BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo Jair Bolsonaro estuda criar um teto de renda familiar para o pagamento do abono salarial, benefício dos cofres públicos pago hoje a trabalhadores que recebem até dois salários mínimos.
As recomendações foram feitas por um conselho composto por membros do Ministério da Economia, da Casa Civil e da Controladoria-Geral da União.
As sugestões estão em um relatório que analisou diferentes políticas públicas e foi entregue na terça-feira (31) ao Congresso.
O valor do abono corresponde a até um salário mínimo (R$ 1.100) e é pago atualmente aos trabalhadores formais que receberam, em média, até 2 salários mínimos de remuneração mensal durante pelo menos 30 dias no ano-base e que estejam cadastrados há pelo menos cinco anos no PIS/PASEP (Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público).
A análise do abono salarial feita pelo conselho mostra que o abono é pago de forma crescentemente concentrada ao longo dos anos em faixas mais elevadas de renda da população –e não às mais baixas.
Um dos argumentos da equipe econômica para mudar regras do benefício é que o abono é pago atualmente mesmo quando o trabalhador pertence a uma família mais rica –por exemplo, a um jovem em início de carreira.
Com o critério de renda familiar, o programa, na avaliação do governo, iria transferir dinheiro para quem realmente precisa, abrindo espaço no Orçamento para outras medidas na área social consideradas mais eficientes.
Por isso, o conselho recomendou “avaliar a criação de limite máximo de renda familiar per capita” para pagar o benefício.
A sugestão é mais uma tentativa da equipe econômica de mudar o programa, que tem problemas também na visão de especialistas. Além de o abono não ser focado na baixa renda, há falhas como benefícios pagos até mesmo a trabalhadores que já morreram.
O Ministério da Economia tentou emplacar mudanças no abono salarial em outras ocasiões, mas enfrentou resistências do Congresso e até mesmo do presidente Bolsonaro.
No começo do governo, o time de Paulo Guedes (Economia) queria restringir o abono a quem ganha apenas um salário mínimo –em vez de dois. A ideia fez parte da proposta de reforma da Previdência, mas não se viabilizou politicamente.
Então, a equipe econômica passou a defender a redução do programa para direcionar os recursos ao Bolsa Família, visto como mais eficiente para o combate à pobreza. O plano também não foi adiante por resistência de congressistas.
Depois, o assunto voltou em meio às discussões sobre a reformulação do Bolsa Família, na esteira da intenção de retirar o nome do programa ligado à gestão petista e ampliar os valores pagos.
Com receio do desgaste político, Bolsonaro, no entanto, afirmou publicamente que não tiraria recursos dos pobres para dar a paupérrimos.
“Jamais vou tirar dinheiro dos pobres para dar para os paupérrimos. Quem por ventura vier propor a mim uma medida como essa eu só posso dar um cartão vermelho para essa pessoa”, disse o presidente há cerca de um ano.
Agora, o conselho sugere o teto de renda familiar e também outras medidas. Entre elas, normativos para verificar a elegibilidade ao benefício e revisar os parâmetros, além de aprimorar os serviços de processamento de dados, de identificação e de pagamento aos trabalhadores.
A Secretaria de Trabalho, que foi desmembrada do Ministério da Economia e hoje é Ministério do Trabalho e Previdência, está revisando normativos e implementando alterações no processamento de dados para aprimorar a verificação e o pagamento do abono.
O conselho também fez avaliação sobre o Bolsa Família. A conclusão é que o programa tem boa focalização e o principal obstáculo para alcançar com mais eficiência a redução da pobreza está no valor médio dos benefícios –limitados por restrições orçamentárias.
Para o conselho, os erros de inclusão no programa são baixos e estão em queda, mas os erros de exclusão (isto é, exclusão indevida de famílias) “são moderados e constituem entrave para sua melhor focalização”.
Relatório recente do Banco Mundial também identificou problemas relacionados à exclusão das famílias do Bolsa Família.
O Banco Mundial constatou que somente 7% dos beneficiários deixam o programa após passar pela regra de transição, que permite que a família continue a receber recursos por mais dois anos quando declarar ter conquistado um aumento de renda para além do teto do programa.
Segundo a instituição, 51% das saídas ocorreram depois que o governo cruzou informações e constatou haver uma elevação de renda para além do limite.
A interrupção abrupta dos pagamentos ameaça gerar instabilidade financeira para aqueles que tentam se inserir no mercado de trabalho, muitas vezes de maneira informal e com uma série de dificuldades (como o custo do transporte e o custo da creche para os filhos).