abordados em relação as movimentações do governo foi a questão do “déficit zero”.

O presidente da Corecon (Conselho Regional de Economia da 2ª região — SP), Pedro Afonso Gomes, disse ao BP Money que essa busca é uma necessidade.

“Não é que o governo insiste em buscar, ele precisa buscar, mas não é cortando em áreas sociais”. Além disso, ele pontua que “as áreas sociais já são muito pouco importantes no orçamento”.

O ‘cashback da reforma’ diminui a arrecadação?

Dentro da reforma tributária são levantados temas como a devolução do percentual de impostos para a população de baixa renda em contas de luz, água e esgoto. A proposta é conhecidma como “cashback”.

Ao comentar sobre como o tema poderia afetar ou não a busca pelo déficit zero, Raphael Okano Oliveira, sócio do escritório CTM Advogados, fez ponderações.

Ainda que a movimentação represente um gasto do governo, “é certo que o orçamento deve prever a devolução de parte da arrecadação aos mais pobres”. Segundo ele, isso viabiliza a “própria função do serviço”.

“Essa é a alternativa encontrada para o sensível aumento de alíquotas sobre o consumo, que onera principalmente a população com menos renda. Pensar em diminuição da arrecadação com essa sistemática significaria virar a cara aos mais pobres que não terão condição financeira de arcar com o aumento do custo final dos serviços”, pontuou.

Por outro lado, Rogério Bittencourt, sócio Tributário do Nankran Mourão Brito Massoli, sinalizou que ainda há dúvidas sobre a aplicação prática desse “cashback”.

“Enquanto o cashback é visto com bons olhos, embora haja dúvidas sobre sua abrangência e aplicação, a inexistência de créditos para planos de saúde aumenta o custo tributário das empresas”, ponderou Bittencourt.