Foto: Freepik
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O governo federal voltou a mirar o seguro defeso,benefício pago a pescadores artesanais durante o período de proibição da pesca, como alvo de contenção de despesas obrigatórias.

A Medida Provisória (MPV) nº 1.323, publicada em 4 de novembro, busca limitar o gasto anual do programa a R$ 7,325 bilhões em 2025, valor que será corrigido segundo o novo arcabouço fiscal.

A medida ocorre em meio ao esforço da equipe econômica para reforçar a credibilidade fiscal e manter o compromisso com a trajetória de consolidação das contas públicas, especialmente diante do cenário mais desafiador projetado para 2026.

Economia estimada de R$ 2,6 bilhões até 2026

A estimativa preliminar da Warren Investimentos aponta que a MPV pode gerar economia de R$ 375 milhões já em 2025 e R$ 2,6 bilhões em 2026, quando o governo enfrentará maior pressão sobre as contas públicas.

A MP também endurece as regras de concessão e renovação do benefício, estabelecendo novos requisitos para comprovação da atividade pesqueira. A expectativa é que as medidas coíbam fraudes e reduzam o número de beneficiários irregulares, tema que já foi alvo de auditorias anteriores do TCU e CGU.

Itaú vê desafio de 0,6% do PIB para o cumprimento da meta em 2026

Em seu relatório Revisão de Cenário – Brasil: Sem mudar o curso, o Itaú Unibanco manteve a projeção de déficit primário de 0,6% do PIB em 2025 e revisou para -1,0% em 2026 (ante -0,9% anteriormente).

O banco destaca que, embora o governo esteja próximo de cumprir a meta de 2025, o desafio fiscal será maior no próximo ano, especialmente pela perda de receitas recorrentes e pelo aumento do limite de despesas com a PEC 66.

Segundo o relatório, “o sucesso da estratégia de ajuste fiscal dependerá sobremaneira de receitas extraordinárias e da aprovação de medidas no Congresso”, o que reforça a importância de ações como a MP do seguro defeso para preservar a credibilidade da política fiscal.

O Itaú também projeta câmbio médio de R$ 5,35/US$ em 2025 e R$ 5,50/US$ em 2026, destacando que a valorização recente do real pode aliviar pressões sobre alimentos e, consequentemente, sobre o IPCA — cuja projeção para 2025 foi revisada de 5,1% para 5,0%.

Outras tentativas e o desafio da credibilidade fiscal

A limitação do seguro defeso não é inédita. O tema já apareceu em duas medidas provisórias anteriores (MP 1.303 e MP 1.086), ambas com o mesmo objetivo de fixar um teto de gastos e revisar o cadastro de beneficiários — propostas que, à época, enfrentaram resistência política e não avançaram no Congresso.

Agora, o governo retoma a estratégia em um momento de ajuste fiscal mais apertado. A medida dialoga com o esforço do Ministério da Fazenda para mostrar compromisso com metas primárias e buscar espaço fiscal para 2026, ano em que a projeção do Itaú Unibanco indica deterioração adicional das contas públicas.

Perspectiva macro: desaceleração e cautela monetária

O relatório do banco também indica que a atividade econômica deve perder fôlego no segundo semestre de 2025, com crescimento projetado de 2,2% no ano e 1,5% em 2026. O mercado de trabalho, no entanto, segue resiliente, com taxa de desemprego prevista em 6,2% no próximo ano.

Para os economistas do Itaú, “é essencial cautela e perseverança na estratégia de manutenção de juros elevados por período prolongado, evitando cortes prematuros que poderiam comprometer a ancoragem das expectativas e reverter ganhos recentes.” O banco prevê início do ciclo de flexibilização monetária apenas no primeiro trimestre de 2026.

Ajuste gradual e foco em previsibilidade

Com a nova MP, o governo tenta sinalizar ao mercado um esforço de disciplina fiscal, ainda que o impacto isolado da medida seja modesto diante do desafio total das contas públicas.

A estratégia, no entanto, é simbólica: ao limitar um gasto obrigatório crescente, a equipe econômica procura mostrar coerência entre discurso e prática, reforçando a narrativa de compromisso com o equilíbrio orçamentário — um dos pilares da credibilidade fiscal em meio à desaceleração da economia e à perspectiva de cenário internacional mais instável.